De acordo com um acórdão proferido no passado dia 12, e a que a agência Lusa teve hoje acesso, “os artigos 63.°, 167.°, 168.°, 178.° a 180.°, 182.° e 219.° da Diretiva IVA, bem como o princípio da neutralidade fiscal, devem ser interpretados no sentido de que se opõem à legislação de um Estado‑Membro nos termos da qual […] o benefício do direito à dedução do IVA é recusado com o fundamento de que o prazo previsto na referida legislação para o exercício deste direito se conta a partir da data de emissão das referidas faturas iniciais e expirou”.
Segundo explicou à agência Lusa António Gaspar, associado coordenador da sociedade de advogados TELLES (representante de uma das empresas envolvidas no processo que foi agora objeto do acórdão do TJUE), até esta decisão a Autoridade Tributária Portuguesa não permitia ao adquirente a dedução do IVA de notas de débito ou crédito emitidas mais de quatro anos após a emissão da fatura original.
Uma situação que, sustenta, “constituiu um entrave à realização de negócios, ao limitar a duração de qualquer negócio a quatro anos” e “constitui uma violação do princípio comunitário da neutralidade do IVA”.
Este entendimento foi agora corroborado pelo Tribunal de Justiça da União Europeia, numa decisão que, segundo salienta António Gaspar, fará agora jurisprudência para casos futuros, deixando de impor um limite de quatro anos para a emissão de notas de débito ou crédito.
Este acórdão do TJUE veio responder ao pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Supremo Tribunal de Justiça português num processo que opõe duas empresas nacionais - uma de reciclagens, outra de pavimentos – relativamente à liquidação de IVA de um negócio no valor global de 664.538,77 euros.
Segundo se lê no acórdão, esta venda foi feita faturando IVA à taxa reduzida de 5%, mas numa inspeção tributária realizada em 2011, relativa aos exercícios de 2008 a 2010, a administração fiscal portuguesa considerou que devia ter sido aplicada a taxa normal de IVA de 21% e procedeu a liquidações adicionais de IVA de 100.906,50 euros.
A empresa vendedora liquidou este montante e solicitou o respetivo reembolso à empresa compradora, que “recusou pagar este acréscimo de IVA por, nomeadamente, não poder proceder à sua dedução, uma vez que o prazo de quatro anos previsto no artigo 98.°, n.° 2, do CIVA [Código do IVA] tinha expirado […] e porque não lhe incumbia suportar as consequências de um erro que é apenas da responsabilidade” da vendedora.
Na sequência desta recusa, a vendedora intentou uma ação com o objetivo de obter a condenação da compradora no reembolso do montante que tinha pago, acrescido de juros de mora”, sendo que tanto o tribunal de primeira instância como o tribunal de recurso “consideraram que, não obstante existir uma obrigação de repercutir o IVA, o sujeito passivo adquirente dos bens só pode ser obrigado a pagar o referido imposto se as faturas ou documentos equivalentes forem emitidos a tempo de lhe permitir exercer a respetiva dedução”.
A empresa vendedora interpôs então recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, que levantou a questão de “saber se os artigos 63.°, 167.°, 168.°, 178.° a 180.° e 182.° da Diretiva IVA, bem como o princípio da neutralidade fiscal, se opõem a uma legislação nacional da qual resulte que, em circunstâncias como as que estão em causa no processo principal, o prazo para o adquirente deduzir o acréscimo de IVA se conta a partir da emissão das faturas iniciais e não da emissão ou da receção dos documentos retificativos”.
Esta questão foi agora positivamente respondida no acórdão do TJUE, que considera que a legislação nacional contraria, de facto, o que está previsto na diretiva comunitária do IVA, assim como o princípio da neutralidade fiscal.
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