“A perda de valor económico derivada da crise de 2008, que incidiu nos países de expressão portuguesa e muito no Brasil, levou a uma diminuição do valor da língua no mercado internacional”, disse Luís Reto.

Em declarações à agência Lusa a propósito do primeiro Dia Mundial da Língua Portuguesa, 05 de maio, Luís Reto, que coordenou o primeiro estudo sobre o potencial económico da língua portuguesa, apresentado em 2012, explicou que as projeções de crescimento para a economia brasileira em que se baseava o estudo não se concretizaram.

“O Brasil deveria ser hoje a quinta economia do mundo e é a nona. Em 2013, estávamos em sexto lugar na lista das 10 línguas a aprender no futuro elaborada pelo British Council. O estudo foi replicado em 2017 e passámos para oitavo lugar”, afirmou.

“Houve, por força da perda de peso do Brasil na economia mundial, uma perda de valor” da língua portuguesa, acrescentou.

Por outro lado, apontou como positiva a presença do português como língua oficial em cada vez mais organizações internacionais, bem como nos currículos de ensino de um número crescente de países.

“A esse nível, houve de facto um crescimento da importância do português”, disse, acrescentando que esta acaba por ser uma questão de “copo meio cheio ou meio vazio”.

“Do ponto de vista económico, a quebra grande do Brasil foi um fator muito negativo, do ponto de vista da afirmação do português tem havido, apesar de tudo, alguns progressos”, disse.

Como exemplos, apontou a classificação do português como uma das línguas que dá créditos nas universidades norte-americanas, o crescimento do ensino de língua portuguesa na China ou a perceção crescente do valor do idioma no mundo dos negócios.

Há 47 universidades na China que ensinam o português como língua estrangeira e 4.899 alunos que frequentam esses cursos.

“A língua é tanto mais forte quanto maior é o peso económico dos países que a falam. É isso que justifica o peso do inglês hoje, quando tem menos falantes maternos que o mandarim e que o espanhol”, disse.

Mais pressão diplomática e dinheiro para colocar português na ONU

“A UNESCO ter consagrado um dia mundial para a língua portuguesa é essencialmente simbólico, mas pode ser importante num passo que o português tem de necessariamente dar e que está firmado como intenção na Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), que é ser língua oficial das Nações Unidas” disse Luís Reto.

“É, de facto, um objetivo importante a alcançar”, acrescentou, assinalando que o português é “uma das grandes línguas internacionais que não tem assento na ONU”.

As línguas oficiais das Nações Unidas são o inglês, francês, mandarim, espanhol, árabe e russo.

“O português cumpre muitos mais critérios internacionais do que muitas das [línguas] que lá estão. É uma língua falada e oficial em nove países e uma região administrativa, tem dispersão em quatro continentes e mais de 260 milhões de falantes maternos”, disse.

O investigador sustentou que tem faltado “pressão diplomática e financiamento” para conseguir alcançar este objetivo.

“É preciso formar intérpretes e tradutores e pagar para o sistema de línguas das Nações Unidas funcionar. A CPLP, especialmente Portugal e Brasil, tem de ver se passa da retórica aos factos”, disse.

A CPLP aprovou uma proposta para tornar o português língua oficial da ONU na sua cimeira de Brasília, em 2016.

Luís Reto não tem dúvidas de que a entrada do português como língua oficial da ONU terá um retorno importante.

“Este reconhecimento da UNESCO é, pelo menos, uma consolação simbólica de que talvez estejamos no bom caminho. Forte era, de facto, o português conseguir ser a sétima língua da ONU”, disse.

“Para isso é preciso diplomacia e dinheiro”, acrescentou, considerando que se no pós-pandemia covid-19 houver uma retoma económica forte do Brasil, talvez esse objetivo possa ser alcançado a médio prazo.

“O Brasil manifestou um interesse muito forte que isso acontecesse” durante a presidência de Michel Temer, disse Luís Reto, ressalvando a incerteza sobre a posição atual e futura das atuais autoridades brasileiras relativamente a este tema.

O português é língua de oficial e ou de trabalho das seguintes organizações internacionais: Organização dos Estados Americanos (OEA), Mercosul, Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (CELAC), Comissão Económica para a América Latina e Caraíbas (CEPAL), Organização dos Estados Ibero-Americanos para a Educação, a Ciência e a Cultura (OEI).

Fazem ainda parte desta lista a União Africana (UA), Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO), União Europeia (EU), UNESCO, CPLP, Organização Mundial da Saúde, Comunidade Económica dos Estados da África Central (CEEAC), Comunidade de Estados do Sahel-Saara (CEN-SAD), Associação Latino-Americana de Integração (ALADI), União de Nações Sul-Americanas (UNASUL), Zona de Paz e Cooperação do Atlântico Sul (ZPCAS), e Mercado Comum da África Oriental e Austral (COMESA).

A língua portuguesa é falada por mais de 260 milhões de pessoas nos cinco continentes, estimando-se que, em 2050, terá quase 400 milhões de falantes e, em 2100, mais de 500 milhões, segundo as Nações Unidas.

As projeções para o final do século apontam que será no continente africano que se registará o maior aumento de falantes, com forte contribuição de Angola e Moçambique, que deverão ter nessa altura populações superiores a 170 milhões e 130 milhões de pessoas, respetivamente.

O português é a quarta língua mais falada como língua materna, a seguir ao mandarim, inglês e espanhol, a mais falada no hemisfério sul e idioma oficial dos nove países membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) e Macau.

As nove economias da CPLP, em conjunto, valem cerca de 2.700 milhões de euros, o que faria deste grupo a sexta maior economia do mundo, se se tratasse de um país, segundo o FMI.

É ainda a quinta língua mais utilizada na internet e, globalmente, o português é falado por 3,7% da população mundial.