Tim Cook conseguiu um feito que não lhe pode ser negado: o facto de ter elevado o valor da Apple para perto dos 3 biliões de dólares (aqui o bilião é o da escala longa, com doze zeros). É um número tão astronómico e raro que é fácil cair na confusão. Ainda assim, parece que muito desse mérito teve que ver com a capacidade do CEO da Apple em gerir a relação da gigante tecnológica com a China (gigante de tudo o resto) e não tanto com a inovação per se.
Porque isto não é só a questão dos muitos produtos que lá são fabricados, passa muito também pelos que lá são vendidos. E, neste capítulo, os últimos meses deram a Cook razões para sorrir ou não tivesse a Apple registado um crescimento anual de 83% nas vendas no quarto trimestre — que asseguram a posição de líder, sendo o smartphone de eleição de quem aprecia gastar pequenas fortunas nestes aparelhos de alta cilindrada na segunda maior economia do mundo (também por culpa dos problemas da Huawei neste segmento e mérito, claro, do iPhone 13).
Ainda assim, além do sucesso do último modelo do seu telemóvel, podem existir outras nuances que merecem ser consideradas. Segundo uma investigação recente do The Information, que cita fontes anónimas com conhecimento do processo e documentos internos da Apple, Tim Cook terá "cozinhado" uma relação estreita com o Governo chinês que pode ajudar a explicar este gordo crescimento da empresa na China.
O que está em cima da mesa e no cerne da investigação é um memorando de 1.250 palavras. No documento, segundo aquela fonte, é possível perceber que o CEO quis contornar os problemas burocráticos que as entidades reguladoras do regime chinês ameaçam impor aos produtos da Apple (mais concretamente App Store, Apple Pay ou iCloud) e que já estavam a prejudicar (afundar) as vendas do iPhone.
Neste sentido, para se livrar destas restrições, Cook terá viajado em 2016 à China para vincular um acordo de cinco anos (com possibilidade de se estender até um sexto ano) que contempla investimentos, negócios e formação no país. De forma sumária, o que investigação nos diz é que:
Tim Cook (alegadamente) acertou um "negócio" no valor de 275 mil milhões de dólares com Pequim para evitar que a Apple fosse prejudicada no país (para se ter noção dos valores implicados, refira-se que o montante em questão é superior ao PIB português em 2020);
Neste acordo, ficou celebrado que a Apple ia investir "muitos mil milhões de dólares" na China e que ia ajudar a formar empresas chinesas de modo a que estas criassem "as mais avançadas tecnologias";
A China ameaçou reprovar o Apple Watch caso a Apple não aumentasse o tamanho de umas ilhas inabitadas (que disputa com o Japão) no Apple Maps (as ilhas em questão são Ilhas Diaoyu ou Ilhas Senkaku).
Segundo a The Verge, estes dados avançados pela The Information parecem legítimos, pois vão de encontro à conclusão de um relatório da Counterpoint Research (que sugere que a Apple superou a Xiaomi enquanto líder do mercado dos smartphones na China), além de já ter sido noticiado que a tecnológica construiu Unidades de I&D (instituições de investigação públicas ou privadas, sem fins lucrativos, que se dedicam à investigação científica e desenvolvimento tecnológico) na China e de Cook ter anunciado em 2016 um investimento de mil milhões de dólares na startup chinesa Didi Chuxing.
Depois da investigação vir à tona, veio a defesa do acordo por parte da China. Segundo o site Apple Insider, através de um tablóide controlado pelo regime chinês, que apelidou a notícia como sendo um ataque "politicamente correto" de sinofobia com recurso a uma peça de "macarthismo". Já a Apple escusa comentar o assunto (e vários foram os meios de comunicação a tentar).
Quanto à opinião de Tim Cook, bem, este já tinha comunicado num fórum em novembro que a Apple tem a "responsabilidade" de vender os seus produtos onde for possível. E a China, está mais do que visto, não é exceção.
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