Caso o planeta, a despeito da nossa clara renitência, persista em existir em 2022, Portugal irá receber as Jornadas Mundiais da Juventude. O evento, surpreendentemente, será acolhido por Lisboa. Já imaginaram um país com mais do que uma cidade? A descentralização constituirá heresia: possivelmente é vista como um cisma, do género do de Constantinopla. Deus é omnipresente no resto do Mundo católico, em Portugal não consegue passar além da CREL.

Tenho a certeza de que encherá os cofres à hotelaria e tenho todo o respeito pelo seu público-alvo. Lisboa estará repleta de jovens católicos, espero que a fazer coisas pouco católicas, e pessoas com chapéus esquisitos (mas não encapuzados, pois não estamos a falar das Jornadas Mundiais da Juventude Leonina). Agora, os jovens que virão a frequentar as JMJ provavelmente já terão nascido 2000 anos após Cristo. Pessoalmente se tivesse dezoito anos preferiria ir a um festival onde se escutasse uma música mais contemporânea. A meu ver, é um grande generation gap.

A escolha de Lisboa como anfitriã deste evento foi muito celebrada neste país laico que ultrapassou e se distanciou claramente do fascismo, que não mantém o fado como única referência musical associada à cultura nacional, que raramente dá atenção ao futebol e que pura e simplesmente ignora Fátima. Afinal, não podemos ignorar que somos liderados pelo crente Marcelo e pelo crente nele próprio, António Costa.

Os eventos são hoje a praia de Portugal, mais do que a própria praia. Portugal (leia-se Lisboa) tornou-se num país tão focado na produção de grandes acontecimentos que Manuel Alegre era menino para reformular o seu poema para “Trova do Evento Que Passa” (isto é, em troca de permitirem que Alegre organize um evento mundial de tauromaquia no Campo Pequeno – já que estamos numa de celebrar o obscurantismo).

Já há muito que a Igreja Católica devia a Portugal uma prenda como esta. Afinal de contas, fizemos questão de expulsar os judeus, tendo agora de lidar com o embaraço de ter uma série de pessoas com apelidos de origem portuguesa a fazer coisas de Primeiro Mundo na Holanda, por exemplo, porque nós fizemos o favor ao Vaticano de optar pelo atraso civilizacional (mas desenvolvendo, apesar de tudo, um enorme talento para montar palcos e casas de banho portáteis. Quem disse que ficámos a perder?).

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