“Neste momento, o que se pode dizer é que, em primeiro lugar, as sondagens falharam”, declarou o analista político em declarações à Lusa.
Os vários especialistas têm estado a discutir questões técnicas, mas, para Pedro Magalhães, “essa discussão até nem é importante: O que é importante é que a matéria-prima com que [as sondagens] trabalharam tinha, com algumas variações, desvios enormíssimos”, afirmou.
“Houve qualquer coisa que falhou na captação do eleitorado que elegeu Donald Trump”, indicou o professor do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, Doutorado em Ciência Política pela Ohio State University dos Estados Unidos.
Uma das explicações, admitiu Pedro Magalhães, pode relacionar-se com o processo de “diabolização” de Donald Trump por uma grande parte dos meios de comunicação social norte-americanos.
“Quando a maior parte dos media apresentam numa luz negativa determinado partido ou candidato gera-se uma coisa de que se fala há algum tempo na bibliografia, que é a chamada ‘espiral do silêncio’”, explicou o investigador.
Ou seja, “quando há uma opção que parece ser dominante na opinião publicada e quando a nossa opinião é diferente, muitas vezes ocultamos a nossa posição. E ocultamos, em geral, na interação com as outras pessoas, mas também na interação com os entrevistadores que nos vêm bater à porta”, diz Pedro Magalhães.
Outra ideia com que “vale a pena trabalhar”, na opinião do investigador, é a do sucesso do ataque do Partido Republicano e dos meios de comunicação social mais afetos aos republicanos aos media liberais. Há anos que os republicanos agitam a ideia de que “há uma conspiração, ou, pelo menos, um conjunto de órgãos de comunicação social dominantes, que, de alguma maneira, são favoráveis ao Partido Democrata”, lembra Magalhães.
“Isto não é o tipo de coisa que torna o eleitorado que agora votou em Trump atreito a participar nas sondagens. De alguma maneira, é como se as sondagens e os meios de comunicação social e Washington e as elites politicas - o ‘establishment’ -, fossem todos parte da mesma coisa que alguns eleitores recusam e contra a qual protestam”, explica Pedro Magalhães.
A diabolização de Trump por boa parte dos meios de comunicação social norte-americanos parece, assim, ter beneficiado duplamente o futuro presidente norte-americano.
Não só lhe ofereceu uma notoriedade grátis, que Trump não pagou, como escondeu também as suas melhores cartas no precioso jogo das sondagens, deixando o seu eleitorado potencial numa penumbra que tornou impossível à sua opositora antecipar o desfecho de ontem e organizar, em devido tempo, uma estratégia coerente com o mesmo.
“Aliás – acrescentou Pedro Magalhães -, isso começou logo nas primárias. Trump foi um dos candidatos que gastou menos dinheiro com anúncios na televisão e com propaganda política, porque, no fundo, naquilo que precisava, os meios de comunicação social faziam o trabalho, punham-no em destaque e davam-lhe voz”.
As contas da campanha provam isto mesmo, sublinhou o analista. Hillary Clinton recebeu e gastou o dobro de Trump. “Foi a sua notoriedade como pessoa pública e estrela de televisão, que em certo sentido era, mas também o seu estilo e o destaque que os 'media' lhe deram que fizeram grande parte da campanha por ele”, acrescenta.
Quando ao segundo benefício que Trump retirou da sua diabolização, ele deve ser visto no próprio falhanço das sondagens. “As campanhas também conduzem estes estudos para perceberem o que se está a passar, especialmente nos EUA, onde jogam com grandes recursos financeiros. Mas, se o problema é generalizado e se esta maneira de medir o pulso da opinião pública tem estes problemas, isto também condiciona a estratégia”, admite Pedro Magalhães.
E o facto - ou a prova de que o Partido Democrata estava mal enquadrado - é que “Hillary Clinton fez muito pouco esforço de campanha – não quer dizer que isso tivesse mudado o resultado – em alguns dos estados que surpreendentemente perdeu ou deverá perder, como vários estados do Midwest, em torno dos Grandes Lagos, Pennsylvania e por aí fora”, reconhece Pedro Magalhães.
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