Jovan comprou sapatos de marca e passou férias na Grécia - a sua recompensa por ter contribuído com a onda de notícias falsas saídas da cidade macedónia de Veles durante as campanhas eleitorais americanas de 2016.
"Ganhava uns 200 euros por mês" por contribuir com os sites de "fake news", conta à AFP este estudante de 20 anos, que pediu para que a sua identidade não fosse revelada, num país em que o salário médio é de 350 euros.
Veles, uma cidade com cerca de 50 mil habitantes na região central da Macedónia, foi um importante centro industrial da antiga Jugoslávia, antes de entrar em decadência e começar uma improvável recuperação.
Em 2016, saíram de seus servidores centenas de sites da internet e páginas do Facebook destinadas a enaltecer Donald Trump e criticar seus adversários democratas, Hillary Clinton e Bernie Sanders, ou a atacar o legado do presidente Barack Obama.
Numa série de páginas - a maioria já desativada -, era possível ler artigos sobre supostas declarações racistas de Hillary Clinton sobre Beyoncé ou declarações falsificadas, segundo as quais ela teria adulado a honestidade de Donald Trump.
Jovan, aluno da faculdade de tecnologia da cidade, foi recrutado por um entre as dezenas de investigadores locais implicados na corrida por cliques remunerados. Até então, concentravam-se em páginas web de famosos, carros ou dicas de beleza.
"Depois demos conta de que a política também podia gerar dinheiro", conta Borce Pejcev, web designer de 34 anos, que participou da criação de vários sites.
Jovan conta que o seu trabalho consistia em recuperar artigos publicados em sites conservadores, como Fox News ou Breitbart, assim como em veículos tradicionais e "adaptá-los, alterando-os um pouco, colocando-lhes um título sensacionalista".
"Um mundo onde quem manda é o clique"
Como muitos macedónios de sua geração, Jovan não tem perspectivas num país em que 55% dos jovens estão desempregados. Segundo o Banco Mundial, entre 2001 e 2016, 500 mil pessoas deixaram o país, com 2,1 milhões de habitantes na atualidade.
Os pais de Jovan perderam o emprego em 2003, quando sua fábrica fechou, e nunca voltaram a encontrar outro.
"Nem de direita, nem de esquerda", Jovan "não sabe" se contribuiu para a vitória de Donald Trump, mas na verdade "tanto faz". Só sabe que pela primeira vez na vida ganhou dinheiro para comprar o que queria. "Escrevíamos o que as pessoas liam", afirma.
Como o restante dos entrevistados pela AFP, ele acha ridícula a ideia de que por trás destes locais haveria uma influência russa. O atrativo dos lucros era suficiente.
"Muito rapidamente se viu que os conservadores eram mais propícios para fazer dinheiro; gostam das teorias da conspiração, estas nas quais sempre se clica antes de compartilhar", explica o web designer Borce Pejcev.
"Ajudei Trump a vencer", diz, com orgulho, o cartão de visita de Mirko Ceselkovski, um consultor do setor digital. Ele viu passar muitos destes criadores de sites: "só os ensinei a ganhar dinheiro na Internet e como encontrar um público".
"Quanto mais se clica, mais dinheiro há do Google Ads", explica. "É um mundo onde quem manda é o clique".
"As vacinas matam"
Até mesmo os adultos aproveitaram este nicho, como a professora de inglês Violeta, que não quis dar o seu nome verdadeiro. Durante o período eleitoral, quase chegou a dobrar o seu salário de 350 euros mensais trabalhando três horas diárias. Agora, continua a receber 150 euros com esta segunda atividade.
"Sei que é mau aceitar um segundo trabalho que consiste em dizer, 'Olhem, as vacinas matam!', 'O Holocausto não existiu!' ou promover Trump. Mas quando a gente tem fome, não se pode se dar ao luxo de pensar no progresso da democracia", diz esta mãe de dois filhos, que vivem exclusivamente do seu salário.
Ela lembra que em 2016, alguns de seus alunos "chegavam tarde e literalmente dormiam na aula" por também se dedicarem a alimentar estes sites.
A galinha dos ovos de ouro agora é menos rentável. Segundo Jovan, o Facebook agora bloqueia páginas políticas com origem em Veles. Abandonou a atividade, mas o seu amigo, Teodor, continua a trabalhar para uma empresa que administra centenas de sites de moda, saúde, beleza e automóveis.
Diz receber entre 100 e 150 euros, quase tanto quanto a sua mãe, operária num emprego em part-time numa empresa têxtil. "Culpe-me se quiser, mas entre isso e mexer em histórias na Internet, fico com a segunda opção".
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