Batei palmas. Cantei mais forte. Vem peregrino na esperança e na paz.
A voz que se ouve no Santuário de Fátima é incansável.
Qual animador de público em programa de televisão gravado ao vivo, esta voz que se ouve em todo o recinto organiza a multidão, afina o conjunto.
Cantemos com alegria e com um sorriso nos lábios. Cantemos todos.
Os ecrãs que se encontram dispostos pelo recinto do Santuário de Fátima garantiram que aqueles que aí se encontram não perderam de vista o Papa Francisco desde que saiu de Roma, aterrou na Base Aérea de Monte Real, levantou de novo voo, agora em helicóptero, rumo ao Estádio de Fátima para, finalmente, daí se deslocar em viatura aberta até ao Santuário. Uma viagem acompanhada pela mesma voz incansável que foi dando conta dos principais pontos de paragem e galvanizando a multidão com o cronómetro cada vez mais favorável à proximidade do Papa.
Às três da tarde quando faltavam mais de três horas para que o Papa chegasse à Capelinha das Aparições, prevista para as 18h15m, já a vista do topo do recinto era impressionante. Dois dedos de conversa e percebia-se que era impressionante há já várias horas. Um grupo do norte estava ali desde as 10 da manhã, fizeram mais de 200 quilómetros a pé para aqui estar hoje em Fátima e quando chegaram só lhes sobrava um cantinho na fila da frente. Que só estava desocupado porque a chuva deixara como recordação uma grande poça de água - que elas não enjeitaram.
Há bandeiras no ar. Bandeiras de países - Portugal, Espanha, França, Brasil, Angola, entre outros - bandeiras de organizações, bandeiras de lemas. Há manchas de cor na multidão, das t-shirts azuis, amarelas, laranja que identificam os vários grupos de peregrinos. Fazem-se selfies nos degraus da escadaria do centro de imprensa. Estamos cá, somos dos que contam um dia que fica para a História. Ouve-se português, italiano, eslavo, francês, inglês. É a Babel da imprensa, tantos os jornalistas e tantas as nacionalidades.
Na fila da frente, há uma voz que disputa atenção à voz incansável que acompanha toda a cerimónia. É uma senhora enérgica, uma mulher de fé que não poupa nos vivas ao Papa. Viva o Papa. Viva.
As vozes de todos unem-se em coro quando o helicóptero sobrevoa o recinto. Ele está ali, a poucos metros de altitude. Vivas e cânticos. Vem peregrino na esperança e na paz, o cântico que emoldura a tarde.
Quando o Papa entra no recinto há outro movimento sincronizado, desta vez do tronco. A multidão que até ali se encontrava de frente para o altar principal, roda 180º e estica o pescoço. Ele está a chegar - e vem do lado oposto. A fila de frente onde se alinhavam rostos é agora uma fila de costas voltadas para o altar. Antes disso já tinham passado bispos e cardeais de passo apressado em direção à Capelinha das Aparições. E depois deles já tinha passado a comitiva dos jornalistas que viajaram com o Papa no avião que se também atravessaram o passeio em frente ao altar em direção ao centro de imprensa.
O Papa Francisco chega e dirige-se, como previsto, à Capelinha das Orações. Ao imenso frenesim e de aceno com lenços brancos da chegada sucede-se o silêncio impensável para uma multidão estimada num milhão de pessoas. O silêncio pedido para a oração do Sumo Pontífice na Capelinha, só é interrompido pelos disparos das câmaras fotográficas e pelos comentários ininterruptos dos jornalistas italianos. O helicóptero que vai e volta é ruído exterior. Passam 20 minutos das seis da tarde e o silêncio perdura por alguns minutos.
Segue-se a oração de Consagração a Nossa Senhora. Em português. À nossa frente um cavalheiro impecavelmente vestido no seu fato de bom corte e que presumimos ser um segurança à paisana ajoelha-se e reza. Ao nosso lado, jornalistas fecham os olhos e rezam. Na multidão todos os que a nossa vista alcança rezam.
A cerimónia termina quando a música começa e o carro que transporta o Papa se aproxima da Capelinha para o levar a atravessar todo o recinto, rumo à saída. Mais acenos, palmas, vivas. É só por umas horas. Às 21h, ele está de volta para a benção das velas.
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