“Penso que neste momento está totalmente excluída. O próprio Presidente Erdogan já disse que depois do referendo [de domingo sobre o reforço dos poderes presidenciais] iria eventualmente desistir do pedido de adesão”, assinalou Paulo Rangel.
O eurodeputado do PSD relatou uma “experiência pessoal”, quando foi relator de um documento do grupo parlamentar do Partido Popular Europeu (PPE) para o futuro da Europa. “Fui derrotado, venceu a posição, nomeadamente pelos deputados alemães e deputados franceses, de que a Turquia nunca poderá integrar a UE”.
Apesar de não defender a adesão plena da Turquia ao clube comunitário, Paulo Rangel tem sugerido uma posição intermédia: “Não sou a favor da adesão da Turquia mas era contra que se dissesse que a Turquia não pode entrar em caso nenhum, uma vez que o processo foi iniciado teria de se ver ano a ano, e caso a caso, daqui a dez anos podia estar noutra situação”, explicitou.
Ao reconhecer que existe hoje “uma grande hostilidade à entrada da Turquia num setor muito forte da opinião pública europeia”, defende que o início do processo de negociações em 2005 deveria implicar outro rumo.
“Neste momento há uma razão evidente para mim, nunca fui a favor da entrada da Turquia mas a partir do momento em que se abriu essa porta, acho que temos de lidar com o processo (…), mas esta deriva autoritária do regime torna totalmente incompatível a presença de um Estado como a Turquia num clube de democracias que é a UE”, salientou.
Paulo Rangel assinalou ainda que não se revê nas posições de “alguns colegas eurodeputados”, quando consideram que a responsabilidade da atual situação cabe exclusivamente à União.
“Não é. Uma das razões pelas quais nós condenamos o Presidente Erdogan é porque ele é responsável pelas coisas que está a fazer. Não somos nós que somos responsáveis pelos erros que ele comete. (…) Também recuso essa ideia de uma autoculpabilização do ocidente. Mas não tenho dúvidas que podemos fazer muito mais”, explicou.
Nas declarações à Lusa, a deputada do Bloco de Esquerda (BE) Marisa Matias optou por recordar as difíceis relações diplomáticas entre Ancara e diversos países europeus, em particular Alemanha e Holanda, mas considerou que a UE “continua a depositar em Erdogan e na Turquia uma enorme confiança, e a valorizar e reforçá-la politicamente, a reforçar o seu papel na região, e a fazer o trabalho sujo relativamente aos refugiados”, numa referência ao controverso “acordo UE-Turquia” sobre refugiados em vigor desde março de 2016.
Maria Matias recordou ainda “os muitos deputados do parlamento turco” que foram presos nos últimos meses, em particular do Partido Democrático dos Povos (HDP, pró-curdo e de esquerda, terceira força política) e “apenas por serem da oposição”. E numa referência às iniciativas no Parlamento Europeu (PE), referiu-se às ações de solidariedade já organizadas em torno de uma questão “muito delicada, porque há aqui uma linha ténue entre o que é ingerência e o que é a intervenção que deve ser efetuada”.
Relações “completamente comprometidas” foi a forma de a eurodeputada do PS Ana Gomes definir o atual estado do diálogo UE-Turquia.
“As relações UE-Turquia há muito que estão agravadas e quem se afastou do caminho foi a Turquia, com todas as medidas de repressão que adotou mesmo antes do golpe de Estado. Mas ainda mais depois do suposto golpe de Estado”, considerou, numa referência ao fracassado golpe de Estado de 15 de julho de 2016 à instauração do estado de emergência e da vasta “purga” que se seguiu, assinalada por milhares de detenções.
Para o deputado do PCP no PE, Miguel Viegas, a questão da adesão à UE “é uma decisão do povo da Turquia, a própria vontade da Turquia já foi mais assertiva do que aquela que é hoje”, como reconhece.
Numa referência aos recentes incidentes diplomáticos com a Holanda e Alemanha — com o impedimento da realização de comícios com ministros turcos em torno do referendo constitucional de domingo, incluindo a proibição de um ministro entrar em território holandês –, considerou que “devem servir para envergonhar os governos europeus e os partidos que procuraram fazer desta questão uma arma de campanha eleitoral (…) e uma certa instrumentalização da questão turca para consumo interno”.
Esta atitude, na sua perspetiva, questiona a “legitimidade” da UE, dos seus Estados-membros “e em particular daqueles que procuraram condicionar a realização de uma campanha eleitoral, que nós podemos criticar”.
As negociações de adesão da Turquia iniciaram-se em outubro de 2005. Dos 35 capítulos necessários para completar o processo de adesão, 16 foram abertos e um encerrado.
Em paralelo, a Turquia também iniciou um diálogo sobre a liberalização dos vistos com a UE, incluindo um “Roteiro em direção a um regime isento de vistos”. Caso a Turquia cumpra as cinco condições finais acordadas com a UE, a garantia de isenção de vistos para a zona Schengen seria garantida, mas o processo está num impasse.
Em 24 de novembro de 2016 o Parlamento Europeu (PE) suspendeu as negociações de adesão com a Turquia devido à situação dos direitos humanos e do estado de Direito no país, uma decisão que não é vinculativa.
E em 13 de dezembro, o Conselho Europeu (chefes de Estado e de governo da UE) decidiu que não seriam abertas novos ‘dossiers’ devido à “situação prevalecente”, e quando se considera que o rumo autocrático da Turquia torna impossível novos progressos no processo de adesão.
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