Ninguém poderá, por esta altura, estimar com elevado grau de certeza como será a nova composição do parlamento e o equilíbrio de poderes após as eleições legislativas que se aproximam. A julgar pelas sondagens, as eleições de 4 de outubro podem ser as mais renhidas da nossa democracia. É possível, contudo, que à medida que nos aproximemos da data das eleições, a diferença entre candidatos nas sondagens aumente. Eventualmente – e os recentes casos da Grécia e do Reino Unido ilustram-no bem – o voto nas urnas fechadas pode revelar um resultado bem díspar do previsto. Com efeito, é possível prever que o eleitorado comece a pensar onde quer estar no dia 5 de Outubro e pondere o modo como o seu voto pode ter consequências políticas.

A replicar-se o cenário das sondagens, que têm demostrado com relativa clareza que a maioria absoluta é quase inatingível nestas eleições, acordaremos no dia 5 de outubro para uma potencial crise de governabilidade, face aos difíceis entendimentos entre forças partidárias para fazer passar o programa de Governo e os orçamentos de Estado.

Mas as sondagens nada nos dizem sobre um tema incontornável nestas eleições: a abstenção. É sabido que, nos últimos escrutínios eleitorais, a taxa de abstenção tem registado aumentos consideráveis, tendo-se cifrado em quase 42 por cento nas últimas eleições legislativas, bem acima da percentagem de votos que os dois partidos do “arco da governação” arrecadaram. Em 2011, PS e PSD juntos agregaram apenas 38.7 por cento do eleitorado inscrito. São sinais inequívocos do profundo descrédito em que mergulharam as forças partidárias.

Há, contudo, poucas razões para que os partidos se preocupem com esta questão. Como refere Wattenberg (2000: 76), a “saída” dos cidadãos da participação política não é necessariamente má para governantes: permite-lhes obter mandatos com menos votos. O afastamento do eleitorado, permite aos agentes políticos ganhar maior autonomia e liberdade de acção, uma vez que implica menor responsabilização e prestação de contas ou, pelo menos, perante menos cidadãos.

O ciclo vicioso que daqui emerge é uma ameaça para a qualidade da democracia, na medida em que esta depende da participação dos cidadãos. Cidadãos distantes exigem menos informação por parte de governantes; mas menos informação acentua a tendência de afastamento e desafeição do eleitorado relativamente à política.

Mais importante do que identificar a origem deste padrão é corrigi-lo. Tornar processos políticos mais transparentes é uma forma de incentivar uma maior participação. Por exemplo, e a um nível básico (mas importante), tal transparência requer tornar o debate político mais claro para os cidadãos – adoptando, por exemplo, uma linguagem menos técnica e que tenha em conta a desigualdade de recursos (educacionais e económicos) da sociedade portuguesa.

As condições de governabilidade, a escolha dos pacotes de políticas públicas, e a manutenção da qualidade da nossa democracia alimentam-se (também!) do boletim de voto e não de sondagens. É o voto que vai determinar onde estaremos no dia 5 de outubro de 2015.

Patrícia Silva é politóloga e investigadora em Ciências Políticas do Departamento de Ciências Sociais, Políticas e do Território da Universidade de Aveiro