Deve ser difícil, Robert, ou pelo menos frustrante, olhares para o teu percurso na Liga dos Campeões.

Não é que não tenhas tido razões para celebrar na competição, pois tiveste. Contam-se, pelo menos, 66 delas, o número de vezes que colocaste a bola no fundo da baliza contrária nos últimos nove anos.

Se olharmos para as estatísticas desde que este troféu, destinado a celebrar a nata da nata do futebol europeu, foi criado, apenas três jogadores marcaram mais golos do que tu em toda a história da “Champions”. Dois deles damos de barato, já que Cristiano Ronaldo e Lionel Messi estão noutro patamar (apesar de tanto o teu colega Thomas Muller como um dos teus antecessores, Lothar Matthäus, rejeitarem essa tese), mas ainda vais a tempo de ultrapassar Raúl González (o espanhol terminou a carreira com 71 golos).

Estes três, porém, já tiveram outras razões para festejar, motivos que a ti o destino tem caprichosamente negado: todos eles já venceram a Liga dos Campeões, e tu não.

O teu percurso é daqueles casos em que a soma das partes não chega para fazer um todo. Tu, um goleador como poucos, possivelmente o melhor avançado puro da tua geração, habituado a disparar de todas as formas e feitios. O Bayern, um clube histórico, que sabe o que é ganhar a Liga dos Campeões e que, tendo começado a dominar a Bundesliga ainda antes de te teres mudado para a Baviera, tem traçado como grande objetivo voltar a trazer a taça para Munique, sendo, aliás, razão para pôr e dispor de treinadores que ganham tudo a nível interno.

Juntos já deviam ter ganho o troféu, mas tal nunca aconteceu. Aliás, se bem te recordas, já tiveste perto de o fazer, mas pelo Borussia Dortmund. Na altura, quando moravas bastante mais a norte na Alemanha e eras comandado por Jurgen Klopp, tiveste uma oportunidade de ouro. Mas na final em Wembley, corria a época de 2011/12, ficaste em branco — apesar de seres o segundo melhor marcador da edição, algo a que te vieste a habituar — e o caneco foi para… o Bayern.

Desde então, tem sido um desfilar de tentativas frustradas. És um soldado com reconhecimento, mas sem glória europeia, um artilheiro veterano — ou, dados os teus talentos, um franco atirador — ao qual faltam medalhas na farda. Apesar da tua predileção por martirizar guarda-redes contrários e de seres acompanhado por elencos de luxo, tens esbarrado sucessivamente em adversários mais fortes — em todas as ocasiões, só numa é que o Bayern foi eliminado por uma equipa que não a vencedora dessa edição. Para além disso, se nos primeiros anos a vestir de encarnado, ainda deste luta nas eliminatórias em que o teu clube caiu ao marcar golos, nas últimas retraíste-te. Tivesses ido para o Real Madrid, a história seria outra.

Mas o passado é o passado, e certamente que estarás mais focado no tempo presente. Neste momento, deve ser bom estar na tua pele. O mundo ressente-se da pandemia, sim, mas nunca estiveste tão bem.

Com 55 golos em todas as competições, és o maior goleador da Europa — se bem que deixaste a Bota de Ouro escapar para o Ciro Immobile — e 13 deles foram marcados na Liga dos Campeões. Estás apenas a quatro tentos de atingir o recorde de Cristiano Ronaldo e, este ano, o único jogador que se aproximou de ti na Champions já foi eliminado, é um tal de Haaland que até está a seguir os teus passos.

De onde vêm e o que andaram para aqui chegar:

Clube: Fußball-Club Bayern München e. V.

Cidade / País: Munique, Alemanha

Palmarés na Liga dos Campeões: Venceu a competição por cinco ocasiões.

  • Três delas foram consecutivas, nas épocas 1973/74, 1974/75 e 1975/76 — um recorde apenas igualado pelo Ajax e ultrapassado pelo Real Madrid (que venceu as cinco primeiras edições de seguida).
  • Desde então, os bávaros venceram mais duas vezes: em 2001/02, contra o Valência (desempate nos pénaltis, após empate 1-1), e em 2012/13, contra os seus rivais do Borussia Dortmund (por 2-1).
  • O Bayern atingiu ainda cinco finais em que foi de derrotado (uma delas contra o FC Porto, em 1986/87)

Percurso: 

Fase de grupos: 1º lugar, Grupo B

  • Bayern de Munique vs. Estrela Vermelha: 3-0, 6-0
  • Bayern de Munique vs. Tottenham: 7-2, 3-1
  • Bayern de Munique vs. Olympiacos: 3-2, 2-0

Oitavos de final:

  • Bayern de Munique vs. Chelsea: 3-0, 4-1

A santíssima trindade que te compõe — pé esquerdo, pé direito e cabeça — ajudou a aterrorizar o Estrela Vermelha (clube que castigaste com quatro golos em 15 minutos, um recorde) e a despachar tanto o Dínamo de Zagreb com dois clubes de Londres, o Tottenham e o Chelsea. Se dúvidas restassem quanto à tua prestação este ano na Liga dos Campeões, o único jogo em que não marcaste foi aquele em que não participaste, em casa contra os Spurs.

quem acredite mesmo que, azar dos azares, acabaram com a Bola de Ouro exatamente no ano em tu estavas mais apto a ganhá-la, já que os seus dois crónicos vencedores não tiveram um ano melhor que o teu.

Magicações à parte, sei que tem tens de focar no próximo desafio, e do Bayern, o mais difícil que já tiveram este ano. Alguns clubes tiveram sorte no sorteio, pelo menos em teoria. A ti e aos teus colegas, calhou o Barcelona.

É certo que Quique Setién e os rapazes da camisola blaugrana não tiveram a melhor das épocas, especialmente comparando com a da tua equipa, mas se há coisa que se sabe em relação ao Barça é que nunca, em circunstância alguma, deve ser menosprezado.

Na preparação para o embate no Estádio da Luz, é muito provável que te tenha passado em flashback a eliminatória de 2015/16. A maldade de Messi a Boateng, os raides de Neymar, o teu golo fabuloso que não chegou para salvar o Bayern na segunda mão. Diz-se que foi a vingança catalã contra o que o Bayern fez em 2012/13 (venceu o Barcelona por 4-0 e 3-0) para chegar à final. Mas tu não estavas lá para gozar dessa vitória.

Desta vez, porém, talvez seja diferente. Se dependesse apenas de ti e do teu apetite, podiam já guardar lugar na Allianz Arena para colocar lá a taça. Mas uma equipa não se faz de 11 Lewandowskis (imagina só). Ao teu lado poderás contar com a velocidade de Gnabry e Coman, a magia de Thiago Alcantara e Philippe Coutinho (que talvez queira dar uma lição à equipa que ainda tem o seu contrato, não sei, pergunta-lhe), o talento infindável de Kimmich e Davies, e a experiência acumulada de Perisic, Muller, Boateng e Neuer. Se o Bayern continuar em modo "rolo compressor" como tem feito e como fez há sete anos, é muito possível que consigas chegar às meias-finais. A partir daí, é continuar a sonhar, e a marcar.

Talvez todo este exercício seja exagerado. Talvez não tenhas ambições assim tão altas. Para um miúdo que começou a jogar nas modestas equipas de Varsóvia, é perfeitamente justificável que já estejas feliz com tudo o que atingiste até agora. Mas ninguém acredita nisso. Quem marca golos como tu marcas, quer sempre mais.

Em última análise, se não chegares a receber a medalha que te tem escapado todos estes anos, fica sabendo que irás parar ao pelotão de jogadores como Ronaldo, Romário, Roberto Baggio, Gianluigi Buffon, Diego Maradona e Zlatan Ibrahimovic, lendas que nunca ganharam uma Liga dos Campeões. Ao menos ficarás em boa companhia.