Zion, Zion, Zion. 2019/20 será a época de Zion Williamson. O fenómeno liceal e universitário que foi selecionado pelos New Orleans Pelicans com a primeira escolha do draft vai, finalmente, estrear-se na NBA e maravilhar o mundo do basquetebol com os seus afundanços poderosos. E quem sabe se não participa no Concurso de Afundanços do fim-de-semana All-Star? O que sabemos é que, onde quer que vá buscar inspiração para os afundanços, Zion só poderá ver a melhor prestação individual de sempre num Concurso de Afundanços no YouTube. Foi a 12 de Fevereiro de 2000... cinco meses antes de Zion nascer. O autor dessa prestação dá pelo nome de Vincent Lamar Carter Jr. ou, depois desse dia, somente «Vinsanity».

Pouco tempo depois, com o bebé Zion a caminho do terceiro mês de vida, Vince Carter fazia isto a um tal de Frederic Weis, um francês de 2,18 metros, durante os Jogos Olímpicos de Sidney.

Sim, o Concurso de Afundanços de 2000 foi o momento «I made it to the NBA» para Vince Carter - e, sim, o «Dunk of Death» em Sidney foi o momento «I made it to the news, mummy» para Frederic Weis -, mas, agora que se prepara para cumprir a 22.ª e derradeira temporada da carreira, Carter pode ficar mais descansado. Ele, que chegou à liga como «o primo de Tracy McGrady» e sempre detestou ter o rótulo de jogador que só afunda, será lembrado por muito mais do que o ano 2000. E provavelmente vai acumular mais alguns recordes pessoais.

Se estiver dentro das quatro linhas em 19 ocasiões, esta época, será o quinto jogador da história a atingir a marca de 1.500 jogos na NBA, depois de Robert Parish (1.611), Kareem Abdul-Jabbar (1.560), Dirk Nowitzki (1.522) e John Stockton (1.504). Ou seja, até é bem provável que acabe a carreira no top-3 dos jogadores com mais partidas efetuadas na liga norte-americana, uma vez que apenas precisa de 24 encontros para superar Stockton e 42 para deixar para trás o registo de Nowitzki.

Se jogar depois de 26 de janeiro de 2020, juntar-se-á ao lote de atletas que jogaram na NBA com 43 anos de idade, onde figuram somente três nomes: Robert Parish, Kevin Willis, Nat Hickey. E pode entrar no top-5 dos jogadores com mais triplos concretizados na história. Com um total de 2.229 lançamentos de três pontos marcados ao longo das 21 temporadas que estão nos livros, faltam-lhe 54 triplos convertidos - número que só não atingiu no ano de rookie e em 2002/03 - para ultrapassar Jason Terry (2.282) no quinto lugar dessa lista.

Steph Curry, terceiro jogador da mesma lista (2.483), é alguém que conhece bem Vince Carter. "Cresci a jogar um-contra-um com o Vince em Toronto, quando o meu pai [Dell Curry] jogava nos Raptors, e o Vince ensinou-me muitas coisas. Tinha sempre tempo para mim. Nunca me deixou ganhar esses um-contra-um, mas o que me lembro mais é de me explicar que o segredo do sucesso na NBA é a dedicação, o trabalho, a intensidade. Ensinou-me a ser profissional e a arranjar sempre tempo para os fãs", explicou o base dos Golden State Warriors ao Bleacher Report, em 2016.

Esses podem ter sido alguns dos segredos da longevidade de Carter na liga, mas há mais. Sempre foi um líder de balneário. Ganhou o prémio Teammate of the Year em 2015/16, após os dois anos com menor utilização na carreira (média inferior a 17 minutos por jogo), nos Memphis Grizzlies. "Respeito tanto o jogo que, se sentisse que não poderia contribuir, preferia retirar-me. Mas eu sei que posso contribuir, seja a ensinar um rookie como se deve adaptar à vida na NBA ou a dar indicações dentro de campo. Como atleta, posso dizer a outro jogador coisas que os treinadores não sabem, porque eu sei o que os jogadores sentem. É difícil não jogar, mas ainda não estou preparado para abandonar. Na minha mente ainda sinto que consigo saltar e colocar a cabeça ao nível do aro.", disse na altura.

E, como sempre fez quando enfrentou dificuldades na vida, virou-se para a música. Em miúdo aprendeu saxofone e bateria e isso permitiu-lhe desenvolver aptidões auditivas fora do comum. Agora tem um estúdio de música em casa e é lá que passa muito do seu tempo livre, a fazer música. "Quando as dificuldades surgem na vida escolho sempre 'perder-me' na música. Tem sido o meu escape", revelou mais tarde, já depois de uma terceira época com maior utilização em Memphis.

Quando já se falava de uma eventual retirada e da possível continuidade na liga apenas para procurar um título, Carter surpreendeu e escolheu uma proposta dos Sacramento Kings. "Isso não sou eu. Quero jogar. É fácil estar no banco de uma equipa boa. Sim, seria excelente poder competir por um anel e eu sei que o mereço, mas eu quero contribuir. Não aceito estar sentado quando sinto que ainda tenho algo a dar ao jogo", explicou ao The Undefeated em outubro de 2017.

Ainda antes do anúncio de que regressaria aos Atlanta Hawks para a última época da carreira, repetiu o discurso. "Acredito que ainda consigo jogar a este nível. Aceito este papel de mentor dos mais novos, sem qualquer problema. Gosto de liderar pelo exemplo. Prefiro mostrar a falar", afirmou há poucos dias. Acumulou cerca de 185 milhões de dólares ao longo da carreira, mas continua a afirmar que, por mais difícil que possa parecer recusar propostas de equipas candidatas ao título, prefere manter-se fiel ao jogo. E enquanto se sentir capaz, quer jogar.

Ele, que chegou à liga como "o primo de Tracy McGrady" e sempre detestou ter o rótulo de jogador que só afunda, merece ser lembrado por muito mais do que o ano 2000. Merece ser lembrado por muito mais do que afundanços, muito mais do que «highlights», muito mais até do que o bom lançador em que se tornou nos anos mais recentes. Merece ser lembrado por muito mais do que os quase 1.500 jogos na NBA em que somou médias de 17.2 pontos, 4.4 ressaltos e 3.2 assistências. Merece ser lembrado por muito mais do que os prémios de Rookie do Ano, muito mais do que as duas presenças nas equipas All-NBA, muito mais do que os oito All-Stars, muito mais do que a medalha de ouro em Sidney.

Vincent Lamar Carter Jr., a.k.a. «Vinsanity», a.k.a. «Air Canada», a.k.a. «Half man, half amazing» pode ter muitas alcunhas, mas merece ser lembrado sobretudo pelo respeito pelo jogo. Em 21 anos fez parte de oito equipas (Toronto Raptors, New Jersey Nets, Orlando Magic, Phoenix Suns, Dallas Mavericks, Memphis Grizzlies, Sacramento Kings e Atlanta Hawks), foi trocado quatro vezes e dispensado uma vez. Sempre se mostrou agradecido a todas as organizações por onde passou. Não escolheu caminhos fáceis. Vai terminar a carreira sem um único título de campeão - desculpem, fãs dos Hawks! -, mas é uma questão de tempo até entrar no Hall of Fame. Foi leal ao jogo. E isso vale muito mais do que anéis.

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