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A série sobre nada
Na última sexta-feira, 1 de outubro, estreou na Netflix aquela que é considerada uma das melhores sitcoms de todos os tempos, “Seinfeld”. Entre 1989 e 1998, ao longo das suas nove temporadas, a série foi acompanhada por milhões de pessoas e inspirou outros projetos que viriam a surgir durante a década de 90, como “Friends”.
Mas o que é que a torna tão especial? Em primeiro lugar, foi das primeiras séries a introduzir o conceito de utilizar uma versão ficcionada de alguém real. Jerry Seinfeld era um comediante em ascensão quando decidiu com o seu amigo Larry David (que hoje podemos ver em “Curb Your Enthusiasm”) fazer uma série sobre os momentos mundanos que estão por detrás das histórias que contava cada vez que subia a um palco. Quando apresentaram a ideia ao canal americano NBC, encurtaram a descrição para “it’s a show about nothing” (em português, uma série sobre nada).
Em segundo lugar, o enredo e o contexto da série. Seinfeld e os três amigos Elaine (Julia Louis-Dreyfus), George (Jason Alexander) e Kramer (Michael Richards) estão todos a meio dos seus trintas, vivem em Nova Iorque e fazem parte da geração pré-internet onde telemóveis e redes sociais não existiam, o que criava uma série de situações que hoje, para nós, são completamente irrisórias. Por exemplo, num dos primeiros episódios da primeira temporada, Seinfeld interessa-se por uma mulher que conhece num jantar, mas a única informação com que fica dela é o nome da sociedade de advogados onde trabalha. Não há primeiro nome, não há número de telefone e muito menos uma morada. Por isso, claro que a solução mais óbvia é ir descobrir o edifício onde a senhora trabalha, ir para o hall da entrada e cruzar-se “acidentalmente” com ela na pausa para almoço. Hoje em dia, provavelmente bastava um ida ao LinkedIn e pesquisar pela sociedade, ver as pessoas que trabalhavam lá e já se conseguia um nome e um contacto. Não tem a mesma magia.
Por outro lado, a caracterização das personagens. “Seinfeld” é muitas vezes creditada por ter trazido para a televisão personagens com defeitos (e com noção deles) que aprendemos a amar porque nos conseguíamos rever nelas. Obviamente não dá para pôr Seinfeld ou George ao nível de um Tony Soprano ou de um Walter White, mas é difícil olhar para qualquer uma das quatro personagens principais e dizer “Aí está uma boa pessoa”. Na maior parte dos casos são egoístas ou estão completamente alienadas da realidade e tomam decisões que rapidamente nos apercebemos de que não vão dar bom resultado. Mas é o caminho para se tornarem um bocadinho melhores em cada episódio, o que cria empatia connosco porque, no final do dia, é isso que todos estamos a tentar fazer.
Por último, a comédia, claro. Os episódios de “Seinfeld” têm à volta de 20 minutos e as situações que levam ao humor do comediante são intercaladas com os precisos momentos em que ele está em palco e reflete sobre aquilo que lhe aconteceu. Não é o tipo de humor de ficarmos agarrados à barriga, mas são piadas e histórias inteligentes que facilmente nos fazem soltar uma gargalhada ou um sorriso acompanhado por um “isto, de facto, faz sentido”.
A minha curiosidade com “Seinfeld” agora é perceber se vai ou não gozar de uma nova vaga de popularidade como aconteceu com “Friends” ou “The Office”, duas série que já tinham passado do auge de interesse (já tinham acabado) e que beneficiaram do chamado efeito Netflix para atrair novas audiências no streaming e voltarem a ser trending topic nas redes sociais.
No caso de “Seinfeld”, a Netflix pagou 500 milhões de dólares pelos direitos da série e está a contar que a nostalgia traga novamente retornos para este investimento. Os principais desafios para isto acontecer serão os mesmos colocados aos “dois investimentos” mencionados em cima: será que a série se pode manter relevante para as novas gerações? Será que as audiências “dão um desconto” à forma como alguns temas eram abordados na altura em que a série foi produzida versus a relevância que têm agora, nomeadamente no que diz respeito à representatividade? Eu aposto que sim.
Quase como um podcast
Vamos a uma recomendação rápida de um filme? “O Culpado” já está em número 1 na Netflix (no top de filmes) e é um remake de um filme dinamarquês de 2018. Antes de vos explicar o plot propriamente dito, vou-vos dizer o que me fez ver o filme. E não, não foi o trailer.
Tem Jake Gyllenhaal no papel principal, que nos últimos anos dificilmente fez um filme mau. É realizado por Antoine Fuqua, responsável por filmes como “Training Day” (que celebrou 20 anos esta semana) e pela saga de ação “Equalizer” também com Denzel Washington. E foi escrito por Nic Pizzolatto, que é nada mais, nada menos, do que o criador da série “True Detective”, cuja primeira temporada continua a ser uma das melhores coisas que já vi em televisão. Sem saber nada sobre o filme, estes três ingredientes bastaram para lhe dar uma oportunidade.
Quanto ao filme em si, Joe Baylor é um polícia de Los Angeles que foi suspenso por razões que não conhecemos e que como castigo está agora a atender chamadas de emergência para o 911, o 112 americano. Na nova “tarefa”, é obrigado a responder a problemas de todo o género desde um homem assaltado por uma prostituta a um senhor que torceu o pé a andar de bicicleta. No final do dia, acaba por ser bem mais aborrecido do que imaginamos que seria a sua vida anterior.
No entanto, há uma altura em que recebe a chamada misteriosa de uma mulher que ao que tudo indica está a ser raptada por alguém e que corre perigo de vida só por estar a falar com ele. Para tratar do caso, Joe tem de ser o elo de ligação entre várias entidades que estão entupidas devido a um grande incêndio que está a acontecer em simultâneo na região da Califórnia. Portanto, durante a maior parte do filme, o que vemos no ecrã é a cara do polícia a falar com os diferentes responsáveis, que relatam o que estão a observar a cada momento. Não há uma única imagem de perseguições, explosões ou acidentes. A forma como acontecem está reservada à nossa imaginação. E é essa para mim a beleza do filme, mais do que a narrativa principal, que acaba por ter uma reviravolta inesperada.
Durante uma hora e meia, conseguimos ver um filme que se resume essencialmente a uma ou duas câmaras a filmar uma pessoa e ter a sensação de que vimos toda a ação relatada a acontecer como se se tivesse passado diante dos nossos olhos. Quase como um podcast.
- Fun Fact: as gravações para o filme começaram em novembro de 2020, numa altura em que havia uma série de surtos de COVID-19 nos EUA. Antoine Fuqua, três dias antes de entrar em estúdio para dirigir “O Culpado”, descobriu que tinha estado em contacto com alguém que tinha testado positivo. Devido à quarentena obrigatória, a solução encontrada para o filme seguir em frente foi colocá-lo numa carrinha perto do estúdio cheia de ecrãs, onde foi coordenando tudo com atores e produtores via Zoom. Fácil :)
Podcast Acho Que Vais Gostar Disto
A terceira temporada de “Sex Education” levou a que eu, o João Dinis e a Mariana Santos decidíssemos falar sobre a série com quem é entendido na matéria: a psicóloga e sexóloga Tânia Graça (@taniiagraca).
Neste episódio, aproveitamos o impacto da série britânica para falar da forma como o sexo costuma ser representado em Hollywood, de problemas de intimidade nos homens e nas mulheres e de pornografia (mas com conteúdo "safe for work"). Ficámos a saber mais sobre educação sexual e a Tânia não nos cobrou pela hora de terapia.
Créditos Finais
- Disney+. “Black Widow” ficou disponível hoje para todos os subscritores do serviço de streaming.
- 007. No próximo episódio do podcast Acho Que Vais Gostar Disto, vamos falar de James Bond e da nova saga que termina com “No Time To Die”. Fica atento.
- Agenda para outubro. Encontra aqui os filmes, séries e álbuns que este mês nos trás.
- Álbum da semana. This one.
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