Após a intervenção inicial de Mário Centeno no segundo e último dia de debate na generalidade da proposta de Orçamento do Estado para 2020, na Assembleia da República, a dirigente e deputada do Bloco de Esquerda Mariana Mortágua confrontou este membro do Governo com algumas das consequências sociais, económicas e até políticas resultantes da linha financeira seguida desde 2016.
Mariana Mortágua apontou que, em todos os anos, as metas inicialmente definidas em termos de défice acabaram por ser ultrapassadas e, "nesses brilharetes, foram mais de três mil milhões de euros em medidas que Mário Centeno negou à Assembleia da República a oportunidade de discutir".
"O défice previsto para 2019 era de 0,2%, mas podemos vir a saber dentro de um ou dois meses que, afinal, já negociou esse Orçamento com uma folga que ninguém conhecia. Este assunto é sério, porque, por trás de cada brilharete, há despesa que não foi executada - e sempre que isto acontece a despesa do ano seguinte é prevista a partir de um patamar mais baixo", justificou.
Mariana Mortágua considerou mesmo esta política de "excedente orçamental" de Mário Centeno muito nefasta para os restantes membros do Governo socialista, "porque apanham com o embate do comboio que falta, com o embate das forças de segurança sem reforço salarial ou com o embate da escola onde chove e faltam funcionários".
"São os restantes ministros que apanham com o embate do excedente", insistiu a dirigente do Bloco de Esquerda, com o ministro de Estado e das Finanças a contrapor que a execução da despesa corrente primária atinge 99% (contas nacionais).
"Ano após ano, fomos sempre acusados de otimismo nos nossos cenários macroeconómicos. De facto, a economia portuguesa bateu recordes ano após ano. A poupança em juros, que financia a despesa corrente primária e de investimento, atingiu os dois mil milhões de euros ao longo destes quatro anos. Portugal ganhou credibilidade - e este é o grande sucesso e o brilharete que temos de falar", respondeu.
Já o deputado social-democrata Álvaro Almeida lamentou que a proposta orçamental "não tenha medidas para aumentar o crescimento económico, que se conserva em 1,9%".
"O Governo está satisfeito com o crescimento que temos, mas é o único abaixo de dois por cento entre todos os países da coesão da União Europeia. Portugal deveria crescer muito mais do que a média da União Europeia, o que não acontece. Temos razões para estar preocupados", afirmou o deputado do PSD.
O ministro de Estado e das Finanças contra-argumentou que esses países da coesão, na sua grande maioria do centro e leste da Europa, aumentaram impostos nos últimos anos, enquanto "Portugal reduziu" e, por outro lado, "têm um terço da dívida portuguesa".
"O crescimento da economia portuguesa é um sucesso único no mundo, porque é feito ao mesmo tempo em que se reduz o endividamento", justificou o membro do Governo.
Mas Mário Centeno foi ainda confrontado com dúvidas de Mariana Mortágua sobre transferências para a banca, designadamente para o Novo Banco.
"O Orçamento prevê 600 milhões de euros para o Novo Banco, mas também que as contas públicas atribuam 850 milhões de euros para o fundo de resolução. Se diz que vão ser 600 milhões de euros para o Novo Banco, qual a razão para também atribuir 850 milhões de euros ao fundo de resolução?", perguntou.
O ministro de Estado e das Finanças começou por alegar que "as injeções de capital no Novo Banco são da responsabilidade do fundo de resolução, que é financiado pelo sistema financeiro português".
"Assim será até ao momento em que todas as dívidas do sistema financeiro estejam devolvidas ao Orçamento do Estado. Espero que esse dia seja próximo e que se saia desta situação inquietante", respondeu Mário Centeno.
Comentários