A decisão do tribunal civil de Lorient (Bretanha, oeste de França), da qual a Santa Sé disse só ter tido conhecimento "através da imprensa", "poderia ter dado origem a uma grave violação dos direitos fundamentais à liberdade de religião e à liberdade de associação dos fiéis católicos", lê-se num comunicado de imprensa divulgado pelo Vaticano.
Em 03 de abril, o tribunal de Lorient condenou a comunidade religiosa a pagar à freira em causa 182.400 euros por danos materiais e 10.000 euros por danos morais, solidariamente com o cardeal canadiano e os "visitantes apostólicos" do Vaticano Jean-Charles Nault e Maylis Desjobert, que tinham ido investigar o caso.
A Santa Sé explica a gravidade das suas acusações pelo facto de o tribunal francês se ter pronunciado "sobre o tema da disciplina interna e da pertença a uma ordem religiosa", argumentando também que "o Cardeal Marc Ouellet nunca recebeu uma convocatória do tribunal de Lorient".
O comunicado do Vaticano confirma também que uma nota verbal relativa a este caso foi enviada pela Secretaria de Estado - o órgão central do Governo do Vaticano - à Embaixada de França junto da Santa Sé.
Contudo, o Vaticano reconhece que o cardeal "efetuou efetivamente uma visita apostólica à Comunidade das Irmãs Dominicanas do Espírito Santo, em virtude de um mandato pontifício" e que "na sequência desta visita, foram tomadas medidas canónicas contra a freira Sabine de la Valette (antiga irmã Marie Ferréol), incluindo a sua demissão".
A Irmã Marie Ferréol, 57 anos, foi expulsa da sua comunidade em Berné, perto de Lorient, em outubro de 2020. O despedimento foi imposto a meio da noite, sem qualquer motivo, após 34 anos de vida na sua comunidade. Desde então, vive apenas com o rendimento mínimo.
Durante o julgamento, a presidente do corpo de juízes, Armelle Picard, manifestou a sua surpresa por não ter tido acesso ao processo de acusação do Vaticano, tendo Bertrand Ollivier, advogado dos dois "visitadores apostólicos", replicado que "não há direito de acesso ao processo em matéria canónica".
A religiosa vivia tranquilamente nesta comunidade, próxima dos movimentos católicos tradicionalistas, desde 1987. Porém, segundo o seu advogado, a partir de 2011, as coisas começaram a piorar, quando a irmã Marie Ferréol denunciou "abusos e incidentes graves".
De acordo com o tribunal, a associação não apresentou qualquer prova de que a destituição tivesse sido efetuada em conformidade com os seus estatutos.
O Cardeal Marc Ouellet, que era prefeito do Dicastério Episcopal do Vaticano (órgão administrativo que assiste o papa) na altura dos acontecimentos, demitiu-se deste alto cargo em janeiro, oficialmente "devido ao limite de idade", quando foi acusado de abuso sexual no Quebeque.
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