Uma primeira dúvida se coloca face às eleições alemãs que têm lugar amanhã: qual será a composição dessa coligação. Actualmente o CDU e o seu afilhado bávaro CSU dividem o Governo com o seu principal opositor, o SPD de Martin Schulz. Os sociais-democratas ainda acalentaram brevemente a esperança de ganhar o maior número de lugares no Parlamento (num total de 598), mas a fraca receptividade do eleitorado a Schulz cedo mostrou que tal não irá acontecer. Todavia, mesmo que ocorresse, o SPD teria de ir buscar o CDU, mantendo assim a coligação. A diferença estaria na composição do Governo, com Schulz em vez de Merkel, mas não vale a pena considerar esta hipótese.

A segunda questão é quais são os partidos que poderão entrar neste “centrão direita/centro” para lhe dar mais massa critica, mesmo desnecessária. Uma opção seria o Partido Democrático Livre, FDP, que já tinha sido a opção de Angela Merkel em 2009-2013. Bastaria para dar aos democrata cristãos a maioria, mas este cenário – ou seja o SPD com o FDP – abriria espaço para uma hipotética (e pouco provável) coligação centro-esquerda, do SPD com os “vermelhos” (Linke) e os Verdes.

A terceira incógnita, e decerto a mais importante, será a votação da direita extrema, o Alternativa para a Alemanha, AfD, de Alice Weidel and Alexander Gauland. Nas eleições anteriores obtiveram uns surpreendentes 8% e agora projecta-se que chegarão aos ainda mais surpreendentes 10%. A diferença será a entrada do partido no Parlamento. Apenas com um deputado, mas com um impacto simbólico formidável, pois será a primeira vez que a direita dura entraria no Bundestag desde 1945.

Tal como nas outras eleições ocidentais recentes, na Alemanha também se coloca a intervenção dissimulada da Rússia de Putin. Este, como tem sido o seu método, de acordo com a ideologia e a conveniência, aposta da extrema-direita. É referido que centenas de cidadãos alemães que falam russo têm entrado para o AfD. Aliás, é nos territórios da antiga RDA que se encontra o maior número de preferências pelo partido de extrema-direita –  as sondagens apontam 18%.

Mas será este grupo de falantes de russo significativo? Alguns são imigrantes de outras repúblicas ex-soviéticas, outros são saudosos da falecida “Alemanha de Leste”. São nada mais nada menos do que três milhões. Claro que falarem russo como primeira língua não significa que votem segundo os gostos de Putin; mas os russos há anos que fazem um trabalho em profundidade para angariar simpatias e votos. Há, por exemplo, uma extensa rede de clubes de luta – uma forma de combate corpo a corpo inventada pelos serviços secretos soviéticos – que recruta alemães e envia os melhores para estágios em Moscovo. E há, evidentemente, a parafernália de hacking e fake news que os russos usaram extensivamente nos Estados Unidos, Reino Unido e França.

O que poderá significar um parlamentar AfD no Bundestag? Não muito, em termos legislativos; mas poderá ter grande visibilidade e dar voz a teorias anti-imigração e racistas. É uma aposta no futuro, a confirmação de uma tendência. “Bad, very bad”, como diria Trump.

O eleitorado é favorável a Merkel, porque aprecia a estabilidade e beneficia com os bons resultados da economia alemã nos últimos 12 anos. Mas a corrente anti-imigração tem crescido não só por causa dos recém-chegados da Síria mas também pelos três milhões de turcos que vivem no país. Os turcos não votam, mas também não se integram e são uma permanente fonte de desconforto, com as suas manifestações e hábitos muito diferentes dos alemães. Há também uma corrente favorável a uma aproximação com a Rússia e afastamento dos Estados Unidos. Para a Alemanha, que consome gás e petróleo russos, não seria um mau negócio.

Nada disto ameaça a situação germânica no curto prazo, isto é, nos próximos quatro anos de Merkel. A Chanceler teve uma ligeira baixa de popularidade quando decidiu abrir as portas aos imigrantes, mas já recuperou, até porque as portas entretanto não estão assim tão abertas.

Mas não deixará de aproveitar estas eleições para remodelar o seu gabinete, conforme o equilíbrio da nova coligação e outros interesses. Pode ser que Schauble saia das Finanças, por exemplo, o que levaria a mudanças na área económica.

Resumindo, alguma coisa há-de mudar. Mas ficará tudo mais ou menos na mesma.