Continua a haver quem use as caixas de comentários na web para desprezar e até tentar ridicularizar o papel da obstinada adolescente Greta. Mas o que ela consegue, de Nova Iorque a Sydney, passando por Londres, Hamburgo ou Manila é a mobilização que cientistas e dirigentes associativos não conseguem: colocar a crise climática no topo da agenda política, fazer dela uma preocupação séria das pessoas e forçar a tomada de decisões políticas. É legítimo que nos interroguemos sobre a capacidade para empenho e estudo de uma miúda com 16 anos. Ela escapa a todos os modelos nesta idade. O que diz perante gente de todas as gerações é consistente. Tem oratória que explica de modo simples, contido, credível o que tantos cientistas expõem sem serem escutados. Greta é, indiscutivelmente, um fenómeno. Carrega às costas uma mochila com mensagem poderosa e pesada responsabilidade. Vai conseguir continuar a aguentar tão forte exposição pública sem sucumbir à pressão?

O que é facto é que ela consegue uma eficácia de mobilização contínua que supera qualquer campanha pensada por experientes publicitários. Há um “efeito Greta” no “Green New Deal” que está no programa de ação da próxima presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen. Também há o “efeito Greta”, reforçado pela pressão de manifestações em 575 cidades e vilas da Alemanha - um recorde -, na decisão de aprovar o ambicioso Programa 2030 para Proteção do Clima, tomada pela grande coligação, formada por cristãos sociais e social democratas, que governa os alemães. É um impulso para a Cimeira sobre o Clima que António Guterres convocou para esta segunda-feira, na sede da ONU, em Nova Iorque, sob a palavra de ordem “chega de discursos, passemos à ação.”

A coligação liderada por Angela Merkel decidiu injetar 54 mil milhões de euros nos próximos quatro anos nesse plano de incentivos para uma economia verde, sustentável e amiga do clima. Merkel anunciou este plano numa conferência de imprensa em Berlim em que começou por saudar e citar Greta Thunberg: “unidos em torno da ciência”.

As medidas decididas pela Alemanha e publicadas nas 130 páginas do “Programa 2030” visam a drástica redução em 55% até 2030 das emissões de dióxido de carbono (CO2), através da intervenção nos setores da energia, indústria, construção, habitação, agricultura e, sobretudo, transportes. O programa incentiva o uso do comboio (baixa substancial no preço das viagens) em vez do avião (voos internos mais caros). As redes de transportes urbanos serão requalificadas e também terão preços mais reduzidos. Estão anunciados estímulos para que a frota automóvel seja, por um lado, diminuída, e por outro, formada por veículos com motor elétrico. É um plano gigantesco que pode ajudar a Alemanha a evitar a recessão – com contágio à União Europeia.

A notoriedade conseguida por Greta contribuiu para esta tomada de decisões e, também, para a cimeira global que António Guterres, como secretário-geral da ONU, convocou para esta segunda-feira em Nova Iorque. O caderno de encargos define que o pretendido é que cada país apresente medidas concretas para o combate à crise climática, cada vez mais séria.

A mobilização geral dá-nos esperança. É possível defendermos e melhorarmos a qualidade de vida mudando o estilo de vida, modificando o modo como as coisas são produzidas e consumidas. Todos nós temos de sair da inércia perante a crise climática. A geração Greta está a puxar por nós.

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