Dirão eles não se tratar de nenhum dos casos enunciados, mas sim da sua perspectiva da verdade, quando francamente os factos só o são por não estarem abertos a interpretações. Mas o que achávamos imutável está a mudar. Factos são factos, ou factos podem eventualmente ser factos, até factos serem ou não factos, consoante queira quem os vê ou os comunica.

Não sei se sou eu que com a idade não estou a saber acompanhar a contemporaneidade, mas dá-me ideia que esta, mais que a sobre ou a sub, a desvalorização da verdade é um rio de lama que ao passar vai arrastando o que pode, e entre o deixa e o que arrasta, inevitavelmente desaguará num oceano de merda.

A amoralidade de quem relativiza a verdade está a disseminar-se, e isso vai-se vendo em toda a parte. O partido que nós sabemos falsificou assinaturas e pouco importa, tal como importa ainda menos que o seu líder escreva uma tese de doutoramento na qual defende o espectro sociopolítico diametralmente oposto ao que agora embandeira, bem como importa aproximadamente nada que use as redes sociais para partilhar notícias, como sendo verdade, de um site de propaganda nacionalista e fabricador de notícias falsas (estando listado como um dos principais sites de notícias falsas a ser monitorizado pelo observatório do ISCTE a este assunto relativo). Site este que por sua vez é louvado publicamente, quer por milhares de anónimos, que por figuras como um conhecido padre, destacado colunista no Observador que, entre outras coisas, relativiza o genocídio que foi a Inquisição, porque a sua verdade não é assim tão atroz como a verdade que achávamos verdadeira. Como isto, como estas falsas verdades, são agora aos milhares, aos quilómetros, aos teras, por dia, por hora, por minuto.

Vai-se movediçamente perdendo a vergonha, talvez até a culpa, da desonestidade. E não me creiam já ingénuo, ou até um iludido optimista, que eu bem sei que desonestidade, em diferentes graus, sempre houve. Só não sabia que tão rápida e presentemente seria alastrada e tão bem aceite.

Um dia já quase ninguém saberá o que é verdade ou não, já nada será um facto e tudo relativo será, porque até lá pouco nos importámos. Nesse dia, aqueles tão poucos terão ganho e quase todos teremos perdido.

Sugestões mais ou menos culturais que, no caso de não valerem a pena, vos permitem vir insultar-me e cobrar-me uma jola:

- Sobre o Politicamente Correcto: Novo livro do Manuel Monteiro. Não tendo que concordar ou discordar de tudo, acho um livro bom para se abrir a discussão sobre o tema, e uma visão moderada (e sustentada) que considero pertinente.