Livro: "A Insustentável Leveza do Ser"
Autor: Milan Kundera
Convidada: Patrícia Reis, escritora
Moderadora: Elisa Baltazar, anfitriã do "É Desta Que Leio Isto"
Data: 28 de janeiro de 2021
Ouça aqui a conversa sobre o livro "A Insustentável Leveza do Ser":
Não conseguiu estar presente na última sessão do É Desta Que Leio Isto? Este artigo resume a conversa sobre o livro "A Insustentável Leveza do Ser". A escritora Patrícia Reis juntou-se ao clube de leitura, num debate moderado pela anfitriã e promotora Elisa Baltazar.
Sobre o autor – Milan Kundera:
- Nasceu no Dia das Mentiras (1 de abril) de 1929 em Brno, antiga Checoslováquia (atual República Checa)
- Estudou música, literatura, estética e cinema
- Foi expulso do Partido Comunista sob a alçada da União Soviética por "atividades anti-partidárias" por duas vezes: em 1950 e em 1970.
- Esteve envolvido na Primavera de Praga de 1968
- Exilou-se em França em 1975.
- A crítica ao Partido Comunista é visível em vários dos seus romances.
- Em 2019, recuperou a nacionalidade checa, depois de o embaixador checo lhe pedir desculpa pelas perseguições de que foi alvo em nome do Governo.
- Para além de romances, já escreveu contos, ensaios, peças de teatro e poesia.
- Venceu o prémio Common Wealth Award de Literatura (1981) e o Prémio Jerusalém (1985).
Sobre o livro – "A Insustentável Leveza do Ser":
- A obra foi lançada em 1984.
- A narrativa tem como pano de fundo os acontecimentos da Primavera de Praga de 1968.
- O livro conta a história de um quarteto amoroso: Tomas, Tereza, Sabina e Franz.
- Tomas é apaixonado por Tereza, embora lhe seja infiel. Sabina é a amante de Tomas e de Franz.
- A questão do peso e da leveza é representada como as duas faces do compromisso e da liberdade, e as dúvidas existenciais das personagens associadas a isso.
- Os temas centrais da narrativa são as peripécias amorosas e os jogos de erotismo entre as personagens, bem como a política, tema paralelo à história de amor e com duras críticas ao comunismo soviético.
- Este livro esteve proibido na República Checa, e só teve a primeira versão em checo em 2006.
- "A Insustentável Leveza do Ser" foi adaptada para filme, em 1988, e, desde então, Kundera nunca mais autorizou a adaptação cinematográfica dos seus romances.
"Um pendor filosófico muito grande"
- A frase é utilizada por Patrícia Reis e descreve uma das características mais marcantes da obra.
- A escritora considera que o autor "tem uma voz e a voz", sendo que a voz de Kundera a "encanta" por obrigar o leitor "a pensar e é isso que a literatura deve fazer: duvidar de nós próprios".
- Patrícia Reis refere ainda que, embora não seja "uma livro fácil", "A Insustentável Leveza do Ser" é um romance "extraordinário e atual", que nos leva a ter "um encontro connosco próprios" e perguntar "o que é que queremos enquanto sociedade".
- A escritora já leu livro várias vezes e recorda: "quando eu li esta livro pela primeira vez foi um estalo".
A dicotomia do peso e da leveza:
- O título da obra leva os leitores a questionar sobre o que é que é leve e o que é que é pesado.
- As referências a esta dicotomia no livro são constantes, mas a interpretação pode depender da perspetiva de cada um.
- No entender da escritora Patrícia Reis, "umas das coisas bonitas" do livro é o facto de Tomas "se surpreender com o facto de acordar de mão dada com a Tereza", sendo que "para ele é um peso, quando [na verdade] é um gesto de uma profunda leveza".
"O sorriso de Karenine"
- Este é o título da última parte de "A Insustentável Leveza do Ser" e fala sobre a morte da cadelinha de Tereza e Tomas, que acaba por ser eutanasiada pelos donos.
- Este excerto da obra debate questões como a eutanásia, mas também o respeito pelos animais, a relação do ser humano com a natureza, e o amor verdadeiro, incondicional e desinteressado.
- Para a escritora Patrícia Reis, esta passagem toca na "questão subjacente ao romance que é a morte". "O cão faz a ponte" e é o "entendimento de que as personagens estão juntas para entrar numa potencial velhice", apesar de acabarem por morrer numa acidente viação.
Um cunho político
- Patrícia Reis destacou a evidência do "caráter político" que representa este livro passado durante a Primavera de Praga.
- Segundo a escritora, Kundera escreve "sobre as amarras do comunismo".
- Patrícia Reis destaca ainda a história da personagem Tomas, um médico impedido de exercer por motivos políticos e traça um paralelismo com a vida de Kundera, que, depois de ser expulso do Partido Comunista duas vezes, acabou por se exilar em França.
"Até que ponto é que o livro de reflete a vida do autor?"
- Esta foi uma das questões colocadas durante o debate sobre a "Insustentável Leveza do Ser", no sentido de perceber se a história refletia certos aspetos da própria vida de Kundera.
- Patrícia Reis lembra uma frase de Virgílio Ferreira para ilustrar esta situação: "Um romance é um biombo atrás do qual a gente se despe".
- A escritora defende que "os livros nunca são autobiográficos, mas somos nós" e que "a grande literatura é feita por pessoas que escrevem o que sentiram".
- Patrícia Reis afirma ainda que os seus livros "são um reflexo" do que é, mas que "vive bem com isso".
Outros livros falados durante sessão:
- Apneia – Tânia Gaia
- O Infinito num Junco - Irene Vallejo
- As Luzes de Leonor - Maria Teresa Horta
- Eu Receberia as Piores Notícias dos Teus Lindos Lábios – Marçal Aquino
- Até o Dia que o Cão Morreu – Galera Daniel
- Nu, de Botas – António Prata
- Os Maias – Eça de Queiroz
- Todos os Contos - Clarice Lispector
- Porquê Este Mundo - Uma Biografia de Clarice Lispector - Benjamin Moser
- Sontag: Her Life and Work - Benjamin Moser
"Da Meia-Noite às Seis"
- A escritora, que se considera "sobretudo uma leitora" acabou há pouco tempo de escrever o seu novo livro, ainda sem data de lançamento devido à pandemia.
- O título "Da Meia-Noite às Seis" está relacionado com o horário noturno de uma locutora numa rádio, cenário onde se desenrola a ação.
- Conta a história de dois colegas de trabalham neste turn: a locutora, uma viúva, que não teve tempo suficiente para se dar ao seu recente amor, e o seu colega, que, manda as notícias, que, depois de ser renegado pela família por ser homossexual, decide deixar de falar, um verdadeiro desafio para quem dá notícias numa rádio.
- Este livro foi escrito durante o confinamento devido à COVID-19 e passa-se durante o período pandémico.
- A autora Patrícia Reis conta: "este foi o primeiro livro que escreveu de fio a pavio de rajada".
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