São três quadros do artista italiano Simone Fugazzotto, três desenhos de macacos que ficarão em exposição em Milão, na sede da Serie A, o organismo que tutela o futebol profissional em Itália. Segundo a liga, o objetivo é que os trabalhos “propaguem valores de integração, multiculturalismo e irmandade”.

No entanto, num país que vive um aceso debate devido à escalada dos casos de racismo no desporto, condenado nacional e internacionalmente ainda no início deste mês quando o desportivo Corriere dello Sport usou uma imagem de dois futebolistas negros, Romelu Lukaku e Chris Smalling, para promover o jogo entre AS Roma e Inter de Milão, com o título “Black Friday” [sexta-feira negra], esta campanha não foi bem recebida.

A associação Fare, que promove o futebol, a integração social e políticas anti discriminatórias, utilizou a rede social Twitter para condenar mais uma ação do futebol italiano que “deixa o mundo sem palavras”. “Num país em que as autoridades falham em conseguir lidar com casos de racismo semana após semana, a Serie A lançou uma campanha que parece uma piada doentia”.

Fugazzotto explicou que o seu trabalho pretende mostrar que todos os seres humanos são “criaturas fascinantes e complexas que podem ser felizes ou tristes, católicos, muçulmanos, budistas, mas, no final, são as ações que determinam quem nós somos, não a cor da pele”.

“Pintei macacos como uma metáfora para os seres humanos. Viramos o conceito contra os racistas, somos todos macacos originalmente. Portanto, pintei um macaco ocidental, um macaco asiático e um macaco negro”, explicou.

O artista confessou ainda ter-se inspirado no caso do central do Nápoles, Kalidou Koulibaly, que na temporada passada foi um dos principais rostos dos casos de racismo no futebol italiano.

“Fique tão zangado que… tive uma ideia: porque não parar de censurar a palavra macaco no futebol, dar a volta ao conceito e dizer que, no final de contas, não somos todos macacos?”.

Numa publicação posterior, a associação Fare acrescentou que os desenhos são “um ultraje, contraproducentes e contribuem para o processo de desumanização das pessoas da herança africana”. “É difícil perceber no que a Serie A estava a pensar, quem é que eles consultaram? Está na hora dos clubes progressistas da liga se fazerem ouvir”, escreveram.

Na apresentação do novo projeto, Luigi de Siervo, presidente da liga italiana, defendeu o trabalho de Fugazzotto, afirmando que o “futebol é uma ferramenta extraordinária para transmitir mensagens positivas, do fair play à tolerância” e sublinhando que os desenhos que compõe a campanha “refletem esse valores” e que por isso ficarão em exposição.

Com um problema grave de racismo em mãos, a Serie A decidiu criar uma equipa antirracismo composta por um jogador de cada uma das 20 equipas da primeira divisão e trabalhar num software de reconhecimento facial para identificar adeptos responsáveis por cânticos racistas. Siervo assume mesmo a comparação com o plano de Margaret Thatcher, antiga primeira-ministra britânica que, nos anos 1980, combateu o hooliganismo.

“Vamos fazer em dois anos o que Thatcher fez em 10”, disse o dirigente, aludindo a uma série de ações, de sensibilização e punitivas, que ainda assim não impediram a suspensão dos clubes ingleses das competições europeias até 1990, depois da tragédia do estádio Heysel, em que 39 adeptos da Juventus morreram esmagados após fãs do Liverpool terem forçado a entrada.

Durante a atual temporada, jogadores como o belga Romelu Lukaku, o costa-marfinense Franck Kessié, o ex-Vitória de Guimarães Dalbert, o bósnio Miralem Pjanic ou o italiano Mario Balotelli foram alvo de ataques racistas, sobretudo os jogadores de raça negra, num Campeonato em que vários ‘ultras’ entoam cânticos antissemitas, como os da Lazio.