Trata-se do Forno da Ti Bia Gadelha, que foi restaurado pela Associação para a Defesa do Património Cultural de Beja (ADPBeja) em parceria com a União de Freguesias de Santiago Maior e S. João Batista e a Câmara de Beja.

Situado no centro histórico da cidade, o forno, que tinha fechado nos anos 60 do século XX e estava em ruínas, foi restaurado e hoje voltou a funcionar e "já há fumo a sair da chaminé", disse à agência Lusa o presidente da ADPBeja, Florival Baiôa.

Após mais de 50 anos parado e "perdido na memória" dos habitantes mais velhos de Beja, o forno restaurado recebeu hoje lenha, que vai ter de arder durante os próximos três dias até o aquecer à temperatura necessária de cerca de 800 graus para cozer a primeira fornada da "nova fase" da sua vida, explicou.

Segundo Florival Baiôa, o forno, que pertencia à família Soeiro Barbosa, era gerido por uma senhora forneira conhecida como Ti Bia Gadelha ou Tia Maria do Forno, que durante décadas nele cozeu pães e assou carnes às famílias de Beja em troca de um dízimo.

O forno foi doado à ADPBeja em 2016 pelos antigos proprietários, os irmãos Pedro e Vera Torres, herdeiros da família Soeiro Barbosa, com o objetivo de ser recuperado e colocado ao serviço da população de Beja, que "perdeu todos os seus fornos tradicionais e referências" do seu produto "mais basilar" - o pão, contou.

Os antigos proprietários também doaram à ADPBeja uma casa contígua ao forno, onde a associação está a criar um museu dedicado ao pão.

A ADPBeja decidiu restaurar o forno às suas formas e função iniciais para "preservar um património que fez parte do quotidiano popular e faz parte da memória de muita gente e da história simples da cidade", explicou.

O restauro do forno, através de técnicas tradicionais de construção, "marca a diferença em termos de restauro de património em Portugal", onde "é habitual restaurar monumentos de grandes heróis da história", como palácios, igrejas e castelos, e "se esquecem os de outros heróis, aqueles que constroem a história com o seu trabalho diário e herdam, mantêm e transmitem costumes centenários aos seus filhos e netos", disse.

Através do forno restaurado, explicou, a ADPBeja quer dar aos interessados a possibilidade de coserem pães, carnes e outros pratos de forno com lenha de esteva, que era a mais usada antigamente.

A ADPBeja também pretende produzir vários tipos de pães tradicionais do Alentejo e produtos derivados, nomeadamente bolos típicos da região, como costas e popias.

Para "completar o ciclo do pão", a ADPBeja tem protocolos com o Instituto Politécnico de Beja para plantação e com um proprietário de um moinho de vento para moagem de trigo tradicional.

A ADPBeja também quer que o forno seja um polo de atração de turistas a Beja e um instrumento pedagógico para alunos, turistas e outros interessados poderem aprender o fabrico tradicional do pão, da amassadura ao consumo, e depois fazerem e cozerem no forno pães e levarem-nos para casa.

Segundo Florival Baiôa, a ADPBeja está a avaliar duas hipóteses de gestão do forno, sendo que uma é geri-lo diretamente e a outra é através de contrato com uma empresa interessada em usá-lo com os mesmos objetivos da associação, como o de produzir vários tipos de pão tradicionais do Alentejo e produtos derivados.

Segundo a ADPBeja, o forno de Ti Bia Gadelha poderá ter sido construído na 2.ª metade do século XVIII, já que o tipo de construção das paredes tem elementos da época.

O forno tem uma arquitetura em cúpula circular com cerca de quatro metros de diâmetro e, para preservar o calor no interior, é coberto exteriormente por uma camada de terra barrenta e por uma manta de sal sob a tijoleira de Beringel do solo.

O restauro do forno custou cerca de 20 mil euros, contou com a ajuda da União de Freguesias de Santiago e São João Baptista e da Câmara de Beja e foi financiada por donativos e fundos angariados pela ADPBeja, sobretudo através de um espetáculo que contou com a participação de vários artistas de Beja, como o fadista António Zambujo e a banda Virgem Suta.

A inauguração do forno está marcada para hoje às 18:00 e inclui também o lançamento do livro de banda desenhada "A Fantástica História do Restauro do Forno Comunitário de Beja", da autoria de Cristina Matos, e um petisco, no Museu do Vinho.

O programa de inauguração do forno inclui também, na sexta-feira, a partir das 19:30, o lançamento do livro "A Doçaria Portuguesa. Sul", de Cristina Castro, uma prova de doces conventuais e uma conferência da investigadora Filomena Barata sobre "O pão e o vinho na mitologia clássica... com um toque de cristianismo", no Centro UNESCO, e um jantar num restaurante de Beja.