Quando falamos de violência sexual contra crianças no contexto da Igreja Católica (IC), os responsáveis desta instituição recusam-se a tomar uma posição séria e efetiva para resolver o problema que têm em mãos. No fundo, as suas ações protegem os abusadores e desrespeitam as vítimas. Se por um lado criaram as Comissões para a Proteção de Menores, por outro, será que salvaguardaram as condições necessárias para que as vítimas sentissem confiança e segurança para denunciar, uma vez que só receberam três queixas em dois anos? Diria que não. A Igreja Católica não se coloca ao lado das vítimas, nem demonstra ter o verdadeiro interesse em ajudá-las. Numa estratégia para evitar danos à IC, os responsáveis protegem os abusadores que dentro do seu contexto abusam e abusaram de milhares de crianças.

Em vez de assumir verdadeiramente o que é necessário para resolver este problema, a IC coloca obstáculos à sua resolução. Por exemplo, Américo Aguiar, Coordenador da comissão de prevenção e combate aos abusos de menores do patriarcado de Lisboa, considera fazer o levantamento retrospectivo dos casos de abuso sexual de menores com uma condição: desde que o mesmo não seja circunscrito à igreja católica. Em vez de abrirem as portas, num gesto de completa transparência, para uma investigação sem nada a esconder, colocam condições e entraves. A lógica é que se não foram os únicos, por que razão serão os únicos a “sofrer” com isso? É uma não-posição - algo que não é novo à IC.

Já em 2019, quando de Roma veio a orientação para se criarem as comissões, houve bispos que recusaram criar a comissão na sua diocese. O padre Manuel Barbosa, secretário e porta-voz da Conferência Episcopal Portuguesa, afirmou inclusive que na realidade portuguesa os casos eram “pouquíssimos”. É esse mesmo o argumento para defender a inação? Esta posição desvaloriza por completo o impacto que a violência sexual tem nas vítimas. A verdade é que um único caso de violência sexual contra crianças, é um caso a mais.

Recentemente em França, um “relatório de uma comissão independente estima que mais de dois mil padres e outros membros do clero francês abusaram sexualmente de 200 mil menores entre 1950 e 2020.” Será que por cá, a realidade é tão diferente assim que a IC portuguesa seja isenta do mesmo problema?

As palavras do Papa Francisco quando expressa “vergonha” não são suficientes. A vergonha e rezas não apagam o passado obscuro da IC, não resolvem o problema que têm em mãos, nem diluí a fraca posição que tomam. Sempre que a IC se recusa a tomar uma ação real, está a proteger os abusadores de crianças e está a dizer às vítimas que não adianta denunciar, porque a própria instituição não acredita nas suas palavras. Enquanto assim for, a IC não se liberta de uma estrutura abusadora que continua a proteger um ambiente onde é normal abusar sexualmente de crianças.