A Volta a Espanha entre Castelos, Oliveiras e a Serra Nevada. E um “bacalhau”
Alcalá la Real foi o local de partida da 15ª etapa de La Vuelta. Cidade situada na província de Jaén, ponto de confluência entre Córdoba e Granada, debutou na Volta a Espanha em 2010. Dominando a localidade, no alto de uma colina, a Fortaleza de la Mota serviu, durante mais de 150 anos, de fronteira entre os reinos de Castela e Granada.
O pódio e a cidade móvel da La Vuelta estavam montados ao longo do Paseo de los Álamos. Zona verdejante, que beija a zona da fortaleza da cidade, ali se estenderam as zonas VIP, como os “comes e bebes” e distribuição de brindes, e a zona comercial onde se vende toda a espécie de merchadising, com as camisolas oficiais das equipas de ciclismo a rivalizarem e até superiorizarem, em termos de preço de venda, as dos ídolos da bola.
Os patrocinadores da Volta a Espanha são reis e senhores destes longos minutos que antecipam a chegada dos artistas da bicicleta. Ao longo de uma avenida que antecede o ponto de partida da etapa, estava montado o espaço reservado às equipas, aos carros de apoio e autocarros, verdadeiros “hotéis e spa ambulantes”.
Com muita música, um calor de quase 30 graus matinais obrigava ao consumo de bebida e aconselhava à utilização de chapéus e de leques, materiais distribuídos por marcas que se associaram à Volta a Espanha.
Com o povo com os olhos centrados nos ciclistas, um responsável da organização, numa análise minuciosa às mudanças e pedais das bicicletas, recorria a um tablet para filmar os veículos de duas rodas que estavam em cima dos carros de apoio ou pisando já o asfalto. A razão é simples: procurava a existência de putativos “auxiliares” para a prova que iria enfrentar uma poderosa montanha, a subida para a Serra Nevada.
Um autógrafo ou uma selfie com os heróis das duas rodas são os “desejos” mais pedidos por esta legião de fãs de todas as idades, dos mais novos à terceira idade. A uma larga distância, Alberto Contador, espanhol da Teck-Segafredo que se despede nesta Vuelta do ciclismo profissional, Chris Froome, da Sky e Miguel Angel Lopez (Astana) são alguns dos mais procurados pelos caça-retratos a olhar para o telemóvel.
Uma paisagem de Oliveiras que serpenteiam a serra
Com uma praça cheia, os corredores iniciam a chamada partida de exibição para, uns metros mais à frente, ocorrer a largada em andamento.
Serpenteando uma paisagem dominada por milhares de hectares de olival, os ciclistas pedalaram a alta velocidade até Granada, onde levaram outro banho de multidão antes de enfrentar a subida ao ponto mais alto da prova, com mais de 2500 metros de altitude.
No caminho para a Serra Nevada, as bermas foram ocupadas pelos adeptos do ciclismo que ora hastearam bandeiras dos países dos seus atletas de eleição, ora escreveram frases aos seus heróis.. Havia lençóis estendidos por cima de carros a servir de tendas, mesas para partilha de comida e bebida entre famílias, amigos e desconhecidos. Todo o milímetro de terra foi ocupado, à medida que o percurso definido alinhava serra acima.
Quem também pedalou foram alguns aventureiros amantes da modalidade. E até houve quem tenha seguido montado a cavalo.
Com o aproximar da meta, a 27 quilómetros do Alto Hoya de la Mora, Serra Nevada, lá no alto no Pico da Veleta, o terceiro mais alto de Espanha, na famosa estação de ski, subiu o nervosismo entre a multidão, ansiosa por saber quem seria o primeiro a chegar e se Alberto Contador, que liderou um grupo perseguidor, conseguiria chegar em primeiro.
Quando o jovem colombiano Miguel Angel Lopez, o 'super-homem' como é chamado, avançou para a liderança a pouco mais de cinco quilómetros da partida - o que em alta montanha parece infinito - , e Contador começou a pagar a fatura de quase 20 quilómetros a trepar para a alcançar, uma certa anestesia tomou de assalto grande parte da massa humana que preenchia esta paisagem que durante o inverno está coberta de neve, mas que ao sol deste último domingo mais parecia ser palco de um concerto de verão.
Subir ao ponto mais alto da prova para receber um “bacalhau”
Com os ciclistas a um quilómetro da meta, começam a chegar carros e motos debaixo de avisos de apitos da organização. Médicos, imprensa, comissários e organização.
3h 34’ 51’’ depois de ter partido de Alcalá la Real, Miguel Ângel Lopez, 23 anos, da Astana, foi o primeiro a levantar os braços ao chegar ao Alto Hoya de la Mora, um ponto que a Volta a Espanha já visitou por quatro vezes.
Subir ao pódio em Espanha é diferente de em Portugal. Depois de uma discussão sobre igualdade de género, Espanha abandonou a tradição do beijo das meninas aos heróis da etapa e definiu novas regras, nomeadamente com a introdução de modelos masculinos.
Na Serra Nevada, elas eram quatro, ao passo que homem, só mesmo um, para amostra. As meninas e o menino subiram ao palco com as cores dos patrocinadores para entregarem as respetivas camisolas. Chris Froome, que vestia a camisola amarela de líder foi chamado por três vezes, tantas quantas Angel Lopez, vencedor da etapa. Froome teve direito a cumprimentos faciais por parte de representantes do patrocinador Skoda e de uma senhora que lhe entregou a mascote da prova.
Já o camisola vermelha, o único beijo que levou foi da senhora que lhe entregou a mascote da Vuelta e de uma representante da Skoda, marca patrocinadora. Os restantes, tal como o colombiano, foram todos corridos com um “bacalhau”.
Sabendo que o dia seguinte seria de descanso, ainda assim ciclistas sairam rápido para o cumprimento dos preceitos médicos e foram de avião para Logroño, capital da província de La Rioja, norte de Espanha.
Fazer turismo na Vuelta
Quem permaneceu por muitos minutos ainda no alto da montanha foi um grupo que se vestia com as camisolas do Cycling Country Bike Tours, empresa especializada em organização de passeios velocipédicos que levou um conjunto multinacional e multicultural de pessoas a participarem durante uma semana na Volta a Espanha. “Fazemos parte de etapas”, avançou Jeremy Lowes, que viajou de Sydney, Austrália. “Alguns de nós somos mais velhos, sim. Nós, os mais velhos, temos tempo e dinheiro para estas aventuras”, atirou no dia em que a Volta a Espanha levou um banho de multidão numa meta colocada a 2560 metros.
Com o fim da etapa, dezenas de pessoas desceram montanha abaixo (como estivessem a esquiar por cima de terra e pedregulhos) até aos parques de estacionamento, situados três quilómetros abaixo, seguindo o asfalto. A caminho de Granada, mais de uma hora depois do primeiro atleta atravessar a linha da meta, os milhares de carros entupiram a única via até Granada, permitindo que quem desceu sentado meditasse, ao longo de quase duas horas, nesse trajeto feito pelos ciclistas.
* Os jornalistas viajaram a convite do Eurosport
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