O parlamento debateu e votou hoje em plenário, na generalidade, a transformação dos crimes de violação, coação sexual e abuso sexual de pessoa incapaz de resistência em crime público, através de projetos de lei de vários partidos, o que significa que bastaria haver denúncia por parte de qualquer pessoa mesmo que não a própria vítima e que o processo corre os seus trâmites mesmo contra a vontade dos ofendidos.

Os diplomas apresentados pelo BE e pela deputada não inscrita Cristina Rodrigues foram rejeitados com o voto contra de PS, PSD, PCP e PEV e os votos favoráveis das restantes bancadas.

O projeto de lei do CDS-PP, que pretendia consagrar como públicos os crimes de ameaça e de coação, equiparando-os ao crime de violência doméstica, mereceu o voto contra de PS, PSD, PCP, PEV e Chega.

O PAN, a Iniciativa Liberal e a deputada não inscrita Joacine Katar Moreira apresentaram requerimentos para que os seus projetos que também visavam consagrar como crime público a violação, coação sexual e abuso de pessoa incapaz de resistência. Como foram aprovados, por unanimidade, estes projetos descem sem votação, por 60 dias, à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias para que os deputados tentem encontrar uma redação comum.

Na sessão plenária de hoje, o parlamento aprovou na generalidade o projeto de lei da deputada não inscrita Cristina Rodrigues que propunha incluir a violência económica ou patrimonial no crime de doméstica e projetos de resolução de PAN e PEV também sobre este flagelo, mas rejeitou o projeto de lei do BE que pedia mais medidas de proteção das vítimas no âmbito dos direitos laborais, da segurança social e da habitação.

Durante o debate, o deputado António Filipe, do PCP, anunciou que o partido não acompanharia as iniciativas sobre a violência sexual, lembrando que não se pode ignorar os pareceres, nomeadamente da Ordem dos Advogados, da Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV) ou do Conselho Superior da Magistratura, sobre as razões por que este deve ser um crime de natureza semi-pública.

Segundo o deputado comunista esses pareceres destacam que “o número considerável de vítimas que não deseja denunciar” porque “quer esquecer o que aconteceu”, pelo que os deputados não podem “ficar insensíveis perante isto e pensar que é pela atribuição de natureza pública" que se protege a vítima.

A matéria levantou também muitas dúvidas junto da bancada do PS, que criticou o “paternalismo” em relação às vítimas de violação adultas ao assumir-se o que é melhor para elas sem lhes perguntar.

A deputada socialista Cláudia Santos frisou que todas as iniciativas assentam no pressuposto que para as vítimas é melhor se o crime de violação for público, mas lembrou que se assim for, o processo penal “pode existir contra a vítima”, argumentando que as vítimas “deixam de estar subordinadas à vontade dos agressores e passam a estar à vontade do Estado”.

Argumentos com os quais o deputado único do partido Chega concordou, defendendo que a justiça penal não tem sido consensual em matéria da natureza pública destes crimes e que em Portugal o problema está na moldura penal para este tipo de crimes.

O PSD, pela voz da deputada Mónica Quintela, também defendeu que as vítimas de crimes sexuais não podem ser obrigadas a apresentar queixa ou a colaborar com a justiça se não for essa a sua vontade e que, nestes casos, é o interesse individual que deve prevalecer.

Contrapondo, o Bloco de Esquerda, partido que propôs a discussão, defendeu a necessidade de os crimes de violação, abuso sexual e coação sexual serem crimes públicos, com o líder parlamentar, Pedro Filipe Soares, a advogar que não se trata de uma vontade paternalista, mas antes de defesa da vítima, sublinhando que a maior parte destes crimes é cometida por parte de pessoas próximas da vítima, muitas vezes familiares.

Já CDS-PP e Iniciativa Liberal propuseram que os projetos fossem discutidos na especialidade.

Por seu turno, o PEV alertou para o receio do crescimento dos casos de violência doméstica devido ao confinamento provocado pela pandemia, enquanto o PAN frisou que as suas iniciativas visavam a "plena concretização da Convenção de Istambul".

Durante o debate, as deputadas não inscritas defenderam a necessidade de um “avanço civilizacional” que restaure “a confiança no sistema judicial”.

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