“Israel violou uma vez mais a soberania do Líbano (…) durante uma perigosa escalada militar”, deplorou Hassan Diab no Twitter, na primeira reação oficial do Governo libanês aos bombardeamentos de segunda-feira na fronteira israelo-libanesa.
“Apelo à prudência nos próximos dias, por recear que as coisas se podem agravar devido a uma forte tensão na fronteira”, acrescentou Diab.
Na segunda-feira o exército israelita indicou que um grupo de três a cinco pessoas, armadas, percorreram alguns metros para além da linha azul que separa Israel do Líbano e “as forças de segurança abriram fogo”.
Israel responsabilizou o movimento armado xiita pró-iraniano Hezbollah, o seu influente inimigo do outro lado da fronteira, que considerou “totalmente falsas” as acusações de infiltração.
“Tudo o que se passa neste momento é o resultado dos esforços do Irão e dos seus intermediários libaneses para se estabelecerem militarmente na nossa região”, declarou hoje o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu no decurso de uma visita à sede do comando do exército no norte de Israel.
“Faremos o necessário para nos defendermos e sugiro ao Hezbollah que tenha em consideração esse facto”, acrescentou, após ter considerado na segunda-feira que o movimento xiita “brinca com o fogo”.
Após diversos conflitos, Israel e o Líbano permanecem tecnicamente em estado de guerra.
A Finul — a força de manutenção de paz da ONU deslocada no sul do Líbano — apelou à “máxima contenção” e indicou que abriu um inquérito.
Diab acusou Israel de procurar “mudar as regras” estabelecidas entre os dois países desde a última guerra, em 2006, que opôs o exército israelita ao Hezbollah, e de fazer pressão para alterar o estatuto da Finul que expira no final de agosto.
“Há uma tentativa de fazer pressão sobre o Líbano através da ameaça de reduzir o número de forças da Finul caso não seja alterado o mandato da missão”, declarou Diab.
“O Líbano recusa uma alteração das prerrogativas da Finul”, acrescentou.
O chefe do Hezbollah, Hassan Nasrallah, rejeitou em maio um pedido norte-americano destinado a reforçar os poderes da Finul, designadamente através das atividades de recolha de dados e vigilância, ao afirmar que se tratava de um pedido israelita.
No início de maio, a embaixadora norte-americana na ONU, Kelly Craft, afirmou que a Finul estava “impedida de preencher o seu mandato” e que o Hezbollah “estava num processo de se armar e alargar as suas operações”.
Por sua vez, o Presidente libanês, Michel Aoun, declarou que o incidente na fronteira ameaçava a estabilidade no sul do Líbano algumas semanas antes da renovação do mandato da Finul.
Os incidentes fronteiriços de segunda-feira ocorreram após ataques aéreos na Síria atribuídos a Israel que em 20 de julho mataram cinco combatentes pró-Irão a sul de Damasco, incluindo um membro do Hezbollah.
O último grande confronto entre o Hezbollah e Israel provocou pelo menos 1.200 mortos do lado libanês, sobretudo civis, e 160 do lado israelita, na maioria militares.
Em paralelo, e numa referência à situação interna, o primeiro-ministro libanês fustigou hoje a visita ao Líbano do chefe da diplomacia francesa, ao considerar que “não possuía informações” sobre as reformas promovidas pelas autoridades de Beirute, acusadas por Jean-Yves Le Drian de inércia face ao colapso económico.
Numa deslocação ao Líbano na semana passada, o ministro dos Negócios Estrangeiros francês não poupou críticas aos líderes locais, ao referir-se ao “lado passivo” das autoridades e exigir reformas “há muito tempo aguardadas”.
“O facto de ele ter relacionado toda a ajuda ao Líbano à concretização de reformas e à necessidade de passar pelo Fundo Monetário Internacional demonstra que a posição internacional do momento não consiste em ajudar o Líbano”, considerou hoje Diab em conselho de ministros, segundo relatos divulgados na sua conta Twitter.
O Líbano regista desde há vários meses uma inédita desvalorização da sua moeda, um aumento dos preços, despedimentos em larga escala e restrições bancárias sobre os levantamentos e depósitos no estrangeiro.
Na quinta-feira, o primeiro-ministro libanês tinha dito esperar pela “ajuda da França”, após ter recebido Le Drian em Beirute, para acelerar as negociações iniciadas com o FMI em meados de maio, e que permanecem sem solução.
O Governo libanês adotou no final de abril um plano de salvação economia destinado a relançar o crescimento e sanear as finanças públicas, mas as reformas designadamente no domínio da eletricidade, tardam em concretizar-se.
Segundo as estatísticas oficiais, cerca de metade da população libanesa (6,9 milhões de habitantes) vive na pobreza e 35% da população ativa está no desemprego.
A degradação da situação social originou em outubro de 2019 um levantamento popular inédito contra a impunidade de uma classe política acusada de corrupção e incompetência, e praticamente inalterada desde há décadas.
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