É impossível determinar quantos portugueses vivem exatamente neste emirado. Ao todo, no país, o Ministério dos Negócios Estrangeiros sabe que estão registados no consulado 4470 são portugueses, mas admite poderem ser muitos mais tendo em conta que as inscrições consulares não são obrigatórias. Só em eleitores, o Ministério da Administração Interna sublinha que estão registados nos cadernos para a eleição de 2024 para o Parlamento Europeu, de 9 de junho, 3095 eleitores residentes nos EAU, cuja capital e consulado é Abu Dhabi.

Localizado nos Emirados Árabes Unidos (EAU), o Dubai tem hoje em dia uma população sobretudo composta por estrangeiros, cerca de 80%. Entre estes, os portugueses são cada vez mais e procuram sobretudo qualidade de vida.

Mas o que leva os portugueses ao Dubai? João Araújo Silva, consultor numa Big Four (quatro maiores empresas especializadas em auditoria e consultoria do mundo) no Dubai, não nega, em entrevista ao SAPO24, que a maior vantagem é a fiscal, que passa pelo não pagamento de impostos de rendimentos sobre o trabalho, o IRS.

A esta realidade, acrescenta-se o facto de não existir qualquer sistema de previdência social, ou seja não se paga Segurança Social o que leva à necessidade de ir para o país com um plano para poupar, algo que é possível tendo em conta a diferença de salários. Além disso, é ainda aconselhável subscrever um seguro de saúde para ter acesso a saúde privada.

O emigrante neste caso pode também optar por fazer descontos voluntários para a Segurança Social em Portugal.

“Existem centenas de pessoas a concorrer a vagas disponíveis no Linkedin, uma simples consulta na rede social dá para obter esta informação. Isto acontece porque o Dubai quer ser a primeira economia do mundo e por isso efetivamente os Emirados estão a tentar atrair o maior número de talentos a nível internacional”, conta o português.

Acrescenta ainda que na sua integração ajudou o facto de não ser o único expatriado que conhece: “No meu caso, vou três ou quatro dias por semana ao escritório e, quando vou, almoço com pessoas de todas as culturas e de todas as nacionalidades. O número de expatriados, ou seja, pessoas que não nasceram aqui é muito grande”.

Por esse motivo, não vê a possibilidade de abandonar o emirado. O Dubai faz parte de um país com sete estados criado em 1971, depois do Império Britânico decidir abandonar o Golfo Pérsico.

Abu Dhabi, Dubai, Sharjah, Ajman, Umm Al Quwain e Fujairah decidiram formar os Emirados Árabes Unidos numa reunião realizada no Dubai a 18 de julho de 1971. A fundação de um estado independente e soberano foi formalmente proclamada a 2 de dezembro de 1971. Poucos meses depois, a 10 de fevereiro de 1972, Ras Al Khaimah finalmente juntou-se à federação.

Os governantes dos sete Emirados formam um Conselho Supremo, para atuar como autoridade suprema. A capital do país é em Abu Dhabi, e o país é governado num sistema de federação de monarquias absolutas hereditárias árabes. O atual governante do Dubai, o Xeique Mohammed bin Rashid Al Maktoum, é também o vice-presidente e primeiro-ministro dos EAU, desde 2006.

“Existe o mito de que o Dubai tem um custo de vida muito alto, mas existem muitas coisas que são mais baratas do que em Portugal. Existem restaurantes, habitação e lazer para todas as carteiras. Não existe uma generalização do custo de vida, ou seja, podemos observar preços para todos os gostos”, revela o consultor que vê como principal vantagem da sua mudança para o país o aumento da qualidade de vida.

“Como os ordenados são maiores as despesas que se podem fazer são superiores. Eu desde que aqui cheguei consigo pagar uma casa, sair ao fim de semana e viver uma vida normal, além de juntar dinheiro, algo que era muito difícil em Portugal com a mesma função. Eu faço exatamente a mesma coisa que em Portugal, com a única diferença que a lei doméstica aqui é diferente”, sublinha.

Com grande experiência na área da fiscalidade, associada à sua função como consultor, explica que a lei do país ainda está no início neste aspeto: “Os impostos só agora começam a ser aplicados às empresas. Começaram o ano passado, mas com efeitos a 2025”.

Com vantagens fiscais a vários níveis, o país criou recentemente o Corporate Tax, em que empresas passam a estar obrigadas a pagar 9% sobre um lucro acima de 375 mil dirhams (equivalente a 94 mil euros), mas que se estiverem dentro de free zones podem anular este valor. Esta situação faz com que o Dubai continue a ser um lugar atrativo para os milionários continuarem a sediar as suas empresas, o que faz aumentar os preços do imobiliário.

Apesar disso, para o português “continua a ser muito bom comprar aqui casa, em especial quando se faz a comparação em termos de serviços”.

Também do ponto de vista do mercado imobiliário para particulares, o consultor não esconde as vantagens fiscais. Quando alguém decide adquirir um imóvel no Dubai, é obrigado a garantir 20% do valor do mesmo e depois pagar o imposto de transferência de propriedade, o que seria o IMT em Portugal.

Depois de adquirido o imóvel não se paga qualquer imposto sobre o mesmo, ou seja o IMI não existe. O mesmo acontece com o carro, uma vez que também não existe imposto de circulação e o combustível é mais barato. Com 20 euros enche-se um depósito de um SUV, garante João.

Como emigrar para o Dubai?

Segundo o Ministério dos Negócios Estrangeiros português, qualquer cidadão português pode entrar livremente nos Emirados Árabes Unidos sem que para o efeito tenha que obter um visto.

Os vistos de entrada são concedidos à chegada ao país, por um período de 90 dias. É necessário, no entanto, que o passaporte tenha pelo menos 6 meses de validade, sob risco das autoridades dos EAU não deixarem entrar no país nem embarcar para outro destino. 

Segundo o estabelecido entre os países que pertencem à UE/Schengen e os EAU, cada cidadão português pode ter um visto de 90 dias à chegada aos EAU, não podendo ficar mais do que esses 90 dias (seguidos ou intercalados) num período de 180 dias, que começa a contar desde o 1.º dia de entrada nos EAU. Ao fim desses 90 dias de permanência nos EAU, terá de sair dos EAU e só poderá regressar no final dos 180 dias.

Quem deseje tornar-se um expatriado e viver com um visto de residente pode solicitá-lo. Na maioria dos casos, o visto de residência é válido por dois anos, podendo depois ser renovado. Como cerca de 90% da população dos Emirados Árabes Unidos é expatriada, o governo tornou o processo de obtenção de visto o mais simples possível. Muito poucas nacionalidades estão impedidas de se deslocar e trabalhar nos Emirados Árabes Unidos. Normalmente, a empresa que emprega o indivíduo será responsável por garantir o visto e os custos administrativos associados.

Existem problemas administrativos na obtenção de vistos? “Já ouvi histórias de pessoas com alguns problemas. Não foi o meu caso, como estou numa Big Four foi tudo pago pela empresa”, conta João.

“Quando vim para cá tive que adiantar o pagamento da validação do meu certificado de curso universitário, mas fui rapidamente reembolsado. Depois a empresa é obrigada por lei a pagar-me alojamento durante um mês e voo, e assim aconteceu”, sublinha.

O português alerta que existem alguns “esquemas” e é necessário ter cuidado com algumas ofertas de emprego. Porém, no geral, o “Dubai está muito avançado ao nível de inteligência e no geral nos países do Golfo é obrigatório ser a empresa a tratar do processo de integração”, destaca.

“O Dubai tem investido muito neste sistema de atração de talento e para isso tem de compensar o facto das pessoas estarem longe de casa. No caso da minha empresa recebo todos os meses um housing alowance que me paga a casa, despesas de voos, que ainda me sobra para aquilo que eu utilizo, porque vou de três em três meses a Portugal”, nota, e sublinha que “o número de Portugueses tem vindo a crescer”.

“Eu estou num grupo do WhatApp de portugueses em que estão quase 800 pessoas e diariamente existem pessoas novas a dizer que chegaram”, diz o português.

Existe emigração descontrolada? Para o consultor esse é um conceito que não faz parte da realidade dos Emirados. “Todas as pessoas entram com um objetivo e se ficarem mais de três meses deve existir algum tipo de ocupação. Passando os três meses do visto de turista a pessoa é chamada, paga uma multa e é deportada”. 

Por esse motivo, não se lembra de ver pessoas na rua sem emprego. “É tudo muito controlado”, revela. “Existe quem diga que o Dubai é uma empresa e o CEO é o Sheik”.

Como é viver no Dubai?

Neste ponto o português é perentório: A pior parte é o calor, apesar de se ter ar condicionado em todo o lado, por vezes até no exterior. 

“No geral aquilo que atrai pessoas para o Médio Oriente, com especial destaque para o Dubai, é a abertura. Estamos num país árabe, regulado pela lei da Sharia (sistema jurídico do Islão), mas aqui isso não se nota imenso”, salienta.

“É possível beber álcool, os supermercados têm parte de 'não muçulmano', onde se vende porco, ou seja é bastante aberto. Existem outros locais no Médio Oriente, como a Arábia Saudita ou o Qatar onde isto não acontece”, acrescenta.

Se em tempos o Dubai foi um dos maiores produtores de petróleo do mundo, hoje em dia o país vive sobretudo do turismo e do setor da hospitalidade com um hotel em cada esquina, de luxo e não só. Isto “apesar das preocupações com a descarbonização num país que é no meio do deserto”, sublinha o português.

“Nos últimos anos existe um esforço muito grande de incentivo a políticas mais ecológicas, com criação de transportes públicos, utilização de carros elétricos que são usados em força com apoio do governo e, por isso, quase não se nota que se está num país árabe” diz ainda.

Apesar desta realidade, o país que se situa no meio do deserto é ainda uma referência nas maiores extravagâncias a nível ambiental e arquitetónico, desde o maior edifício do mundo, o Burj Khalifa, com 828 metros de altitude e 160 andares, ao maior centro comercial do mundo, o Dubai Mall, que cobre mais de 1 milhão de m² numa área equivalente a 200 campos de futebol e onde existem nomeadamente o Aquário e Zoo Subaquático do Dubai e o Dubai Ice Rink, uma pista de gelo de tamanho olímpico.

Além destes espaços, não muito longe existe ainda o Mall dos Emirados, que era à data da sua construção o maior do Médio Oriente, entetanto ultrapassado pelo incomparável Dubai Mall. Aqui, existe no interior a Ski Dubai, um dos maiores resorts de ski interior do mundo, com 22500 metros quadrados de área. Neste espaço, um sistema de isolamento é a chave para manter a temperatura de -1 grau Celsius durante o dia e -6 graus durante a noite, quando a neve é produzida. Neste local, os praticantes de ski podem praticar o desporto em 5 pistas com dificuldades variadas, tendo a mais longa 400 metros.

O Dubai é ainda uma das cidades do mundo com mais parques temáticos com uma vasta oferta para diferentes carteiras e idades. Numa parte do mundo onde a água não é abundante, a cidade é a casa daquele que é considerado o maior parque aquático do mundo, o Parque Aquático Aquaventure, com 105 escorregas, experiências com focas e golfinhos e um oceanário no interior.

A estas atrações juntam ainda outras extravagâncias como o Miracle Garden, o maior jardim de flores naturais do Mundo, com mais de 150 milhões de flores, com princesas, animais, um avião da Emirates, uma vila com Estrumpfes, tudo coberto de flores, numa cidade no meio do deserto.

O país é assim um paraíso para emigrantes que mudam de vida em família ou sozinhos. “Com a cultura local sempre vibrante nunca nos sentimos sozinhos. Em família existem escolas internacionais ótimas e muitos casais portugueses colocam os filhos em escolas com preços bastante acessíveis”, diz João Araújo Silva.

Nota ainda a vantagem de as crianças portuguesas no Dubai passarem a falar três línguas: português, inglês e árabe. Nas vantagens para as crianças, os parques temáticos estão no topo das preferências dos mais novos, que passam a adorar viver na cidade para poderem estar perto deste tipo de diversões que não existem em Portugal.

Uma ditadura que quer ser Ocidental

Apesar do sistema ditatorial governado pelos Sheiks, o Dubai e todos os EAU têm feito um esforço para se aproximar ao Ocidente. 

Mesmo assim, é uma sociedade definida pelas habilitações literárias e o dinheiro de cada um. “A minha experiência pode ser diferente de uma pessoa que não tenha formação superior”, sublinha o consultor português.

“Existe muita mão de obra barata e muitos serviços de conveniência suportados por pessoas que ganham menos. Por exemplo, eu posso mandar vir para casa em 20 minutos compras do supermercado", conta.

Além disso, existe no país uma verdadeira associação entre serviços de conveniência e tecnologia. “Existem aplicações para tudo. Eu por exemplo, utilizo uma aplicação para me passarem a ferro a camisa. Deixo as camisas à porta, pago com uma aplicação e no dia seguinte elas aparecem-me passadas no mesmo sítio sem ninguém as roubar”, diz.

A esta característica junta-se a segurança e, neste ponto, João afirma com certeza: “Ninguém rouba nada aqui, porque as consequências de roubar são bastante graves e por isso posso deixar um iPhone no meio da rua e sei que ele vai lá estar quando voltar. Se não estiver, alguém já me está a contactar para me devolver o telemóvel”.

Espalhadas pela cidade existem câmaras em todo o lado e pelo reconhecimento da face rapidamente se identifica onde uma pessoa está. Quando se faz um visto fica-se imediatamente integrado no sistema Emirates ID e passa-se a estar visível no sistema de vigilância. 

“Em uma hora conseguem encontrar uma pessoa de forma eficiente. Eu ainda não tive nenhum problema, mas sei de pessoas que já perderam a carteira e rapidamente foi parar à empresa onde trabalham”, afirma.

E, assim, as autoridades dos Emirados garantem que as várias dezenas de nacionalidades a viver no país não correm qualquer risco e vivem em harmonia uns com os outros. “Aqui existe muita diversidade e no meio de tantas pessoas podemos ter uma sensação de risco, mas as pessoas respeitam a autoridade e têm respeito pelos outros e a sua propriedade. As pessoas que têm piores condições talvez não cometam crimes porque têm medo de voltar aos seus países”, diz o português.

Ainda assim é um país com campos de trabalho para a construção e outros setores, onde muitas pessoas procuram uma vida melhor do que nos seus países. “Aqui a autoridade funciona e existe respeito pela individualidade do outro”, sublinha João, que garante ser esta uma das razões de sucesso para a paz no país.

A convivência com a religião muçulmana, que é a religião oficial, do país também não é difícil para um Ocidental nem a vida das mulheres. “No que diz respeito às mulheres, as pessoas pensam que devem andar tapadas, mas isso não é verdade. Nos locais de culto claro que sim, mas em outros sítios não. Em locais públicos, marinas e ginásios as mulheres vestem-se como no Ocidente”, garante o consultor, que reforça que as pessoas vivem livres, apesar da regime absuluto. 

Regressar com dinheiro isento de impostos e não pagar impostos em Portugal

Como qualquer emigrante nacional que tenha obtido rendimentos em outro país, os portugueses que emigram para os Emirados Árabes Unidos podem requerer em Portugal o Estatuto de Residente Não Habitual (RNH). Este é um regime especial que oferece redução do Imposto sobre Rendimentos das Pessoas Singulares (IRS), durante 10 anos, a novos residentes estrangeiros (de qualquer nacionalidade) e a cidadãos portugueses que tenham estado emigrados mais de 5 anos.

Para obter este regime fiscal mais favorável, o residente não habitual tem de exercer uma atividade profissional considerada de “elevado valor acrescentado” ou ser pensionista.

O regime dos RNH foi revogado com efeitos a 1 de janeiro de 2024, mas até 31 de março de 2025 ainda é possível apresentar pedido de inscrição e beneficiar deste regime fiscal.

Quais as vantagens do Estatuto?

Se os valores resultantes de atividades de “elevado valor acrescentado” (médicos, professores universitários, físicos, diretores e gestores, especialistas em tecnologias de informação, jornalistas, autores, artistas criativos, agricultores, trabalhadores qualificados da floresta, pesca e caça) forem recebidos em território português, os rendimentos enquadrados nas categorias A (trabalho por conta de outrem) e B (trabalho independente) são tributados à taxa fixa especial de 20%.

No entanto, se os rendimentos forem de fonte estrangeira, como é o caso de rendimentos obtidos enquanto se reside e trabalha no Dubai, acontece o seguinte: eliminação da tributação em Portugal. Ou seja, pratica-se o método da isenção, para os rendimentos de atividades com “elevado valor acrescentado” das categorias A (trabalho dependente) e B (trabalho independente). Aplica-se também o método da isenção para as categorias E (rendimentos de capitais), F (rendimentos prediais) e G (rendimentos de mais-valias) desde que tributados no outro país, território ou região.  As pensões (categoria H) não estão totalmente isentas: sobre o valor líquido incide uma taxa de 10%.

Esta situação é particularmente vantajosa para quem trabalhou nos EAU sabendo já que não irá pagar qualquer imposto sobre o trabalho (IRS) enquanto estava no país do Médio Oriente. Ao chegar a Portugal o dinheiro desse rendimento fica também isento e o dinheiro é mantido de forma totalmente livre de impostos. Esta situação é menos vantajosa para quem trabalha em países onde se paga impostos sobre o trabalho, como é o caso dos países da Europa ou Estados Unidos da América (EUA), apesar do estatuto ao chegar a Portugal poder ser exatamente o mesmo.

Pode beneficiar-se deste regime fiscal especial durante 10 anos consecutivos, a partir do ano da inscrição como residente em território português. Este período não pode ser revalidado. No caso de suspensão deste regime especial, pode retomar-se o gozo do direito num qualquer ano seguinte, dentro desse prazo de 10 anos, desde que volte a ser considerado residente para efeitos de IRS.

Quando são as candidaturas para beneficiar do estatuto RNH?

O pedido deve ser feito até 31 de março do ano a seguir ao qual o beneficiário se tornou residente.

Para se beneficiar do estatuto, quando se entrega a declaração de rendimentos através do Portal das Finanças, deve juntar-se o Anexo L devidamente preenchido com a indicação do código da atividade de “elevado valor acrescentado” e dos montantes recebidos.

No caso de rendimentos obtidos no estrangeiro, deve também indicar o método pretendido de eliminação da dupla tributação internacional.