O futebol é um desporto de inverno. Esta é uma das frases feitas sobre o maior e mais popular desporto coletivo do mundo. É também uma modalidade em que as profecias, superstição e sorte podem, por vezes, entrar nas equações para explicar ou justificar resultados.
No Estádio Dr. Magalhães Pessoa, em Leiria, a 14.ª edição da Taça da Liga decorreu debaixo de chuva, num retângulo aqui e acolá empapado, onde diversas poças de água impediram, a espaços, a bola de rolar à flor da relva.
Uma 11.ª final diferente, inédita, Sporting Clube de Portugal e Sporting Clube de Braga além de discutirem a conquista do primeiro troféu do ano e do título de Campeão de inverno, procuravam “desempatar” as duas conquistas anteriores na terceira competição nacional.
Uma final que colocou ainda, frente a frente, o treinador que se apresentava como Campeão de inverno em título (2019-2020), Rúben Amorim, então ao serviço dos “Guerreiros do Minho”. Entretanto mudou de banco para os leões e o timoneiro que inaugurou as conquistas da taça da Liga, Carlos Carvalhal, em representação do Vitória Futebol Clube, em 2008.
A realidade aumentada de um futebol para ver no sofá
Sem público nas bancadas, o espetáculo virou-se, com naturalidade, em exclusivo para os adeptos sentados em casa. A Liga portuguesa respondeu com imagens em realidade aumentada – Castelo de Leiria, um Guerreiro do Minho e um Leão – para dar azo ao produto (futebol) virado para a televisão. Uma final para ver no sofá.
E seria um sofá, telecomandado, que viria a entregar a bola ao árbitro Tiago Martins, ladeado no centro do terreno pelos capitães Coates (Sporting CP) e Fransérgio (SC Braga). Num momento de interação, os homens da braçadeira acenaram a dois adeptos presentes num pequeno ecrã que acompanhou a peça de mobiliário rolante.
Nos leões, Rúben Amorim chamou ao onze Nuno Mendes e Jovane — este último o marcador dos dois tentos frente ao FC Porto e que carimbaram o passaporte para a final. Do lado bracarense, Carvalhal apostou na mesma equipa que havia escalado na vitória diante o Benfica de Jorge Jesus.
Aos 20 minutos, Abel Ruiz tirou a fotografia ao estado do terreno. Lançado em contra-ataque quis levar a bola colada ao pé, mas deixou-a numa poça de água a escassos metros da área adversária.
Treinadores de bancada
Neste combate entre as duas equipas, os jogadores deslizavam na relva (ou água), o árbitro não interpretava os choques como faltas merecedoras de admoestação, mas não perdoou um deslize de Jovane, avançado do Sporting. Estava dado o primeiro amarelo da final. Abertas as hostilidades no capítulo de cartões, Sequeira, defesa bracarense iguala a partida ao nível dos amarelos.
Rúben Amorim e Carlos Carvalhal trocaram palavras entre si, o 4.º árbitro (Manuel Mota) chamou a atenção do chefe de equipa e este deu ordem de expulsão aos dois treinadores.
Nenhum deles ficou a rir. Carvalhal subiu até à bancada junto da equipa técnica. Por sua vez, Amorim, deixou vago o lugar no banco que serviu de amuleto, onde se sentaram, nas meias-finais, as duas equipas finalistas e virou treinador de bancada.
Sem grandes ocasiões de parte a parte, a passe do central Gonçalo Inácio, Pedro Porro, descaído na direita, apanha a bola perto da entrada da área e, no primeiro remate à baliza, inaugurou o marcador a favor do emblema verde e branco.
O relógio (41’) que caminhava para o intervalo registou ainda Pedro Gonçalves a surfar entre a defesa minhota e rematar a bola para as mãos de Matheus.
A quarta taça em três anos
Tempo de descanso, tempo de substituições e adaptações ao estado do relvado. O amarelado Jovane cedeu o lugar a Nuno Santos e Paulinho viria a ocupar a posição de Ruiz, na habitual troca por troca, no caso, de ponta de lança.
Tiago Tomás (TT), avançado leonino, ainda apareceu de touca — usada para proteção de um corte no sobrolho sofrido no final dos primeiros 45 minutos —, quiçá antecipando uma serenata de golos à chuva, mas as previsões do IPMA, certeiras, foram contrárias. A previsão apontava para a paragem da pluviosidade às 21h00. E assim foi. Minutos antes os jogadores deixaram-se de sentir as gotas a caírem na cabeça.
Não choveu, mas as marcas da chuva mantiveram-se. Matheus, guarda-redes do Braga, arriscou um par de vezes a jogar, com os pés, fora de área e Nuno Santos foi traído, outras tantas vezes, pela tração da bola, mais parecendo um carro com o travão de mão puxado no momento da condução da bola com o pé.
A touca não serviu de inspiração a TT, substituído por Sporar. Respondeu o Braga com Iúri Medeiros, jogador formado pelo clube de Alvalade, elevando para sete o número de jogadores Made in Alcochete: no onze inicial do Sporting (Gonçalo Inácio, Palhinha, Nuno Mendes, Jovane, João Mário e Tiago Tomás) e dois que vestem a camisola encarnada do Braga (Esgaio e Iúri).
Do pé esquerdo de Medeiros saiu, à segunda tentativa, a primeira grande oportunidade de golo dos “Guerreiros do Minho”. O desenho da jogada é sobejamente conhecido para quem acompanha o esquerdino português. Parte do lado direito do ataque, flete para o meio, e chuta. Adán entrou em ação.
Depois, Paulinho atira ao ferro e ficou a centímetros de desempatar o trono que divide com Tozé Marreco, de melhor marcador da Taça da Liga (ambos com 12 golos). Na resposta, Sporar, a passe de Matheus poderia ter “morto” o jogo, mas rematou fraco para as mãos do último homem da defesa bracarense.
A intensidade e os nervos subiram de tom nos últimos 10 minutos do tempo regulamentar. Na bancada, Rúben Amorim andava de um lado para o outro; no campo, os leões somavam amarelos. Matheus Nunes, Porro, Neto (ainda não tinha aquecido e já via o árbitro levar a mão ao bolso) e Pedro Gonçalves. Este último com a particularidade de ser expulso, vermelho direto, por palavras dirigidas a Tiago Martins.
As mãos de Adán ainda socaram uma bola raspada na cabeça de Paulinho e um pontapé fortíssimo na sequência de um livre.
Apito final. Em quatro anos, o Sporting vence a terceira Taça da Liga do seu historial, sendo o segundo clube com mais troféus, atrás dos sete do Benfica.
Rúben Amorim, enquanto treinador, vence a Taça da Liga, de forma consecutiva, por dois clubes diferentes. Ele que já tinha ganhodo, em dois anos seguidos, ao serviço de dois clubes: Benfica, em 2012 e Braga, no ano seguinte. Um feito agora alcançado por João Palhinha.
“Em relação à estrelinha, tenho confiança no meu trabalho, mas também acho que a sorte tem um papel importante. Não me importa nada que digam que tive sorte. Há quem ache que não, eu acho que tenho. E quanto mais falo na estrelinha, mais a tenho", disse o treinador leonino na antevisão da final.
A sorte dá muito trabalho, já alguém disse. Parece que esta equipa jovem leonina e treinador assimilaram essa máxima.
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