Revemos o ano mentalmente, numa rede só nossa, e é uma catadupa de fracassos, dramas e desgostos, salteados com pontuais e efémeros sucessos. Revemos o ano socialmente, nas redes de todos, e é um rol de sucessos, alegrias e conquistas, rendilhados com eventuais e insignificantes fracassos.

Mas fazemo-lo tão convictamente, queremos tanto que os outros acreditem que o nosso ano foi o melhor de todos os anos, que quase nos convencemos disso também. É que no Instagram somos todos poetas, poetas como quem diz fingidores porque fingimos tão completamente que chegamos a fingir que é felicidade a felicidade que a gente pouco sente.

E então prometemos mais ainda. Este ano é que vai ser. Este é o meu ano. Não é que o que agora acaba não tenha sido, mas este é que é. Vocês vão ver. Aliás, vocês desse lado da rede vão ver tudo. Vão ver como serei bem sucedido no amor, na amizade, no trabalho, no corpo idílico, no culto do eu, de mim, do meu ser e da minha personalidade, no número de gostos e seguidores, no nada e em tudo.

Este vai ser o meu ano. E talvez seja. Talvez seja o ano de todos nas nossas ilusõezinhas externas que nos afagam as dores internas. Será que afagam? Às tantas não o fazem, mas nós continuamos a fingir que sim, e o placebo ajuda mesmo.

Não quero com isto parecer um pessimista, qual arauto da desgraça sem boaventura alguma. Pelo contrário, vivam os sonhos e as ilusões, vivam as promessas e as esperanças, vivam as felicidades anunciadas e as alegrias que estão mesmo aí a chegar. Só não estou certo de que sonhos com tantos filtros não sejam as ilusões que nos fazem cair mais depressa.

Mas venha ele, o ano novo, venha dois mil e dezanove carregadinho de ambições e desejos de todos, protegido contra quedas e desilusões como a capa que protege o telemóvel que nos guarda os gostos, as visualizações e as fachadas.

Às tantas, entre desejos tantos e incertezas tão poucas, estar vivo já será sempre um sucesso.