O Movimento Cuidar dos Cuidadores Informais, estima que em 2020 houvesse em Portugal 1,4 milhões de cuidadores informais. Contudo, segundo o estudo "Literacia em Saúde e Qualidade de Vida dos Cuidadores Informais – a realidade portuguesa",  em Portugal  "85,7% daqueles que cuidam de alguém não usufruam do estatuto de cuidador informal". Isto num "dos países mais envelhecidos do mundo, e um dos países com taxas mais elevadas de cuidados informais no domicílio na Europa" e sabendo-se que "cuidar de alguém dependente é exigente e são muitos os seus potenciais impactos negativos, nomeadamente a nível físico, psicológico, social e económico, quer na vida do cuidador, quer na vida da pessoa cuidada".

O estatuto de cuidador informal apareceu em Portugal como um projeto piloto, apenas em 30 concelhos do país, mas em 2022 foi alargado a toda a população, embora ainda haja muito desconhecimento e dúvidas em como requerer este estatuto. Sendo que, agora, depois de aprovada a Agenda do Trabalho Digno é até possível ter-se o estatuto do Cuidador-Trabalhador, e alegadamente ter direito a períodos de descanso. Também este ano, a Segurança Social publicou um guia prático do cuidador informal.

O SAPO24 preparou um guião que pretende responder às dúvidas mais básicas deste tema.

Quem pode ser cuidador informal?

Para se ser cuidador informal pode-se ter uma relação com a pessoa cuidada até ao quarto grau, mas também ser familiar do cônjuge (ou unido de facto da pessoa cuidada). Dos familiares até ao quarto grau fazem parte, filhos, netos, bisnetos, irmãos, pais, tios, primos, tios-avô, sobrinhos-neto.

O cuidador informal deve ainda ter residência legal em Portugal, ser maior de 18 anos, e reunir condições físicas e psicológicas adequadas aos cuidados a prestar à pessoa cuidada.

Importa distinguir cuidador informal principal, de cuidador informal não principal. O principal deve viver com a pessoa cuidada permanentemente. Isto não invalida que a pessoa dependente acumule o cuidado domiciliário com uma ajuda numa instituição social ou de ensino.

O cuidador informal principal não pode ainda exercer atividade profissional remunerada, ou outro tipo de atividade incompatível com a prestação de cuidados permanentes à pessoa cuidada, nem receber prestações de desemprego ou auferir remuneração pelos cuidados que presta à pessoa cuidada.

Por outro lado o cuidador informal não principal, é-o quando acompanha a pessoa cuidada de forma regular, mas não permanente. Neste caso a pessoa dependente pode ter até três cuidadores informais não principais.

E tanto no caso dos cuidadores principais, como dos não principais a lei é omissa em relação a número de pessoas das quais podem cuidar.

Como pedir estatuto de Cuidador Informal?

O requerente deve dirigir-se à Segurança Social, ou usar a Segurança Social Direta. Neste último, deve-se selecionar o menu "Família", posteriormente "Estatuto do cuidador informal" e formalizar o pedido em "Pedir novo estatuto do cuidador informal". No fim deste último processo estar concluído, autoriza-se e seleciona-se o tipo de estatuto que se pede.

No caso de a pessoa cuidada estar capaz deve ainda dar consentimento informado deste processo, sendo que a qualquer momento pode retirá-lo.

Que documentos são necessários entregar?

  • Documento de identificação (Cartão de Cidadão, Bilhete de Identidade ou Passaporte)
  • Certidão do registo do direito de residência em Portugal (emitida pela Câmara Municipal da área de residência, caso tenha cidadania estrangeira)
  • Comprovativo de residência em Portugal há pelo menos um ano
  • Comprovativo do estatuto de refugiado, se for o caso
  • Formulário de Identificação de Pessoas Singulares (Mod. RV 1017-DGSS), caso não esteja inscrito na Segurança Social

Como funciona o subsídio de cuidador informal?

O montante máximo do subsídio nunca ultrapassará o valor do Indexante dos Apoios Sociais (IAS), isto é €480,43.

Os cuidadores informais principais não podem ter rendimentos de uma atividade profissional, nem receber dinheiro por tratar da pessoa dependente. Para receberem o subsídio, além de terem que ser maiores de idade, não podem estar na idade da reforma (66 anos e 4 meses).

O rendimento relevante do agregado familiar do cuidador tem de ser inferior a 1,3 vezes o indexante dos apoios sociais em vigor, ou seja, a €624,56 (€480,43 x 1.3).

Para a consideração do subsídio só ficam de fora o rendimento social de inserção e o complemento da prestação social para a inclusão e do complemento. De resto, todos os rendimentos do agregado familiar são tidos em conta.  Assim como, o valor da prestação por dependência da pessoa cuidada. Também se consideram rendimentos auferidos em atividade por conta própria, rendas de casa recebidas e rendimentos do património mobiliário (por exemplo, depósitos bancários, ações, obrigações, certificados de aforro ou do tesouro). São ainda incompatíveis, subsídio de desemprego ou de doença, pensão de invalidez absoluta, pensões por doenças profissionais associadas à incapacidade permanente absoluta para qualquer trabalho, prestações por dependência ou pensões de velhice, com algumas exceções para pensões antecipadas.

Segundo a DECO, além das remunerações, os imóveis podem contar para estes cálculos. "Somam-se os rendimentos mensais, divididos pelo número de membros que constituem o agregado. Mas nem todos têm a mesma ponderação: o requerente do subsídio tem o valor de 1, outras pessoas maiores de idade, de 0,7, e os menores, de 0,5. Se numa casa viver um casal, a mãe de um deles e três filhos menores, os rendimentos são divididos por 3,9 (1 + 0,7 + 0,7 + 0,5 + 0,5 + 0,5)."

Como já dito anteriormente, o montante máximo do subsídio nunca ultrapassará o valor do Indexante dos Apoios Sociais, isto é €480,43.

O valor definido pela Segurança Social será o resultado da diferença entre o IAS e os rendimentos per capita da família. Contudo, se aderir ao Seguro Social Voluntário pode haver uma majoração.

Por outro lado, na eventualidade de ser atribuído um subsídio aos cuidadores informais não principais, esse é acumulável com o rendimento social de inserção e prestações por encargos familiares, seja na maternidade, adoção, deficiência ou morte.

Estes podem também, se assim o desejarem, acumular outros rendimentos profissionais e ser pagos por cuidar do dependente. Assim como, "beneficiar de normas para conciliar a prestação de cuidados com a atividade profissional, entre outras medidas “de reforço à proteção laboral”", segundo a DECO.

Se o tema dos cuidadores informais já andava na ordem do dia, também o do seu subsídio deverá entrar na discussão pública. Esta semana os deputados socialistas dos Açores propuseram, no Parlamento Regional, uma revisão desta lei e sugerem que passem a ter acesso “pessoas que aufiram valores mensais inferiores a 1,5 do IAS - Indexante de Apoios Sociais (720,65 euros)”. Assim, estas pessoas “serão apoiadas até duas vezes o valor do IAS (960,86 euros), deduzido do valor da capitação média mensal do rendimento do cuidador informal”. Contudo, os ecos desta discussão ainda não chegaram ao Continente.

Pode-se acumular com outros subsídios?

O subsídio de apoio ao cuidador informal não pode acumular com:

  • Prestações por desemprego;
  • Prestações por dependência;
  • Pensão de invalidez absoluta ou pensão de invalidez do regime especial de proteção na invalidez;
  • Pensões por doenças profissionais associadas à incapacidade permanente absoluta para trabalhar;
  • Pensão de velhice, com exceção das pensões antecipadas que, cumulativamente, preencham as condições descritas abaixo.

O subsídio é compatível com:

  • Pensão de sobrevivência;
  • Pensão de viuvez;
  • Pensão de invalidez relativa, se tiver 66 anos e quatro meses ou mais (a idade legal do acesso à pensão de velhice em 2023);

Pensão de velhice antecipada, desde que se verifique uma das seguintes situações:

  • À data do requerimento da pensão ou até 12 meses após esta data, o pensionista integrava um agregado familiar com um titular do complemento por dependência de 2.º grau, do subsídio por assistência de terceira pessoa ou do complemento por dependência de 1.º grau;
  • Ser um titular de complemento por dependência de 1.º grau que se encontre transitória ou prolongadamente acamado ou a necessitar de cuidados permanentes (mediante a avaliação do sistema de verificação de incapacidades permanentes do Instituto da Segurança Social).

Cumulativamente, deve comprovar-se, ainda, uma redução do valor da pensão superior a 20%, fruto da aplicação do fator de sustentabilidade ou do fator de redução.

O que é o regime do seguro social voluntário?

Todos os trabalhadores estão protegidos pela proteção social obrigatória, para os raros casos que ficam de fora deste regime criou-se o regime do Seguro Social Voluntário, cuja adesão, como o nome indica, é opcional.

Os cuidadores principais que decidirem aderir, contribuem 21,4% mensalmente para a Segurança Social e conquistam o direito de receber pensões sociais em caso de invalidez, velhice e morte.

Em caso de falecimento do cuidador que tenha escolhido contribuir, os familiares podem aceder à pensão de sobrevivência e ao subsídio por morte.

Quando é que o subsídio pode ser cancelado ou anulado?

A Segurança Social pode suspender o subsídio de apoio de apoio ao cuidador informal principal sempre que se verifique uma das seguintes situações:

  • Cessação da prestação de cuidados permanentes da parte do cuidador informal;
  • Interrupção da prestação de cuidados por um período superior a 30 dias consecutivos;
  • Institucionalização da pessoa cuidada; em resposta social ou unidade da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados, ou internamento em unidade hospitalar, por um período superior a 30 dias seguidos;
  • Extinção de uma das condições para a atribuição e manutenção do subsídio.

No caso do subsídio ser suspenso temporariamente, a Segurança Social reiniciará o pagamento do subsídio no mês seguinte em que tomar conhecimento da regularização das condições de atribuição do apoio.

Se a suspensão do subsídio durar mais de seis meses, a Segurança Social anula-o. O subsídio é também anulado, de forma imediata, sempre que deixarem de existir razões para o reconhecimento do Estatuto do Cuidador Informal Principal.

Que tipo de apoio têm o cuidador e a pessoa cuidada?

Os profissionais da Segurança Social e da Saúde indicados para acompanhar o caso, o cuidador informal e a pessoa cuidada (ou o seu representante), devem em conjunto fazer um Plano de Intervenção Específico (PIE). Isto é, um definir as necessidades da pessoa cuidada, quer a nível de saúde, quer de Segurança Social, da pessoa cuidada e do cuidador.

Este documento deve ser criado num prazo máximo de 30 dias, que começa a contar desde que o estatuto de cuidador informal é reconhecido, e é com base neste plano - criado através do diagnóstico dos profissionais - que deve ser garantida toda a assistência à pessoa cuidada, e apoio ao cuidador.

Embora o decreto-lei de 2022 que refere o PIE fale no direito do cuidador ao descanso, segundo a DECO este ainda é apenas virtualmente possível. Uma vez que não está criada uma estrutura de serviços de apoio domiciliário, ou internamento. Portanto, se o cuidador para cumprir um direito previsto na lei, terá que o fazer a expensas próprias ou pondo em causa a pessoa dependente.

Quais os direitos e deveres do cuidador informal?

No que aos direitos diz respeito, a Segurança Social e o profissional de Saúde comprometem-se a acompanhar e a dar formação acerca dos cuidados de saúde que o cuidador tem que prestar.

Este é um direito particularmente importante, uma vez que o estudo “Literacia em Saúde e Qualidade de Vida dos Cuidadores Informais – a realidade portuguesa", concluía que os "baixos níveis de literacia em saúde estão associados com uma pior prestação de cuidados de saúde, piores resultados em saúde nos recetores de cuidados, e uma maior sobrecarga nos cuidadores".

O cuidador informal tem ainda direito a apoio psicológico dos serviços de saúde, inclusive após morte do dependente. No que à saúde mental e ao bem-estar diz respeito, está ainda contemplada a participação em grupos de autoajuda.

Tal como já foi dito, segundo a lei os períodos de descanso estão contemplados embora não sejam ainda praticáveis. À semelhança do referido anteriormente estão contemplados o estatuto de  trabalhador-estudante, e do subsídio de apoio ao cuidador informal principal.

No caso do trabalhador cuidador, está proibida a prática discriminatória no acesso ao trabalho, à formação profissional ou às condições de trabalho.

O cuidador tem o dever de prestar todo o apoio e cuidados previstos no PIE, e é responsável por garantir que todas as necessidades básicas diárias da pessoa cuidada são cumpridas. Desde a saúde física, à mental, passando pelo ambiente que os rodeia, assim como a higiene.

Qualquer alteração no estado de saúde da pessoa cuidada deve ser comunicada à Segurança Social pelo cuidador no prazo de dez dias úteis.

Qual a relação do cuidador com o mercado de trabalho?

Como já abordado anteriormente, o cuidador informal principal não pode acumular este estatuto com o desempenho de qualquer profissão. Contudo, findo o subsídio a lei prevê forma de facilitar o regresso do cuidador ao mercado de trabalho, com o apoio do Instituto do Emprego e Formação Profissional.

No caso de estar a estudar, é facilitado ao cuidador o mesmo apoio do regime de trabalhador-estudante, com a acesso a um regime especial de faltas e à realização de exames em épocas especiais.
Já o cuidador informal não principal, tem acesso a teletrabalho. No caso deste ser compatível com o exercício da sua atividade, e se a entidade empregadora for conivente. Contudo, esta só pode opor-se com base em razões imperiosas ao funcionamento da empresa. O cuidador tem acesso a teletrabalho durante 4 anos, seguidos ou não.
Por fim, há ainda o regime de cuidador-trabalhador, que deve ser comunicado à entidade empregadora com 30 dias de antecedência, por escrito, indicando o prazo previsto e juntando o documento comprovativo do estatuto.
Este regime prevê que o cuidador possa tirar uma licença de cinco dias úteis consecutivos, para assistência à pessoa dependente.
O cuidador-trabalhador pode ainda trabalhar a tempo parcial durante 4 anos (que não têm que ser seguidos), e o tempo dedicado é aquele que tiver sido pedido pelo trabalhador diariamente, de manhã ou de tarde, ou em três dias por semana. Tem ainda a possibilidade do horário flexível. Seja qual for a modalidade escolhida, não pode ser penalizado quanto à avaliação e progressão na carreira.