“O ponto da situação não é fácil de descrever. Tivemos um número muito elevado de destruição em casas de primeira e de segunda habitação. Neste momento, já temos o levantamento de todas as casas e já sabemos o que cada uma delas necessita [construção ou reconstrução]”, explicou à agência Lusa o vice-presidente deste município, Jorge Custódio.
O autarca sublinha que estão a tentar arranjar mecanismos de ajuda para as construções, cujos prejuízos são de “pequena monta” (até cinco mil euros), de forma que pelo menos essas possam já arrancar com a reconstrução.
“Mas temos todas as outras de primeira habitação, que são cerca de 112, e de segunda habitação, que são 387, e queremos acudir o mais urgente possível”, disse.
Mas se para as casas de primeira habitação há a garantia de ajuda para a totalidade da sua recuperação por parte do Governo e da própria Comissão de Coordenação e desenvolvimento Regional do Centro (CCDRC), o mesmo já não acontece para as de segunda habitação, que são a grande maioria.
“A nossa preocupação vai para as casas de segunda habitação. Até porque é de uma monta maior, são 387 como disse, e não nos foi ainda garantido que vai haver ajuda para estas casas, sendo certo que estas casas, para nós, têm quase o mesmo peso que as primeiras, porque há muita população que mantém aqui as suas casas e que moram cá a maior parte do tempo [embora não as tenham oficialmente como primeira habitação]”, frisou.
Jorge Custódio recorda aos portugueses que querem ajudar a população de Pampilhosa da Serra que o podem fazer através da doação de materiais de construção ou de cercas de vedação para animais, uma vez que ao nível de roupas e de alimentação todas as pessoas estão salvaguardadas.
O autarca sublinha que, no total, arderam cerca de 32 mil hectares da floresta de Pampilhosa da Serra, ou seja, ardeu 80% do concelho, sendo que oito mil hectares arderam em junho, no incêndio de Pedrógão Grande, 20 mil no incêndio de 15 de outubro e, pelo meio, tiveram ainda um outro incêndio de grande escala.
“O impacto vai ser terrível. Primeiro, porque sendo um concelho puramente florestal, toda a atividade que se mexia à volta dessa atividade não vai parar só este ano. Nos próximos anos vai acentuar-se. E, segundo, todas as pessoas que fazem a exploração da floresta, neste momento, estão claramente a tentar cruzar os braços”, disse.
Isto porque o valor que está a ser pago à tonelada da madeira não compensa de todo fazer a recolha da lenha nos terrenos.
“O futuro não vai ser risonho. Obviamente que sozinhos não vamos conseguir. Eu tenho dito isto muitas vezes, não basta repor. Se a ideia for só ajudar-nos a repor o que existia, sabe a pouco”, sustenta.
O autarca entende que, após este flagelo, o país tem que perceber que este é o momento de olhar para o Interior e de o ajudarem a alavancar: “Não só repor, mas ajudar a fazer mais. Ou então, aí sim, aí temos uma geração perdida durante muitos anos”.
Na localidade de Sobral de Baixo, uma das mais afetadas pelo incêndio de outubro, João de Menezes, diz que tudo se passou de forma tão rápida que nem sabe explicar muito bem o que aconteceu.
“Estava aqui, vi o fogo lá em cima, naquele cabeço. Como já se tinha passado quando foi o de Pedrógão Grande. O fogo já esteve naquela zona e eu pensei, não vai chegar cá. Não houve bombeiros, não houve nada. Só houve fogo de repente. Quando procurei fazer algo, de repente era tarde de mais”, disse.
O músico, de 58 anos, esteve a viver na Alemanha 25 anos e há dois mudou-se para Sobral de Baixo.
A sua casa foi uma das que ardeu por completo. Perdeu tudo, roupas, todo o material de estúdio que usava profissionalmente.
“Os prejuízos são avultadíssimos, só no equipamento de estúdio… Queria ter aqui uma atividade ao nível da música, foi tudo com o fogo”, recorda.
O município de Pampilhosa da Serra realojou João de Menezes.
“Estou numa residencial, tenho comida e tenho roupa, porque entretanto a roupa também foi e estou a tentar reconstruir no fundo a minha ideia da vida”, disse.
O músico diz que o futuro tem que ser recriado e adianta que passa por Pampilhosa da Serra.
“É extremamente duro olhar à volta e ver esta negrura toda. Isto é macabro, uma pessoa ver-se dentro disto, é macabro, é demasiado”, conclui.
Já Carminda Silva, outra moradora de Sobral de Baixo, diz que o fogo chegou à povoação à noite.
Esta reformada de 84 anos perdeu uma casa que usava para arrumações.
“Esta minha casa era a casa de arrumação. Tinha uma mala cheia de cobertores, tinha lá as minhas batatas e as minhas cebolas, fiquei sem nada. Andei a trabalhar todo o verão para ficar sem nada. Olhe, foi uma tristeza”, desabafa.
Atualmente, está a viver na casa de uma cunhada e diz que tem recebido ajuda.
“Têm cá vindo trazer umas coisinhas para comer. Mas eu queria lá as couves da minha horta. Tinha lá umas couvinhas de nabos, eu tinha feijão. Agora, não tenho uma couvinha para comer. Olhe, trouxeram-me uma couvinha, mas ela não dura para sempre. Estou muito longe da Pampilhosa, não tenho carro para lá ir buscar as coisas. Não sei como é que isto vai ser”, disse.
Carminda Silva está a ponderar ir para Lisboa, viver para junto de um sobrinho.
“Já cá veio um sobrinho para me levar para Lisboa e eu disse que não estou preparada (…). Mas agora tenho que mandar dizer que me venha buscar, que não aguento”, concluiu.
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