Carolina ou Anabela não se recordam de quantos dos seus amigos da escola ficaram em Pedrógão Grande. Serão muito poucos ou nenhum. A maioria saiu por falta de emprego, dificuldade em encontrar uma casa, "dificuldade com tudo", diz à agência Lusa Anabela David, jovem de 26 anos que vive na aldeia da Vergeira.

Os jovens de Pedrógão Grande, Castanheira de Pera e Figueiró dos Vinhos são cada vez menos nestes concelhos envelhecidos, pobres e em que a quase totalidade das empresas têm menos de dez trabalhadores.

Viver nestes territórios, assume Anabela, é "um contínuo ato de resiliência".

No entanto, depois dos incêndios, não se fala de desistências pelas aldeias ou vilas. Quando a agência Lusa pergunta aos habitantes se conhecem alguém que saiu do concelho depois dos fogos, a resposta é um "não" ou um "não sei".

Os incêndios também despertaram novos negócios. O projeto Renascer Challenge, um concurso de negócios lançado por pessoas do território, recebeu vários candidatos com ideias que vão do turismo rural, à produção da avelã, uma aplicação ou a criação de uma loja ‘online' para vender os produtos do Pinhal Interior.

Anabela e o namorado, Miguel Esteves, tinham a ideia de restaurar uma casa dos avós para transformar num projeto de turismo rural. O incêndio passou e destruiu tudo.

Olharam para o terreno queimado dos avós de Miguel e decidiram fazer alguma coisa com ele, disse à agência Lusa Anabela David.

Há uma semana, terminaram de preparar os dois hectares de terra e, no início de outono, vão criar uma exploração de noz macadâmia e avelãs, aproveitando a experiência dos pais da Anabela, que trabalham com este fruto seco em Itália.

"Já que tínhamos de limpar o terreno e não o queríamos deixar sem nada e estamos os dois desempregados, quisemos rentabilizar e fazer com que esta seja uma maneira de termos o nosso próprio emprego, já que é muito difícil encontrar um", vincou a jovem de Pedrógão Grande.

"Pensámos, por pouco tempo, em abandonar, mas seria pior. Eu e o Miguel estamos muito ligados a Pedrógão e às nossas coisas e à nossa família. Não era do nosso agrado sair daqui", refere.

Daniel Bernardo, de 32 anos, mudou-se de Oeiras para uma aldeia de Pedrógão Grande, perto de Vila Facaia, para a casa que era dos seus avós e que tinha sido reconstruída antes do incêndio.

"Quero ficar aqui. Não penso em voltar atrás, porque vejo aqui outras possibilidades", diz o jovem que está a pensar em avançar com projetos na área do turismo local.

Em Figueiró dos Vinhos, Ricardo Soares, de 18 anos, foi o mais jovem participante no Renascer Challenge, com a proposta de um sistema de gestão para incubadoras e associações e que poderá, no futuro, ser utilizado até em escolas.

Neste momento, está a fazer um estágio numa tecnológica de Coimbra, mas gostava de regressar à sua terra, onde criou, há quatro anos, a Figueiró TV, para promover a sua terra natal.

"O que noto é que, com os fogos, há empresas a quererem ir para a região. Tentam ir e tentam apostar na região. Antes dos fogos, éramos uns desconhecidos", constata.

Carolina Gama, jovem de 26 anos natural de Pedrógão Grande, decidiu avançar há uns anos com a plantação de medronheiro em terrenos de família entre Oleiros e o Fundão, depois de ter ficado desempregada.

2018 é o primeiro ano em que vai fazer a colheita do medronho e será também o ano em que arranca com o projeto "Sabores de Cá", uma loja virtual com produtos do Pinhal Interior.

A ideia para o projeto surgiu depois do incêndio, quando tinha que indicar a pessoas que passavam pelo território onde poderiam comprar o queijo da região ou o bucho recheado.

Carolina reparou que os turistas ou visitantes teriam que "ir de produtor a produtor" e, fora da região, teriam dificuldade em fazer encomendas.

Nesse momento, surgiu a ideia de criar a "Sabores de Cá", por forma a garantir uma oferta centralizada para os interessados e, ao mesmo tempo, um meio de escoamento para os produtores da região.

A loja vai ser apresentada no final de julho, durante a feira do ano de Pedrógão Grande, e pretende vender enchidos, queijos, bolachas, azeite, mel, vinho de Cernache do Bonjardim ou cerveja da Sertã, entre outros produtos.

Para além da loja ‘online' - complementada por um blogue onde vai querer contar a história dos produtores e associar um rosto a cada produto -, Carolina Gama quer avançar com vários pontos físicos, seja em postos de turismo, centros de interpretação ou hotéis.

O projeto, sublinhou, poderá também motivar outros produtores a coletarem-se e a poderem integrar o projeto, referindo que, paralelamente, está a trabalhar com o Contrato Local de Desenvolvimento Social de Pedrógão Grande para criar uma marca regional.

Sobre o porquê de ter avançado com um projeto depois dos incêndios terem afetado tanto o concelho, Carolina Gama realça que era "o mínimo que se poderia fazer, que os portugueses foram espetaculares na ajuda" ao território.