Para onde iria, através da floresta de Bryansk onde foi intercetado, o automóvel Renault com o suposto comando jihadista, depois de deixar o lugar da carnificina nos arredores de Moscovo?
O discurso oficial russo coloca-o em fuga para a Ucrânia. Parece pouco crível, tratando-se de uma fronteira de guerra, fortemente controlada e militarizada. O mapa da região mostra que a tranquila fronteira com a pró-russa Bielorrússia está igualmente no caminho.
Salta à vista o interesse do Kremlin em implicar a Ucrânia. O aparelho russo de propaganda está em crescendo de colocação de dúvidas sobre a reivindicação jihadista. Putin omite a reivindicação jihadista, aponta para cumplicidade ucraniana.
É facto que o autodesignado estado Islâmico (ISIS) foi declarado derrotado em 2019, após uma maciça campanha militar que até coligou russos e americanos, com alguns países europeus e árabes. O ISIS foi expulso da Síria e do Iraque, ficou devastado em Raqqa que exibia como capital.
O ISIS foi derrotado mas não ficou eliminado.
É sabido que o Afeganistão dos talibãs, depois da retirada ocidental a meio de agosto de 2021, voltou a ter territórios dominados pelos jihadistas. Surgiram, nos últimos dois anos, relatos de crescente presença de gente com bandeiras do ISIS no noroeste afegão: é o ISIS-K, em que K significa Khorasan, o antigo nome de uma vasta região de fé islâmica e que inclui parte do Turquemenistão e do Tajiquistão. Há relato de ataques de comandos kamikaze do ISIS-K em Cabul, com os talibã como alvo, e também está na memória o ataque (logo reivindicado) que em 3 de janeiro matou mais de 80 pessoas em Kerman, no Irão.
O monstro jihadista parecia domado, verifica-se que não está. Não é costume das diferentes versões do ISIS reivindicarem o que não fizeram.
Putin que se julga capaz de, através das armas de guerra, vencer o conflito da Ucrânia, vê-se dramaticamente confrontado com a vulnerabilidade russa perante a ameaça jihadista, por mais que a queira esconder.
A semente deste terrorismo multiforme não está apenas no Afeganistão. Há uma terra de ninguém que cresce do sul da Líbia para o umbigo da barriga da África Ocidental: no Mali, no Burkina Faso e no Níger caíram, um após outro, governos alinhados com a ONU e cooperantes com a NATO, e instalaram-se juntas militares golpistas que, perdida a cooperação com os mercenários Wagner, estão a deixar o terreno livre para metástases do ISIS.
O terrorismo jihadista é a mais complexa ameaça de segurança a toda a comunidade internacional. Talvez alguém na Rússia compreenda que teria a ganhar em criar condições para restabelecer pontes de cooperação com o Ocidente. Mas a Ucrânia parece ser um alvo do qual Putin, até ver, não se desvia.
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