Para já, foram feitos testes no novo laboratório criativo do restaurante São Gabriel, em Almancil, com medusas, mais conhecidas por alforrecas, que já existiam no rio, mas em menor quantidade, e corvinas americanas, uma espécie nativa dos Estados Unidos, identificada este ano pela primeira vez no Guadiana.

Mais recentemente, em outubro e durante o verão, a equipa de investigação do Centro de Ciências do Mar (CCMAR) que está a monitorizar as novas espécies que povoam o rio descobriu mais dois poderosos aliados para as experiências de Leonel Pereira: o caranguejo azul, ou "siri", e o potencialmente venenoso peixe balão.

créditos: LUÍS FORRA/LUSA

Leonel Pereira reconhece que, em 30 anos de carreira, a medusa, cujo sabor compara ao da lula, foi a espécie que "mais trabalho lhe deu" e que mais o desafiou: além de ser composta por 94% de água e 6% de proteína, tem um elevado teor de sal, o que limita as possibilidades de confeção.

"Quando pensamos numa medusa, vamos ter que a cozinhar de uma forma muito sensível, para ela não se desintegrar, é claro que vamos logo pensar em ceviches, coisas frescas, sempre desta área dos legumes", refere o 'chef' do restaurante São Gabriel, espaço que detém uma estrela Michelin.

Outras das iguarias que Leonel Pereira está ansioso por começar a trabalhar é o caranguejo azul, o "blue crab", também conhecido como "siri", nativo da costa leste dos Estados Unidos e que foi encontrado pela primeira vez no Guadiana este verão, a mais de sete mil quilómetros de distância de casa.

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"Fiquei muito surpreendido com a existência deste caranguejo e deste tamanho, o que significa que já têm alguns anos", refere o 'chef', sublinhando que se trata de uma espécie com um sabor "muito requintado" e cujo preço é "excessivamente caro nos Estados Unidos" e noutros países.

A coordenadora do projeto de monitorização das espécies invasoras no Guadiana, Alexandra Teodósio, explica que a população de caranguejo azul já está estabelecida no Guadiana, o que é visível pelo facto de já existirem adultos, e que a espécie, também já encontrada no estuário do Sado, terá navegado, enquanto larva, nas águas de lastro dos navios que cruzam o Atlântico.

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Mas a mais recente descoberta no Guadiana, em outubro, ainda foi mais surpreendente: pescadores encontraram um peixe-balão, muito usado no sushi e preparado por 'chefs' altamente treinados, por poder ser fatal devido à toxicidade do fígado.

O responsável pela descoberta foi Antero Fernandes, que pesca à linha no Guadiana há 35 anos e que confessou não fazer ideia do que era, pois nunca tinha visto aquele peixe, que é uma iguaria do outro lado do mundo.

"Esse último que eu apanhei é muito perigoso e temos que ter cuidado, já avisei alguns, mas como nem todos viram é preciso ter cuidado", referiu o pescador, cuja colaboração com os investigadores do Centro de Ciências do Mar (CCMAR) já é antiga.

Alexandra Teodósio, também professora na Universidade do Algarve, sublinha que sem o apoio dos pescadores seria muito difícil detetar logo as novas espécies que povoam o rio.

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"Tem sido através desta colaboração que temos conseguido encontrar e detetar estas espécies novas de uma forma mais consistente", frisa, acrescentando que, para o ano, existe um projeto para ministrar ações de formação aos pescadores.

Para a docente, é preciso "dar a conhecer estas novas espécies, se têm potencial de exploração, se são perigosas e se eles [os pescadores] as podem consumir".

Apesar de poderem representar uma oportunidade para diversificar a sua atividade, por enquanto, estas novas espécies parecem não agradar muito aos pescadores, uma vez que nunca as viram por cá e nem tão pouco sabem bem como apanhá-las.

"Não é agora com quase 70 anos que se vão adaptar, arranjar artes e forma de ganhar a vida com estas novas espécies", atira o mestre Antero, confiando essa mudança à nova geração de pescadores.

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O jovem pescador Ricardo Gonçalves diz não compensar apanhar estas novas espécies com o intuito de as vender porque não há procura por parte dos consumidores, pelo menos por agora.

O aparecimento de espécies invasoras no estuário do Guadiana tem vindo a aumentar nos últimos anos, com mais de uma dezena de espécies registadas, incluindo peixes, amêijoas, alforrecas, camarões e, mais recentemente, este caranguejo.