É chocante, como disse António Horta Osório esta terça-feira.

É chocante a resolução e é chocante o que ela nos custa.

É chocante que num banco intervencionado há quase três anos, onde o Estado tinha metido 1.100 milhões de euros, onde detinha 60% do capital e assento na administração, não tenha sido posível encontrar outra solução menos onerosa durante tanto tempo. Se as leis europeias não o permitiam houve mais do que tempo para o demonstrar e para se alterarem as regras.

É chocante que o Governo anterior não tenha cuidado do assunto. Se foi em nome de uma saída limpa do programa de assistência da troika, então tratou-se de um trabalho sujo.

É chocante que em nome da salvação do Banif se tenha aberto a porta da CPLP ao regime da Guiné-Equatorial e ao seu dinheiro, que tanto suja quem o oferece como quem o aceita. Para tudo acabar assim.

É chocante que nem o facto de o administrador do Banco de Portugal com o pelouro da supervisão ter transitado directamente da administração do Banif onde era, precisamente, o representante do Estado, tenha servido para alguma coisa. A perversidade das portas giratórias entre reguladores e regulados, um dos grandes problemas que o país tem para resolver, é que nunca funcionam a favor dos cidadãos contribuintes. É um grande azar, de facto.

É chocante que administradores e gestores do banco, Banco de Portugal e Governo anterior não tenham feito, não o possível mas o necessário para que este desfecho não acontecesse.

O Banif era, por toda esta circunstância, o banco mais vigiado e acompanhado do país. A sua fragilidade era conhecida há muito. Não é um caso extremo de polícia como o BPN nem de ocultação de contas como o BES. No Banif tudo foi, ou devia ser, muito transparente a partir do momento em que o doente foi dado como tal e as equipas clínicas se ocuparam do caso, seguras de que o resolveriam. Afinal o paciente morreu nas suas mãos e a factura que apresentam é pornográfica.

Já sabemos que todos actuaram zelosamente dentro das suas funções, que cumpriram todos os parágrafos e alíneas das leis nacionais e regulamentos comunitários, que elaboraram tantos planos de reestruturação quantos Bruxelas exigiu e chumbou, que devem ter feito imensas reuniões, preparado toda a documentação e preenchido todas as folhas de Excel necessárias. Tudo tão necessário e tudo tão inútil.

Desta vez nem sequer há, tanto quanto se sabe, banqueiros para meter na cadeia por terem praticado crimes, feito gestão fraudulenta ou desviado dinheiro. Se todos, de Lisboa a Bruxelas e do Funchal a Frankfurt, seguiram as regras e executaram o manual de emergência e o resultado é este, temos que ir à procura dos arquitectos e engenheiros que desenharam o projecto.

O que não podemos é olhar para isto como um azar, uma inevitabilidade.

Venham as auditorias externas e a PGR. Venham os deputados e a Comissão Parlamentar de Inquérito. Deixem-se de baixa política e apurem responsabilidades com seriedade. Responsabilidades políticas, regulatórias, legislativas, financeiras. O que é que a administração do Banif podia e devia ter feito e não fez? O que é que Pedro Passos Coelho e Maria Luís Albuquerque deviam ter feito e não fizeram? O que é que Carlos Costa devia ter feito e não fez? E a Comissão Europeia? Esta solução de resolução e venda é a que melhor defende os interesses dos contribuintes? Para onde se evaporou o dinheiro?

Já chega. Estamos fartos de ser feitos reféns da banca e sermos obrigados a pagar o resgate.

Outras leituras

  • Eis a casta, a elite da excelência, a profissão onde a mediocridade não entra. Segundo a avaliação do Conselho Superior de Magistratura, dos 362 juízes que temos nenhum, sublinho, nenhum é considerado “medíocre”. Nem uma excepção que confirme a regra. E apenas 20 são "suficientes”. O resto, a imensa maioria, é entre “bom” e “muito bom”. Nunca a expressão “juíz em causa própria” foi tão apropriada.