É sentada numa poltrona vermelha e com a mão na cabeça que Isabel Antunes admite que as perspetivas para este Natal “estão a zeros”. Aguarda pela chegada do filho, proprietário há mais de 20 anos do estabelecimento Joalheiros Júlio Dinis, a escassos metros da Rotunda da Boavista, e à Lusa afirma que o negócio “está parado”.
“É o sentimento partilhado por todos aqui na zona”, observa, atribuindo culpas à instabilidade causada pela pandemia e às medidas de contenção que “assustam as pessoas”.
Ao virar da esquina, na ourivesaria que Laura Delindro geriu durante 54 anos e onde agora só vai dar uma “mãozinha” à filha, o sentimento é o mesmo: “uma tristeza”.
“Não anda aqui ninguém”, desabafa, recordando que nos Natais da década de 60 e 70, as pessoas faziam fila até ao café Orfeu para comprar joias, relógios ou peças de prata e ouro.
“Agora, passam e não param”, lamenta, dizendo que se o Natal render para as despesas “já é bom” e evita que o pé-de-meia acuda este ano.
Com potenciais clientes a passar e a não parar, e com o negócio a correr “mais ou menos”, Maria Teresa, proprietária desde 1956 da Loja Ribeiro, não duvida: “a pandemia foi mais uma acha para a fogueira”.
“As pessoas ficam em casa e não estão para sair. O Natal já não é o que era”, lamenta, enquanto arruma caixas que guardam pijamas, meias e roupa interior.
Se na zona da Boavista o Natal “já não é o que era”, na Rua de Cedofeita, outrora uma das zonas comerciais de referência da cidade, os poucos que passam entre os pingos da chuva também não param.
À entrada da rua, um quiosque ambulante distribui sacos alusivos à quadra, mas no interior da loja Botónia, Maria Guilhermina, proprietária há 53 anos, confessa: “o negócio está péssimo”.
“Não há dinheiro. As pessoas só compram o que realmente precisam”, salienta.
Na loja fundada há 113 anos pelo avô, os botões, as retrosarias e bijuterias italianas - em tempos os artigos mais procurados – aguardam, à semelhança de Maria Guilhermina, por clientes na “esperança de melhores dias”.
“Tenho pena das confeções, infelizmente estão a desaparecer e muitas lojas estão fechadas”, observa.
Naquela rua, páginas de jornais e folhas de cartão decoram agora montras que em tempos se transformavam para a quadra. Mas não só.
Também na Rua 31 de Janeiro, várias são as portas fechadas e avizinha-se “um Natal triste”.
“Vai ser um Natal triste. Vamos vendendo, mas é esporadicamente”, revela à Lusa, Cândida Teixeira, proprietária há 23 anos da sapataria sediada no n. º98 da Rua 31 de Janeiro.
Cândida é das poucas proprietárias que resiste naquela rua, os outros comerciantes, diz, não aguentaram as rendas “astronómicas, exorbitantes e insuportáveis” propostas pelos senhorios.
Se em tempos, aquela era uma rua “cheia de lojas e imensa gente”, com os clientes a entrar e comprar, hoje, quando põe as chaves à porta, a sua sapataria está “às moscas”.
Da sapataria de Cândida Teixeira à loja n. º60 da Rua de Santa Catarina distam poucos metros, mas naquela que é uma das principais ruas de comércio do Porto, Rosa Branca, proprietária há 45 anos, só não fecha a porta porque é dona do prédio e da loja, caso contrário “já o tinha feito há muito tempo”.
“Passa muita gente, mas poucos entram. Este ano está mau”, observa, recordando, com nostalgia, os tempos em que os clientes, especialmente os americanos, entravam na loja, “compravam e nem queriam saber do preço”.
* Sofia Cortez, da agência Lusa
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