Começou com um vídeo publicado no Facebook e rapidamente confirmado pelo Polígrafo. Funcionários da Câmara Municipal do Porto e agentes da polícia municipal foram filmados a remover pertences de pessoas em condição de sem-abrigo (é assim que agora os maluquinhos do politicamente correcto querem que se diga, porque é mais digno para os sem-abrigo, enfim). Tiram cartões e cobertores e, pelo que foi confirmado, é uma prática regular.
"Ao que tudo indica, os bens foram retirados do espaço público sem qualquer tipo de aviso prévio, acção que tem lugar em vários locais da cidade", diz o Polígrafo. É melhor assim, de surpresa, para a polícia não ter ainda que aturar os sem-abrigo a chorar e a dizer "esse bocado de cartão é a minha casa, por favor, não me leve isso".
Desculpem se sou insensível, mas quem dorme num cartão também dorme no chão. E o cartão dá um aspecto horrível a quem passa, bem como aquele amontoado de pertences a que os sem-abrigo chamam de casa. Mais, se é para sem-abrigo, é mesmo sem qualquer abrigo, não precisam de nada.
Calma, eu entendo que deva ser chato viver na rua, lidar com a violência, a fome, a solidão e tantas vezes com problemas como adições ou doenças mentais. Mas é de uma tremenda falta de altruísmo e sentido cívico que os sem-abrigo não entendam o mau aspecto que dão às cidades e como isso pode afectar os negócios, principalmente o turismo. Ninguém quer vir a Portugal ver pobreza, pois não? Claro que não. E, assim sendo, é perfeitamente compreensível que a Câmara do Porto tenha de pôr os pratos na balança entre arranjar soluções a sério para os sem-abrigo, e tirar-lhes as coisas, mas deixá-los na rua abandonados à sorte. A primeira opção custa dinheiro, a segunda traz um turista que não vê sem-abrigo ficando mais feliz e gasta mais dinheiro. Já não faltará muito para os turistas regressarem em massa, e se o lucro não estiver à frente da condição humana, então não poderemos nunca almejar o progresso.
Uma coisa que pode ter causado estranheza é a reacção de algumas pessoas a estes factos, a esta limpeza de sem-abrigo para sujar a vista de quem passeia. Muitas pessoas, a qualquer notícia relacionada com o acolhimento de refugiados em Portugal, reagem com grande intempestividade e gritam (ou escrevem em "caps lock"): Primeiros os nossos! Temos é de salvar os nossos sem-abrigo, não é de acolher esses larápios! (Vou-me abster de colar aqui palavras mais fortes que por vezes usam.) Só que estas mesmas pessoas estão estranhamente caladas. É possível que tenham a internet em confinamento e venham indignar-se assim que puderem.
Seja como for, grande medida da CMP e que assim continue. Talvez não seja má ideia também pôr barras de espinhos, como aquelas para pombos, em locais da cidade frequentados por sem-abrigo, para ver se vão os arredores e ficam ainda mais longe da vista do que importa: o dinheiro.
Sugestões mais ou menos culturais que, no caso de não valerem a pena, vos permitem vir insultar-me e cobrar-me uma jola:
- Silêncio na Era do Ruído: um livro mesmo muito bonito de Erling Kagge.
- Porque é que Marx Tinha Razão: sejam de esquerda ou de direita, ou concordando-se ou não com Marx, é um livro muito informativo e escrito com bastante piada.
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