Ouvido na comissão parlamentar de inquérito ao furto do material militar de Tancos, Azeredo Lopes disse que leu pela primeira vez o documento da Polícia Judiciária Militar (PJM) “em momento simultâneo” com a sua demissão, em 12 de outubro passado.

Contudo, o ex-governante ressalvou que foi “informado do essencial” do documento no dia 20 de outubro do ano anterior pelo seu ex-chefe de gabinete, general Martins Pereira, dois dias depois da recuperação do material furtado pela PJM, e que registou que havia um “informador” que impunha determinadas condições para revelar o local onde estava o material furtado.

“O que me foi transmitido, ou nesse dia ou no dia a seguir, era que havia um informador que não podia ser identificado e que, essencialmente, o que se tinha pedido era que estivesse alguém na margem sul para receber um telefonema com indicação do local onde se encontravam as armas”, relatou.

Questionado sobre se o ex-chefe de gabinete lhe enviou o memorando que recebeu da PJM em 20 de outubro de 2017, Azeredo Lopes respondeu que não tem “nenhuma memória de alguma vez ter visto fisicamente este documento”.

“Li-o em momento posterior ou em momento simultâneo à minha demissão. Fiquei confortado, porque considero que o meu chefe de gabinete, no contexto em que recebe a informação, me transmite o essencial do que era importante que eu conhecesse”, acrescentou.

Mais à frente na audição, o ex-ministro disse que “não teve dúvidas” sobre a informação que lhe foi transmitida, nem estranhou a referência a um informador.

“Se não, de cada vez que falamos de um informador estamos a falar de encobrimento?”, questionou, acrescentando: “suponho que a regra quando existe um informador é que ele não seja divulgado”.

José Azeredo Lopes disse que não tinha conhecimento de qualquer “investigação paralela” da Polícia Judiciária Militar e sem comunicação ao Ministério Público.

“Eu não sabia que tinha sido omitida a participação à Polícia Judiciária. […] era difícil eu ter consciência dessa ausência de colaboração porque o comunicado [da PJM, no dia da recuperação do material, em 18 de outubro de 2017] invoca informação dada ao DCIAP [Departamento Central de Investigação e Ação Penal]”, afirmou.

Azeredo Lopes disse que, quando foi informado, através do general Martins Pereira, que o material tinha sido recuperado, “ficou muito satisfeito”.

O então diretor da PJM, coronel Luís Vieira, “vai ao Ministério [da Defesa] e diz sucintamente que o material tinha sido recuperado na Chamusca e eu fico muito satisfeito”, relatou.

Depois, a questão passou a ser saber “quem ia dizer o quê”, referiu, acrescentando que recusou “categoricamente” que fosse o Ministério da Defesa a divulgar a recuperação do material furtado.

Azeredo Lopes disse que, na altura, referiu que se o comunicado fosse feito pela PJM, não via “inconveniente” em que alguém do seu gabinete “visse isso” com o objetivo de assegurar uma correta comunicação.

“O comunicado não foi obviamente condicionado, nem influenciado pelo Ministério da Defesa Nacional”, disse o ex-ministro.

Na audição, Azeredo Lopes confirmou que estava ao corrente do descontentamento do ex-diretor da Polícia Judiciária Militar face à decisão da Procuradora-Geral da República de retirar àquele órgão a liderança da investigação ao furto de Tancos para o entregar à Polícia Judiciária civil.

Questionado pelo deputado do PCP Jorge Machado sobre uma visita aos paióis de Tancos, em 04 de julho, com o Presidente da República, o antigo ministro da Defesa confirmou que se recorda “do facto de o ex-diretor da PJM dar conta do seu incómodo” quanto à decisão da ex-Procuradora Joana Marques Vidal.

Nessa ocasião, disse, o Presidente da República nunca pediu, nem suscitou a questão de o ministro da Defesa “falar com a ministra da Justiça sobre esse assunto”.

“Não me lembro de o Presidente da República ter dito isso, posso garantir que o Presidente da República nunca suscitou essa questão”, disse Azeredo Lopes.

No dia 10 de abril, o coronel Luís Vieira tinha dito na comissão de inquérito que no dia 04 de julho em Tancos o Presidente da República lhe respondeu que “ia falar com a Procuradora-Geral da República e deu um conselho ao ministro da Defesa para falar com a sua colega ministra da Justiça”.

O furto de material de guerra foi divulgado pelo Exército em 29 de junho de 2017. Quatro meses depois, a PJM revelou o aparecimento do material furtado, na região da Chamusca, a 20 quilómetros de Tancos, em colaboração de elementos do núcleo de investigação criminal da GNR de Loulé.

Entre o material furtado estavam granadas, incluindo antitanque, explosivos de plástico e uma grande quantidade de munições.

(Notícia atualizada às 17:19)