É em São Paulo que se concentra a sede das principais empresas, dos bancos e onde são diariamente fechados negócios para impulsionar a economia brasileira. A cidade conta com mais de 12 milhões de habitantes - Portugal possui pouco mais de 10 milhões. Se considerarmos a região metropolitana de São Paulo o número ultrapassa os 20 milhões de habitantes. Líder de pelotão da economia do país, a cidade funciona num ambiente culturalmente multifacetado onde, por exemplo, se consome mais de 570 mil pizzas por dia - perde apenas para Nova Iorque. No dia 20 de Abril deste ano, os paulistas viram sua cidade bater mais um recorde: foram 317 km de lentidão no trânsito durante a hora de ponta, perante uma frota de oito milhões de veículos.

Isto explica o facto de que, a cada minuto, um helicóptero aterra ou descola na cidade. É a maior frota deste tipo de aeronaves no mundo. Em São Paulo, quem tem dinheiro, voa. Quando a fome aperta, são 12 500 restaurantes que garantem à cidade o título de must-go gastronómico internacional. Encontra-se de tudo: cozinha tailandesa, síria, japonesa, vietnamita, grega, italiana, portuguesa e tantas outras. O movimento dos restaurantes cresce à medida a que as mais de 200 peças em cartaz nos teatros da cidade terminam as suas exibições. Tudo é grandioso. O orçamento da autarquia, também. Para o exercício de 2016 ascendeu a 54 mil milhões de reais (algo como 15 mil milhões de euros).

Desde a implantação da Nova República, em 1985, quando se colocou fim ao Regime Militar, que os prefeitos, nome pelo qual no Brasil se designam os presidentes de câmaras municipais,  são eleitos pelo voto. Antes eram indicados pelo governador do Estado. De lá para cá passaram-se 31 anos e o PT conseguiu chegar ao poder em São Paulo em três oportunidades. Não é pouca coisa, foram 12 anos de governação, mais de 1/3 do tempo. A primeira vitória veio com Luiza Erundina, a segunda com Marta Suplicy e a terceira com o atual autarca, Fernando Haddad. As sondagens sugerem que este não será reeleito porque enfrenta uma rejeição gigantesca, assim como aconteceu antes com as suas antecessoras de partido. Isto interfere diretamente nos ânimos do PT que vinha a acreditar na recuperação de sua imagem a partir de uma vitória em São Paulo.

Não contavam com a acusação contra Lula antes das eleições. Esta chegou num momento em que o partido investia fortemente na estratégia de reação ao impeachment de Dilma com base no discurso do golpe. Acreditavam, ainda, que isso estava a agitar setores da sociedade e forças de esquerda dispersas durante o desgaste provocado pelas últimas delações e que voltariam, assim, a unir-se. O PT sempre apostou na figura de Lula como capitão das suas estratégias e cabo eleitoral imbatível, quase uma entidade divina. Há meses que Lula revelava a interlocutores próximos a sua disposição de voltar ao Palácio do Planalto em 2018. Foi com esse espírito que começou a repetir em público que a sua candidatura à Presidência seria uma respostas àqueles que tentavam destruir o PT. Era tudo o que o partido, manco de opções, precisava para sonhar em manter-se no poder. Só faltou combinar com os russos. Como não combinaram, a bomba caiu nos seus colos na forma da nomeação de Lula para o banco dos réus.

Não há Plano B, como afirma o próprio PT. Não existe um nome de peso no partido que possa substituí-lo. As eleições de São Paulo, caso confirmem a derrota da reeleição de Fernando Haddad, conforme indicam as sondagens, podem ser o epílogo de um dos capítulos mais tristes da história brasileira, escrito com mentiras, desvios de dinheiro e sonhos megalómanos de perpetuação no poder. Lula vai valer-se dos palcos nas campanhas municipais pelo país para se defender, vai atacar o Ministério Público Federal e reforçar a ideia de que está a ser perseguido politicamente. Fará isso aos quatro ventos, dentro e fora do Brasil e é muito provável que ajude vários autarcas com o seu carisma. Caso consiga mudar o rumo das eleições de São Paulo, onde o seu candidato amarga no quarto lugar das intenções de voto e é reprovado por sete em cada dez eleitores, a história ainda terá o capítulo dos milagres. Até lá, há muito por escrever.