Os números foram apresentados hoje numa conferência internacional, em Lisboa, sobre “Trauma e Violência Sexual”, organizada pela AMCV, onde a presidente da associação revelou que nos últimos três anos, mais concretamente entre janeiro de 2017 e 31 de agosto de 2019, o Centro de Crise ajudou 136 mulheres e raparigas vítimas de violência sexual.
De acordo com Margarida Martins, houve 51 sobreviventes ajudadas em 2017, número que aumentou para 56 em 2018, registando-se até ao final do mês de agosto de 2019 29 mulheres apoiadas.
Dentro deste universo, foram feitos 2.076 atendimentos, entre 1.102 acompanhamentos técnicos individuais, 168 atendimentos na área jurídica, 749 atendimentos de apoio psicológico e 57 utentes que foram seguidas em grupos de ajuda mútua.
Em declarações à agência Lusa, a presidente da AMCV apontou que o fenómeno da violência sexual em Portugal está ao nível de uma “pandemia”, em que “porta sim, porta não, todas as famílias têm este problema”.
O fenómeno “agora é mais acentuado e preocupante com as novas tecnologias, com crianças a serem abusadas sexualmente à distância, a exporem-se na Internet”, denunciou a responsável, que defendeu que as operadoras de telecomunicações em Portugal também têm de ser responsabilizadas.
“Têm o poder de não passar as imagens, a pornografia, uma série de coisas e não utilizam esse poder”, apontou.
Especificamente no que diz respeito às crianças e jovens, Margarida Martins afirmou que “estão abandonados em Portugal”.
“Enquanto ativistas de direitos humanos estamos há décadas à espera que Portugal avance com uma coisa que diz que tem nas Nações Unidas, que é uma Estratégia Nacional na área dos direitos humanos das crianças”, denunciou.
A responsável lembrou que o mais recente relatório das Nações Unidas de avaliação à forma como Portugal tem aplicado a convenção dos direitos das crianças questiona a inexistência de uma estratégia e refere que se continua sem saber qual é o plano de ação nacional.
“Enquanto não houver um compromisso na área das crianças também não conseguimos fazer bem a prevenção porque não há investimento, não há responsabilidade, não há como saber progresso, não há indicadores, não há nada. Estamos num vazio na área dos direitos humanos das crianças em Portugal”, criticou.
Relativamente ao trabalho feito no Centro de Crise, Margarida Martins referiu que um dos principais problemas e desafios está na forma como são referenciadas as pessoas que chegam ao centro a pedir ajuda, já que em apenas dois dos 136 casos as vítimas chegaram através de um órgão de polícia criminal (OPC), fosse PSP, GNR ou Polícia Judiciária.
“Há que criar uma articulação, tipo um fluxograma, entre as entidades que em Lisboa intervêm nestas áreas para sabermos quem faz o quê e como proceder, de forma a que tudo seja disponibilizado a quem é vítima destas situações”, defendeu.
Outros dados dos três anos de atividade do Centro de Crise mostram que a idade das utentes variou entre os 16 e os 73 anos, sendo que é entre os 25 e os 44 anos que está a maioria dos casos, com 43% das situações, 58 mulheres.
Entre as nacionalidades, a maior parte das vítimas era portuguesa (109), mas houve também casos entre mulheres brasileiras, angolanas, espanholas ou de Cabo Verde.
Relativamente à relação entre vítima e agressor, foi possível constatar que em 51% dos casos havia ou tinha havido uma relação de intimidade, em 34% das situações a violência sexual aconteceu em contexto familiar, social ou de trabalho e em 8% as mulheres foram violadas por desconhecidos.
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