“Acho que o Diogo ainda não está no topo, no seu topo” do que pode atingir. Em jeito de profecia, Ranomi Kromowidjojo, ex-campeã olímpica dos Países Baixos, antecipava, embora de forma um tanto ou quanto hesitante, o que poderia vir a ser a participação de Diogo Ribeiro nos Jogos Olímpicos Paris 2024.
Falou dias antes do arranque das provas de natação, mas não se enganou. No entanto, deixou em aberto um lado B que, muito presumivelmente, sofrerá transformação. “Vai melhorar, provavelmente, em algumas coisas, até na parte mental, ter mais experiência, e ao ter mais experiência aprendes a lidar com a pressão, com as provas, nadar, a luta pela qualificação, as finais, também é diferente, nadar de manhã, à noite, tudo o que necessita de ajustar…”, anteviu a jornalista e comentadora neerlandesa do Eurosport.
Pode a idade e experiência influenciar na prestação olímpica? Ranomi respondeu. “A importância da idade para estar mais próximo ou não de ganhar depende da pessoa em si. Umas são muito fortes com 15 anos, outras ficam melhores depois dos 30”, realçou, referindo-se aos 19 anos do nadador português que entrou nas piscinas de La Défense Arena com o título mundial dos 100 metros mariposa.
“A experiência conta. Às vezes, assistimos a uma estrela muito nova a nadar de uma forma fantástica, mas de repente desaparece e não sabemos o que acontece a seguir da próxima vez”, concluiu a detentora de quatro medalhas e quatro Jogos Olímpicos no curriculum, Pequim 2008, Londres 2012, Rio de Janeiro 2016, Tóquio 2020.
O percurso olímpico, além dos títulos europeus e mundiais e as quase 80 medalhas conquistadas na carreira, conferem-lhe autoridade mais que suficiente para opinar sobre a preparação de um atleta para a mais importante competição a nível global.
“Para sermos atletas de alta competição preparados para os Jogos Olímpicos é algo que demora alguns anos. Quando vimos que alguém ganha uma medalha, especialmente na natação, sabemos que teve todo esse trabalho, muitas horas e muitos metros (na piscina) para chegar ao topo”, explicou.
“Nunca sabes se vais ter uns segundos Jogos, é por isso que não sou capaz de dizer que os primeiros são para aprender e só depois, talvez, pensar em ganhar”, recordou a atleta que viu um metal mais precioso pendurado ao pescoço na estreia nos Jogos, feito que se repetiu, em dose dupla, na segunda experiência.
A viagem pelas memórias. As boas e as más
Ranomi Kromowidjojo conquistou a primeira medalha olímpica em Pequim2008. Tinha então 17 anos. Regressou das olimpíadas na China com o ouro ao peito depois de vencer na estafeta 4x100 livres (equipa feminina de natação dos Países Baixos).
Quatro anos depois, em Londres, subiu ao lugar reservado aos deuses do Olímpio: duas medalhas de ouro (50 e 100 livres) e uma de prata (4×100 livres). Contudo, viria a falhar o pódio nas duas edições seguintes. E sentiu na pele esse falhanço.
Ranomi viajou pelas memórias. As boas e as más.
Recuou ao dia em que começou a sonhar com os anéis. “Quando vi os Jogos Olímpicos de Sidney, em 2000, comecei por pensar que era uma vida demasiado dura, que temos de treinar muitas e muitas horas”, começou por recordar.
Avança na sua história um par de anos. “Acho que só mesmo quando tinha uns 15 ou 16 anos, quando entrei nos europeus juniores e ganhei uma medalha é que comecei a pensar pela primeira vez em trabalhar mais e estar mais focada no que fazia para poder também ganhar mais”, referiu.
“Trabalhei muito para chegar onde cheguei”, assumiu a nadadora de velocidade e distâncias curtas. “Aquilo que mais treinava era a qualidade, mais do que a quantidade, mas nem por isso deixa de ser 24/7, 24 horas nos sete dias da semana”, continuou.
Nunca parou desde que iniciou esta viagem até à elite de alta competição. “Até num dia de folga temos de estar preocupados com o descanso, com o que comemos. Não é só a questão do treino, da parte física, é tudo o que nos rodeia”, frisou ainda.
Fixou-se nas memórias. Preferiu começar pelas boas e pela regra da cronologia. “As melhores são as de Londres-2012, ganhar duas medalhas de ouro”, recuperou a nadadora dos Países Baixos. “As piores são as do Rio-2016”.
Ao sucesso de Londres2012 seguiu-se a ausência de pódios quatro anos depois, no Brasil. Fixou-se em detalhe no que correu mal. “(No Rio de Janeiro) Houve muita coisa antes, problemas na equipa dos Países Baixos, o meu avô morreu, tive lesões que nunca quis passar para fora, que a imprensa não sabia, relembrou.
“Não ganhei nenhuma medalha, foi quase como se devesse uma explicação ao país por não ter chegado ao pódio. Senti-me terrível, os jornalistas nos Países Baixos … foi difícil”, explicou.
Retirou lições e ilações das críticas. “Fez-me mais forte, perceber a minha história, quem eu sou e o que quero contar”, atestou. “Claro que queria voltar a ganhar, mas se vir toda a minha carreira ... é uma boa lição para as novas gerações porque não é tudo sobre ganhar. Perdi mais do que ganhei, mas só olham para as competições olímpicas e as vitórias”, anotou a nadadora neerlandesa que quer hoje, com a experiência acumulada enquanto ex-atleta, contar a história de quem está, agora, do lado onde já esteve.
“Há o nadador, mas também há uma pessoa além do nadador, não tanto nessa parte do ser bom ou mau, ganhar ou perder, mas na perspetiva das histórias. Todos os que estão nos Jogos são vencedores, a diferença é que só um pode ganhar a medalha de ouro”, sustentou, deixando para o final um ensinamento aprendido com o pai no Karaté, modalidade que praticou em pequena por influência paternal.
“O Karaté ensinou-me a postura, a não ser arrogante. O meu pai aos 70 anos ainda é perfecionista em certos movimentos e a natação é igual, fazemos os mesmos movimentos e distâncias anos e anos para encontrar a felicidade na perfeição”, rematou.
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