A meteorologia sempre foi algo que intrigou, particularmente o seu capítulo mais mundano, aquele número, normalmente num tamanho de letra mais reduzido, que apenas existe em alguns sites, uma segunda temperatura para um determinado local. Conheço-a por “real feel”, desconheço a denominação em português, mas basicamente trata-se da temperatura que realmente sentimos numa geografia, influenciada por uma série de fatores, da humidade ao vento, por exemplo, e que personalizam aqueles 20 ou 30 graus Celsius genéricos que o meu pai consultava no teletexto antes de ir para o trabalho.

Atenção, eu sei que esta pequena introdução está longe de ser o desabafo da minha vida. É só um apontamento que está guardado ao lado da coleção de pacotes de açúcar que fazia com a minha mãe, mas permite-me fazer a ponte para aquilo de que quero realmente falar, os números da pandemia na Europa do dia de hoje.

Quando nos fechámos em casa e nos disseram que só existiria uma vacina em 2021, portanto, que a normalidade estava a um ano de distância, não era possível imaginar o “real feel” da pandemia. Hoje, mais de meio ano depois de ter sido detetado o primeiro caso positivo em Portugal de Covid-19, os números de novos casos começam a voltar a pesar sobre os ombros, com a diferença de que não nos trancam a porta de casa.

Vamos concretizar. Por exemplo, Portugal registou hoje o 14º dia com mais casos confirmados diários desde o início da pandemia no país. Foram 687 os novos casos e a terminologia das conferências de imprensa da Direção-Geral da Saúde parece que recuou alguns meses e a expressão “achatar a curva” voltou a ser empregue.

Também hoje o Reino Unido verificou o maior aumento diário de novos casos desde maio, mais de 3.500. Curiosamente, no dia seguinte a terem retirado Portugal continental do seu corredor aéreo.

Ainda esta sexta-feira, Espanha contabilizou 12.183 novos casos de covid-19, o número diário mais elevado desde o início da pandemia. França voltou a registar, pelo segundo dia consecutivo, mais de nove mil novos casos de contágio nas últimas 24 horas.

Quando começou o processo de desconfinamento, existiu quase que uma libertação do que foram os primeiros meses de pandemia. Agora, depois de uma pequena planagem sobre a normalidade durante os meses de verão, voltamos a ver os números a disparar e os governos a fugirem a um novo confinamento generalizado e de todas as consequências económicas e humanas que daí adviriam.

Uma coisa era saber que estes tempos estranhos iriam durar um ano, outra coisa é sair de casa e voltar a ver os números a descambar outra vez, agora de máscara na cara, com papel higiénico nas prateleiras dos supermercados, depois de um estranho “real feel” de que talvez o pior já tivesse passado.