Há quem se lembre de momentos muito específicos, há quem recorde novos hábitos que a internet trouxe, há quem tenha dificuldade em escolher uma memória - porque são tantas. Mas, na soma das 26 respostas à pergunta "qual é a tua primeira memória de internet", temos um espelho que como ela, a internet, mudou a vida de todos nós.

A geração que se lembra do "antes da internet". A geração miRC. A geração dial-up. A geração Magalhães. A geração "tudo o que precisas está na internet". A geração YouTube. A geração redes sociais. A geração "ovo" do Instagram. A internet não é a mesma para todos, mas juntou todas estas gerações num mesmo espaço comum.

"apesar de a 14 mil quilómetros de distância de Lisboa, escutava a rádio que me tinha enviado a Timor"

Nos hoje arqueológicos anos 80 do século XX, enquanto Tim Berners-Lee aprontava a criação da estrutura física da teia de aranha global digital, Reagan era o “grande comunicador” dos EUA e Gorbachev liderava a revolução que iria estilhaçar o império soviético; Walesa, apoiado pelo papa Wojtyla, era ponta de lança para o derrube do Muro; Mandela continuava preso pelo apartheid mas cada vez mais perto de libertar a África do Sul e fazer daquele país exemplo para o mundo; Madonna cantava “Like a Virgin” e Spielberg realizava filmes como ET e Os Salteadores da Arca Perdida; em Portugal, coabitavam Soares e Cavaco, Jorge Palma cantava Deixa-me Rir e os Xutos tinham o Homem do Leme.

Nesses anos 80, este jornalista então de colheita recente, já era viciado em jornais do mundo. Todos os fins de tarde em Lisboa ia a um quiosque dos Restauradores para comprar três jornais da manhã que só por volta das 8 da noite chegavam a Lisboa: The Guardian, Libération e La Repubblica. Hoje, porque há a internet, leio-os ainda antes de chegarem às bancas das cidades onde são feitos – mas, às vezes, ainda que seja cada vez mais um luxo, continuo depois a procurar a edição em papel.

Também nessa década, mais para o fim, ano 88, nos meses de janeiro e fevereiro percorri centenas de quilómetros à volta de Lisboa para, noite a noite, perceber no auto-rádio onde chegava o sinal de teste do emissor em Monsanto da rádio (a TSF) que iria começar a emitir no dia que fazia o ano ser bissexto. Havia um problema: a cobertura daquele emissor não chegava a Colares nem a Setúbal, muito menos a Sesimbra. Uma dúzia de anos depois, aterrei em Dilí, para a reportagem da assombrosa luta de libertação de Timor. Pouco depois de aterrar, na estrada do aeroporto até à capital timorense, por entre centenas de casotas ainda fumegantes pelo fogo terrorista, ao ligar a parabólica portátil, tocou-me uma emoção extra a todo aquele entorno que me comovia: apesar de a 14 mil quilómetros de distância de Lisboa, escutava a rádio que me tinha enviado, a Antena 1 , como se estivesse no estúdio em Lisboa. Porque a internet eliminava a distância.

Francisco Sena Santos, jornalista

"Eram tempos em que não havia redes sociais como as conhecemos agora, em que muito descobríamos sobre o íntimo da pessoa, mas sem fazermos a mínima ideia de como fisicamente seriam"

Internet para este jovem não era bem Internet em si. Internet, em toda honestidade, era falar com estranhos nas salas de chat do mIRC ou então abusar da dita ferramenta para dar continuidade às conversas surgidas em pessoa na praia. É certo que também fazia uso deste recurso em tempos de chuva e Inverno, mas vasculhando os recônditos da memória, é disto que me lembro. Das conversas até altas horas da madrugada com namoricos de verão ou discussões de filmes com estranhos. Eram tempos em que as SMS eram pagas, os telemóveis uns tijolos e nem todos tínhamos um. Eram tempos em que não havia redes sociais como as conhecemos agora, em que muito descobríamos sobre o íntimo da pessoa, mas sem fazermos a mínima ideia de como fisicamente seriam. Muitos conheciam o NY152, mas poucos ou nenhuns sabiam se o Abílio era gordo, magro, baixo ou alto. Era uma Internet muito ingénua e impensável nos dias de hoje, mas que, para mim, não deixa mesmo assim de ter bem mais encanto do que navegar na atual, onde tudo é é polarizado e tudo o que se diga ou opine só servirá de arma de arremesso num futuro que nos parecia esquecido.

Abílio dos Reis, jornalista

"O email não é “a internet” mas é a minha primeira memória de como a internet mudou a minha vida"

O email não é “a internet” mas é a minha primeira memória de como a internet mudou a minha vida. Algures nos anos 90, aquele primeiro endereço de email profissional foi simultaneamente a promessa (errada) que tudo seria mais rápido quando precisasse obter respostas e a realidade (mais ou menos certa) que podia escrever para quem me apetecesse e quando me apetecesse sem precisar de passar pelo processo milenar da carta. Mais tarde percebi que o provérbio chinês fazia sentido. No meio de uma grande alegria não prometas nada a ninguém e no meio de uma grande fúria não respondas a nenhuma carta – a instantaneidade da internet pode ser especialmente problemática com a segunda, mas também pode tantas outras coisas.

Rute Sousa Vasco, jornalista

"A chegada da internet a casa foi aquilo que se sabe na minha geração: um barulhinho estranho para ligar"

A chegada da internet a casa foi aquilo que se sabe na minha geração: um barulhinho estranho para ligar, cabos por todo o lado, alguém a gritar porque já chegava. Contudo, vivendo eu numa zona onde, ainda hoje, as tecnologias me dão problemas, não foi em casa que fiz as primeiras memórias da utilização deste mundo onde agora passo (passamos!) os dias.

Na escola primária, a utilização de um computador gigante, arrumado num armário cinzento de metal, era uma das tarefas frequentes. Há pouco tempo encontrei uma das folhas da avaliação de final de período: numa letra bonita e redondinha, a professora escreveu que eu dominava a utilização do dito bicho e da internet. E como não haveria de o fazer? Tudo o que eu queria era passar lá mais um bocadinho, para conseguir procurar o máximo de países, animais, cores e o que mais existisse no jogo do STOP. Todos queríamos ganhar depois, não era? Então havia que pesquisar e decorar tudo o que nos fosse possível, na escola onde a internet não falhava e onde a mãe não gritava pela conta do fim do mês.

Alexandra Antunes, jornalista

"A Internet tinha - e tem! - isso: alguém parece sempre disposto a partilhar algo que, mais tarde ou mais cedo, outra pessoa poderá 'precisar'"

Com 16 anos aprendi a tocar guitarra - sem professores, sou um autodidata, o que também se reflete na qualidade com que "arranho" o instrumento - e a Internet era já uma base de dados inesgotável de músicas com acordes que me fez encurtar o tempo de aprendizagem de "clássicos" como o "Anzol" ou o "Restolho" (quem não tocou Mafalda Veiga que atire a primeira pedra). A Internet tinha - e tem! - isso: alguém parece sempre disposto a partilhar algo que, mais tarde ou mais cedo, outra pessoa poderá "precisar". A expressão "se existe, está na Internet" só pode ter nascido no momento em que alguém quis descobrir os acordes de "My Wonder Moon", dos Hands on Approach e outra pessoa já os tinha colocado online. Só pode.

João Dinis, produtor executivo

"Hoje seria impossível que se deitasse no lixo num fim-de-semana todo o jornal de segunda-feira a pensar que eram restos de papel"

Lembro-me de quando chegaram os computadores às redacções, isso sim, uma coisas enormes e gordas, pesadonas, que ao mais leve abanão nos faziam perder textos de cinco mil, dez mil caracteres, que tínhamos de voltar a escrever de memória. Era assim no Semanário Económico em 1989 ou 1990 - os jornais era feitos numa sala de "maquetagem", os textos (tal como os filets e todas as restantes marcas de página) impressos em colunas em folhas A4, recortados com X-acto e colados com spray na folha de jornal (template), cujas provas eram depois entregues na gráfica. Quase 25 anos depois estava numa redacção em que cada pessoa tinha dois ecrãs, um para escrever, outro para pesquisar (ficava doida, pedi logo que me desligassem um deles, sempre com o cursor a fugir sabe Deus para que nuvem) e a escrever directamente em página, ou seja, no local onde a notícia seria publicada no papel. Hoje seria impossível, como aconteceu no Diário Económico, que uma empregada de limpeza deitasse no fim-de-semana todo o jornal de segunda-feira no lixo, convencida de que se tratava de restos de papel.

Isabel Tavares, jornalista

"já está no patinho"

Nos inícios de 2000, a Rute ganhou um lugar cativo na garagem que era o meu estúdio em Algés, com uma secretária vermelha junto à única janela, que na realidade não era janela mas o portão com grade e vidro fosco. Uma verdadeira e literal empresa de garagem. Aí começou o que viria a ser anos mais tarde a MadreMedia. A  partir daquela secretária vermelha entalada entre a porta de entrada e o pano preto que fechava a parede infinita (ciclorama) do estúdio íamos fazer uma grande empresa de conteúdos digitais. As minhas fotografias, os maravilhosos textos da Rute, e os "filmes" que mais não eram que infografias muito simples animadas num software chamado flash da empresa Macromedia que a Adobe haveria que comprar, nada nos ia parar ... a não ser o "dial up", o somzinho característico dos modem de  ligação à internet. Havia uma grande diferença entre o que conseguíamos fazer no ecrã do Macintosh e o que conseguíamos publicar online. No estúdio havia CDs de instalação de todos os serviços de internet; experimentei tudo, Clix, Oni, Jazztel, Netcabo, Sapo. Mas nada chegava para aquilo que estávamos a tentar fazer - hoje muito simples e quotidiano, na altura um verdadeiro quebra-cabeças.

Até que um dia o Luis Ribeiro, na altura administrador da PT Multimédia, numa entrevista, nos diz que há um serviço novo como o nome ADSL que resolverá os nossos problemas. "Vocês têm que experimentar isto!". E, uns dias depois, lá foi um técnico da PT à garagem e uns cabos e furos depois, umas caixas e um telefone novo, temos o dito ADSL a funcionar. E - uau - as páginas carregam realmente ao toque do rato, deixamos de ver a maldita barra azul a indicar que a página está a carregar, o conteúdo simplesmente aparece e até dá para fazer uploads sem a ligação cair.
O barulhinho do "dial up" passa à história. Temos a internet sempre ligada. Foi a minha primeira experiência de algo que se viria a tornar normal nos nossos dias.

Sentia-me na NASA, passámos inclusivamente a enviar artes finais para imprimir em gráficas por FTP uma tecnologia de partilha de ficheiros com programa chamado Cyberduck, cujo icon é um patinho amarelo. Adeus aos CD-Rom gravados à duas da manhã.

Foi o Luis Ribeiro que nos salvou ao colocar-nos num grupo de clientes piloto daquela tecnologia, o que permitiu a uma pequena empresa com muito de start e pouco de up ter aquele serviço. Obrigado Luis.

Nota: de todos os softwares, o Cyberduck foi único sobrevivente e que ainda hoje usamos para enviar programas para a televisão, daí o meu telemóvel estar cheio de mensagens trocadas que dizem geralmente o mesmo em forma de interrogação ou afirmação: "já está no patinho".

Paulo Rascão, fotógrafo e realizador

 

"A internet, para mim, era o andar de cima da casa dos meus pais, lugar onde pernoitavam as meninas dos meus olhos, a PlayStation e o computador comunitário"

A internet, para mim, era o andar de cima da casa dos meus pais, lugar onde pernoitavam as meninas dos meus olhos, a PlayStation e o computador comunitário, e para onde eu pedinchava para ir fazer não sei bem o quê durante não sei quanto tempo para depois ouvir a minha mãe ralhar sobre a fatura que ia aparecer no fim do mês. Mais tarde, a internet veio a ser o cybercafé nas férias do Algarve, para onde eu, os meus primos e o meu irmão nos escapulíamos durante as longas horas da digestão. Nos primeiros anos em que a conheci, via a internet como um local de liberdade para onde ansiava fugir, pela qual iniciava longos debates com os adultos à conquista de mais minutos à frente do ecrã, antes de haver estas 'modernices' de pacotes ilimitados. Para mim a internet sempre foi um lugar e olhando agora de cima, não é estranho que também se tenha tornado no meu local de trabalho.

Tomás Gomes, jornalista

"Sei de ser pequeno e de ter computadores velhos, que o meu pai me dava para explorar. Matei vários assim"

Não sei ao certo qual a minha primeira memória na internet. Sei de ser pequeno e de ter computadores velhos, que o meu pai me dava para explorar. Matei vários assim, examinando-os cientificamente até que deixassem de funcionar, contaminados com alguma doença digital ou rebobinados de tal modo que começavam a questionar se eram um desktop ou um robot de cozinha. Pelo meio, descobri o SketchUp, passando a assassinar computadores com a memória cheia de modelos ridículos, equipados com peças descarregadas da internet, numa espécie de Sims Nerd com mobília virtual do IKEA.

Pedro Botelho, jornalista

"E ainda hoje, cerca de 9 anos depois, somos todos grandes amigos, muitos deles de Aveiro e outros tantos de Lisboa"

Lembro-me de jogar online e encontrar sempre o mesmo rapaz, começamos a falar cada vez mais até que resolvemos entrar em chamada Skype. Fomos conhecendo mais pessoas e o grupo foi crescendo até que ficamos cerca de uns 15. E ainda hoje, cerca de 9 anos depois, somos todos grandes amigos, muitos deles de Aveiro e outros tantos de Lisboa. Combinamos grandes fins de semana todos juntos graças à internet. Ou seja, a minha memória é mais o crescimento deste grupo que começou online e agora é um misto entre online e off-line.

Pedro Santos, editor de imagem

"A minha geração deve ter sido a última a ouvir a internet dial-up a fazer uma cacofonia de sons à medida que ligava"

Não era rock industrial, mas aquele crepitar atonal era música para os meus ouvidos. A minha geração deve ter sido a última a ouvir a internet dial-up a fazer uma cacofonia de sons à medida que ligava. Tal como um portão mágico rangendo na sua abertura para nos levar a mundos infinitos, o final da algazarra significava a disponibilização de um portal de possibilidades infindáveis à distância de um clique.

António Moura dos Santos, jornalista

"Um dos momentos mais marcantes para mim como utilizadora da Internet foi mostrar à minha avó o Google Earth"

Um dos momentos mais marcantes para mim como utilizadora da Internet foi mostrar à minha avó o Google Earth. Ela, que tinha deixado Angola há quase 40 anos por causa da Guerra Colonial, de repente conseguiu ver a rua onde morava na altura

Catarina Marques, produtora de conteúdos

"Eles dominavam as siglas todas (ddtc, incluída)"

Algumas das minhas primeiras memórias com a Internet têm muito de comum com quase tudo o que era novidade: em casa dos primos e dos amigos nas férias e ao fim de semana (lá em casa tudo chegava mais tarde). Lembro-me de ir para casa deles, puxar uma cadeira e sentar-me a vê-los conversar alegremente com desconhecidos (falo do mIRC, claro). Eles dominavam as siglas todas (ddtc, incluída), às vezes eu aventurava-me - mas tinha claramente pouca destreza -, e passávamos noites nisto. Era um entusiasmo.

Margarida Alpuim, jornalista

"Ir à Internet era uma visita de estudo"

No final dos anos 90 éramos uma turma à volta de um computador. A novidade tinha chegado a uma das escolas da vila. A rede, ali, era feita de cadeiras e cabeças a espreitar para um ecrã. Ir à Internet era uma visita de estudo.

Rita Sousa Vieira, jornalista

"o facto dos ingleses estarem fartos de verem ano após ano músicas do X Factor no top natalício provocou uma mobilização - através do ainda novo Facebook - para descarregar a canção da banda de Zack de La Rocha, levando-a até ao #1"

Recordo como marcante o primeiro lugar de "Killing in The Name" dos Rage Against The Machine, uma música de rap-rock político de 1992, no top de músicas de Natal de 2009. A música é de 1992, mas o facto dos ingleses estarem fartos de verem ano após ano músicas do X Factor no top natalício provocou uma mobilização - através do ainda novo Facebook - para descarregar a canção da banda de Zack de La Rocha, levando-a até ao #1. Para além do absurdo que é ter uma música que nos diz "some of those that work forces / are the same that burn crosses" (algo que se calhar nos pareceria à época radical e que hoje sabemos ser verdade), foi a prova de que os media mainstream começavam a deixar de ter tanto poder.

Manuel Cardoso, humorista

"Nos primeiros dias fora, lembrei-me de testar a funcionalidade Facetime no meu iPhone para ver se ainda reconhecia a minha família"

A maior parte das pessoas ficou fascinada com as videochamadas durante a quarentena, mas para mim o fascínio aconteceu quatro antes. Estávamos em 2016 e ia pela primeira vez estudar para fora e estar afastado de família e amigos durante um largo período de tempo. Já usava regularmente as plataformas de mensagens mas arrisco dizer que nunca tinha feito uma videochamada antes. Nos primeiros dias fora, lembrei-me de testar a funcionalidade Facetime no meu iPhone para ver se ainda reconhecia a minha família. Não me lembro da conversa, mas lembro-me de pensar "Afinal, isto não vai ser assim tão díficil".

Miguel Magalhães, produtor executivo junior

"Normalmente, optava sempre por aqueles jogos de vestir a roupa às miúdas ou o clássico Bubbles"

Na altura em que eu, com os meus 6 anos, vibrava com o enredo da mítica série de adolescentes e todas as temporadas tinha um site diferente com os teasers dos episódios, um separador com informações e resumos das personagens e, mais para as últimas, incluíam jogos e quizzes daqueles com o título "Descobre que personagem dos Morangos com Açúcar 4 - Série de Verão tu és". Passava horas a ler o site de uma ponta à outra e cheguei mesmo a escrever fanfics baseadas nas personagens. Ah, e mais esta, ainda a antes de ter computador em casa. Ia nos intervalos para a biblioteca da escola e levava uma cábula que tinha sempre na carteira que dizia "jogos10 e miniclip". Era os sites que conhecia e onde a minha mãe me deixava ir para jogar. Normalmente, optava sempre por aqueles jogos de vestir a roupa às miúdas ou o clássico Bubbles.

Mariana Santos, produtora de conteúdos

"Toda a gente na escola tinha um azulinho e eu achava que era uma moda rápida"

Lembro-me muito bem do primeiro contacto com a Internet. Foi com o Magalhães. Toda a gente na escola tinha um azulinho e eu achava que era uma moda rápida. Agora sei que era uma medida do Governo de José Sócrates. Depois vieram as capas com padrões e jogos com pinguins que saltavam, como o jogo do Super Mario, mas num cenário gelado. A minha relação com a Internet começou nesta vertente mais lúdica e só depois, nas aulas, todo o 4ºA testava pesquisar o que queria naquele pesado portátil com 1Gb. Foi há onze anos. Eu tinha uns tenros dez. Depressa todos estes portáteis se avariaram e a próxima memória que tenho é de, com os meus amigos, usar um programa nos computadores fixos da biblioteca da escola para criar música. Sacávamos ficheiros mp3 de sites, no mínimo, manhosos e alterávamo-los a gosto. Só agora me apercebo de que a minha experiência em edição áudio começou no 5º ano. O que já lá vai...

Magda Cruz, jornalista

 

"O Youtube foi algo que delineou os conteúdos que comecei a ver. Os remix de autotune ( "aint nobody got time for that" e o "hide your kid hide your wife") foram um deles"

Houve vários momentos em que a internet me marcou. Por ser um millennial, o Youtube foi algo que delineou os conteúdos que comecei a ver. Os remix de autotune ( "aint nobody got time for that" e o "hide your kid hide your wife") foram um deles e marcaram o início da minha adolescência. Com a facilidade com que podemos gravar e publicar vídeos no facebook, a internet trouxe-nos as "Karens" e, mais recentemente, trouxe-nos a gravação da morte do George Floyd que deu força ao movimento "Black Lives Matter" e que ganhou proporções mundiais em poucos dias.

Diogo Gomes, produtor multimédia

"Quando o trailer de Cats saiu, rapidamente foram feitos milhares de memes sobre o filme. Alguns até melhores que o filme"

Quando o trailer de Cats saiu, rapidamente foram feitos milhares de memes sobre o filme. Cada um melhor que o outro. Alguns até melhores que o filme. E sem dúvida que a Internet é um sítio muito estranho, mas quando o desafio de comer as cápsulas Tide se tornou viral acho que atingimos um novo pico.

Larissa Silva, produtora de conteúdos

"Gente, individual, coletiva, de forma organizada, antecipava-se e criava domínios, .pt, .com ou .org"

Recordo-me, numa altura em que dava os primeiros passos no jornalismo, e por inerência, na utilização diária e desenfreada de internet, de assistir, então de forma um tanto ou quanto ingénua, ao lucrativo negócio de compra de domínios. Gente, individual, coletiva, de forma organizada, antecipava-se e criava domínios, .pt, .com ou .org. Posteriormente, vendia esse simples registo. Fosse de clubes de futebol, empresas ou até mesmo de jornais que caminhavam, desatentos e lentamente, para o mundo digital. Recordo-me, inclusive de uma notícia (e não do que foi vendido) de um cidadão moçambicano ter vendido um domínio a troco de alguns milhares de euros.

Miguel Morgado, jornalista

"Não sei em que formato viajava, mas ia de Long Island para Buenos Aires, o centro da AP na América do Sul, e daí para São Paulo"

Usei a Internet pela primeira vez quando era correspondente do jornal "O Estado de São Paulo" em Nova Iorque, em 1986. Escrevia o artigo no meu AppleIIC com DOS. Tirava a ficha do telefone e colocava-a no computador. Digitava um número da Associated Press, em Long Island, ouvia uns ruídos típicos rs-rs-rs; digitava o código de acesso e depois de alguns segundos outro sinal indicava que o artigo tinha seguido. Não sei em que formato viajava, mas ia de Long Island para Buenos Aires, o centro da AP na América do Sul, e daí para São Paulo, onde o jornal o recebia como fax. Às vezes o texto chegava 'gatado' e então a redacção telefonava-me e eu ditava o texto para um dactilógrafo - ouvia-o a teclar na máquina de escrever enquanto eu ditava. Mas só acontecia raramente, o progresso era formidável!

José Couto Nogueira, jornalista

"Foi um choque. E uma alegria"

Fiquei perplexa quando descobri na net uma amiga de infância, alguém que me tinha dito que tinha morrido. Foi um choque. E uma alegria.

Patrícia Reis, jornalista

"Aquela vez em que ..."

Aquela vez em que um rapaz com cara de parvo e que fala à beto angariou mais de 25 mil euros com o pretexto que é para as propinas de uma faculdade estrangeira para fazer um doutoramento que não interessa a ninguém e que ele podia fazer em casa utilizando o Google ou indo a uma biblioteca. Apesar do apelido em comum, não somos relacionados, felizmente. Ah, e aquela nude que recebi uma vez também me deixou sem reacção, apesar de achar que isso já é um bom uso da Internet.

Guilherme Duarte, humorista

"quase me faz ter saudades de quando eu estava a tentar engatar uma pessoa desconhecida no mIRC e a net caía porque a minha avó ligava lá para casa e ficava horas a falar com a minha mãe"

A internet deixa-me sem reação mais ou menos todos os dias. Atualmente, tanto os tweets do Trump como os posts da Facharrita (Maria Vieira) fazem-me as alegrias e tristezas, simultaneamente. Às vezes é tão deprimente, que quase me faz ter saudades de quando eu estava a tentar engatar uma pessoa desconhecida no mIRC (nunca hei-de saber se eram mulheres, homens, cães, gatos, etc.), e a net caía porque a minha avó ligava lá para casa e ficava horas a falar com a minha mãe. Agora, se tenho destacar um momento preferido da internet para mim, foi quando ficámos a saber que a Pêpa queria uma mala preta da Chanel, daquelas que ficam bem com tudo. Que bom.

Diogo Faro, humorista

"Eu via um vestido branco e dourado, a minha mulher via um vestido azul e negro. No fim, fizemos as pazes"

Lembro-me bem de quando milhões de pessoas deixaram "like" numa conta de um ovo, no Instagram. Lembro-me também de quando a Internet se partiu em dois por causa de um vestido. Eu via um vestido branco e dourado, a minha mulher via um vestido azul e negro. No fim, fizemos as pazes.

Marco Neves, escritor