Podemos antecipar sem grandes pruridos ou dramatizações. A cada passagem de ano, exigimos reflexões e elaboramos uma lista de coisas boas que iremos fazer em prol de nós, em prol dos nossos. A maior parte dessa lista é esquecida conforme o mês de Janeiro, na sua imensa crueldade, avança sem pieguices para mostrar a inevitabilidade do tempo. Assim, pouco importa saber que se deseja muito a coragem para ir ao ginásio, para abdicar dos queijos e fumeiros, do álcool ou dos amigos suspeitos no exercício da sua amizade, aqueles que deixam más energias no ar e à conta dos quais temos engolido não um ou outro sapo, mas famílias inteiras de batráqueos.

Carregamos connosco o que podemos, mesmo os amigos mais quezilentos, pois teremos de encontrar neles um qualquer propósito se não os sacudimos da nossa vida. Apesar de sabermos isto tudo, muitos de nós optamos por fazer listas adoráveis a contemplar as possibilidades infinitamente boas de 2019.

No topo da minha lista está uma limpeza geral à vidinha, ou seja, a necessidade de simplificar e de selecionar. O lixo acumula-se muito no coração e o coração deveria ser um espaço emocionalmente inteligente, importa por isso fazer um esforço para entender o que beneficia, o que prejudica. Fiz a lista. Comecei com o conjunto de banalidades que, na verdade, são essenciais à existência – saúde, amor, trabalho e consequente estabilidade financeira. Desejando ainda a paz mundial, senti-me uma candidata a miss universo, algo que objectivamente nunca seria para mim. Conforme vamos envelhecendo, alguns de nós, caímos numa poção de tolerância e lamechice, isso também é típico do final de cada ano, portanto não me atemorizei muito com a minha lista espontânea de clichés. O pior foi constatar a imprevisibilidade dos meus desejos. Afinal, o que é que conseguimos efectivamente controlar? Pouco ou mesmo nada. O nosso corpo pode ser um traidor num gesto repentino que nos atira ao chão; o amor, mesmo a construção mais sólida, pode ruir; o trabalho pode faltar e as estatísticas não mentem sobre o desemprego como possibilidade real; o dinheiro... bom, o dinheiro parece ter vontade própria e, sobretudo, tendência para seguir rumo a outras carteiras e bolsos.

Risco a minha lista patética e recomeço. Aposto no intelecto: defender a dissertação de mestrado, aprender mais sobre cozinha, reler o Eça e o Camilo, continuar o romance que, teimoso, não se quer deixar descobrir. Fico mais apaziguada com esta lista. Numa segunda análise, concluo que não é uma lista de intelecto, é uma lista de amor, porque cozinhar é só isso; é uma lista de enriquecimento, porque a Literatura é uma forma de riqueza e, por fim, é uma lista contra o tempo, já que escrever é um trabalho contra a morte de qualquer coisa. Vamos lá, 2019, mostra o que vales, estamos prontos. Para muitos de nós, pior não pode ser, para outros só pode mesmo melhorar, por isso, sem medos, revela-te logo de imediato e deixemos a conversa do recomeço potencialmente bonzinho para outro ano, sim? Agradecida.