Henrique Galvão, o capitão rebelde

O ano de 1952 iniciou-se com a prisão, pela PIDE, a 6 de janeiro, de muitos militares e civis que integravam um grupo clandestino, formado na sequência da campanha presidencial do general Quintão Meireles, do ano anterior, acusados de estarem implicados numa intentona conhecida sob o nome de «Rua da Assunção». Era nessa rua que alguns militares e civis da Organização Cívica Nacional (OCN) se encontravam para organizar um levantamento contra o regime de Salazar, figurando entre eles o capitão Henrique Galvão. A morada estava vigiada pela PIDE, que conseguira infiltrar um informador entre os conspiradores. Tratou-se de António Júlio Borges, que convocou os conspiradores para uma reunião a realizar em 7 de janeiro de 1952.

Ao estarem todos reunidos, «por volta do meio-dia», agentes da PIDE irromperam nessa casa, «como uma praga de gafanhotos, armados de pistolas e até de pistolas-metralhadoras». Os presentes, entre os quais se contavam o brigadeiro António Maia, o coronel Tadeu, o comandante José Moreira de Campos, o major Pereira de Macedo e o capitão Henrique Galvão, foram presos1. Este último, tenente do 28 de Maio de 1926, aderira depois ao Estado Novo de Salazar, que, aliás, lhe pagara a fidelidade nomeando-o diretor da Emissora Nacional, logo que esta fora criada, em 1935.

É Desta Que Leio Isto: Em maio recebemos Teolinda Gersão

Há muito esgotado no mercado português, "O Cavalo de Sol" regressa às livrarias pela mão da Porto Editora, razão para endereçarmos o convite a Teolinda Gersão para o encontro deste mês do É Desta Que Leio Isto, clube de leitura da MadreMedia. Editado em 1984, foi distinguido com o Prémio de Ficção do PEN Clube em 1989, versando sobre o tabu da homossexualidade nos anos 30 do século XX.

Autora de mais de 20 livros, Teolinda Gersão é uma das grandes escritoras portuguesas da atualidade, tendo sido galardoada com alguns dos mais prestigiados prémios literários nacionais, nomeadamente o Grande Prémio de Romance e Novela da APE, o Prémio do PEN Clube (1981 e 1989), o Grande Prémio do Conto Camilo Castelo Branco, o Prémio Fernando Namora (1999 e 2015) e o Prémio Literário Vergílio Ferreira 2017 pelo conjunto da sua obra.

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No entanto, Galvão entrara depois em dissidência, ao apresentar, em 1947, na qualidade de inspetor colonial e deputado da Assembleia Nacional, um relatório sobre uma visita realizada a Angola. O capitão confirmava ali abusos cometidos no âmbito do Estatuto do Indigenato e criticava este diploma, por instituir o trabalho forçado e as deportações punitivas para S. Tomé e Príncipe ou para as minas do Transval. Já na oposição ao regime, Galvão apoiou a candidatura oposicionista do general Quintão de Meireles à presidência da República, em 1951, redigindo o respetivo programa e, depois, constituiu a Organização Cívica Nacional (OCN), para derrubar a ditadura.

O julgamento de Galvão e de diversos oficiais2, acusados de conjura contra a segurança do Estado e de pertencerem à Organização Cívica Nacional3, realizou-se no Tribunal Militar de Santa Clara, presidido pelo general Almeida Topinho e o juiz auditor Crispiniano de Lacerda. Sobre este, o advogado de Galvão disse, aliás, que não deveria intervir no processo, pois era ao mesmo tempo «ofendido, acusando Galvão de haver ofendido a sua honra e consideração, e julgador da ofensa». A jornalista e escritora Maria Archer, que assistiu ao julgamento do capitão Galvão, relatou-o, num jornal de exilados portugueses no Brasil, descrevendo a entrada do capitão, «a direito como um toiro na arena».

Toda a acusação, segundo Maria Archer, estava baseada em documentos considerados «planos duma hipotética revolução», mas Henrique Galvão afirmou em tribunal tratar-se de «exercícios em que ele se tinha entretido como escritor e como militar»4. Mário Soares relatou o «caso de uma célebre pasta de Galvão que desapareceu dos serviços da candidatura Meyrelles, por dois dias, e que tinha, nada menos, do que os planos da revolta projetada». Com «o seu desplante conhecido», Galvão alegou «que se tratava de um trabalho de pura imaginação para uma peça de teatro que tencionava escrever», no seu julgamento, que, segundo Soares, fora um dos mais extraordinários a que assistira5.

Ouvido secretamente, após a sala ser evacuada do público, Henrique Galvão pretendeu ser acareado com o «tenebroso» António Júlio Borges, o informador que a PIDE colocara na cela do capitão. Sem dele desconfiar e ao apurar que Borges iria ser libertado, Galvão pedira-lhe que fosse a sua casa retirar uns papéis. Claro que, ao ser solto, Borges fora «naturalmente dizer tudo ao tal indivíduo» que tinha «um físico de cantador de tangos e que depois se dirigiu a sua casa, pois soubera do outro o local exato onde estava o documento». Henrique Galvão descreveu assim como cantador de tangos provavelmente o inspetor da PIDE, Raul Porto Duarte, que, noutra audiência do julgamento, negou que Borges fosse informador da polícia e o responsável pela detenção dos réus, na Rua da Assunção.

Seja como for, devido ao facto de Borges ter sido logo solto, Henrique Galvão apercebeu-se de que tinha sido ele o delator, afirmando em tribunal que este lhe fora apresentado, em 1951, por Pires Guerreiro, que nem sequer fora interrogado pela PIDE6, como aliás também acontecera ao tenente Fonseca, que não constava nos autos. Na terceira audiência do julgamento, em 19 de março, Henrique Galvão voltou a afirmar que, se «havia algum conspirador efetivo, era realmente o Borges»7. O capitão disse em tribunal até poder alegar que a principal peça acusatória do processo, os «planos de uma hipotética revolução», eram «o capítulo dum romance», mas preferia não se afastar da verdade, ao afirmar que «não passou dum estudo», aliás, incompleto, a que ele dedicara pouco tempo e pouca atenção.

O capitão confirmou ser autor dos documentos apreendidos, com a exceção de quatro, um dos quais constituía um plano de detenções de vários governantes e chefes militares adeptos do regime, onde se encarava a hipótese de «armar os civis». Esclareceu que esse plano estava relacionado com algo que estivera para acontecer em 1945/1946, mas que fora aproveitado para a elaboração de outros documentos que não eram da sua autoria e lhe haviam sido entregues precisamente por... António Júlio Borges. Galvão questionou ainda em tribunal o que fizera a PIDE de grande parte dos papéis apreendidos em sua casa. O general juiz presidente interrompeu-o, perguntando: «Mais documentos? Este processo já tem documentos a mais! Apareceram documentos a mais! E eu preveni V. Exa. de que não posso consentir acusações à Polícia...»8

Ao tribunal, Galvão explicou que, com os seus companheiros, pretendera apenas «fazer uma organização política» que conjugasse todos os elementos antitotalitários do país, incluindo elementos do governo e da União Nacional, monárquicos, republicanos, socialistas, apenas excluindo «os elementos totalitários quer fossem fascistas, nazistas ou comunistas». Registe-se que Henrique Galvão não foi incriminado e denunciado por Borges, mas também pelo chefe da PSP, José António Fernandes, e pelo tenente-coronel na reserva, Manuel Martins dos Reis9.

Este último queixou-se à PIDE de que Galvão o ameaçara de, «quando um dia saísse da prisão, nenhum oficial do exército» lhe estenderia a mão e, por isso, solicitava à polícia para não ser transferido, com os outros oficiais, para o Presídio Militar da Trafaria10. Lembre-se que, para se defender em tribunal, Martins dos Reis recordou ter sido convidado pelo diretor da PVDE, Agostinho Lourenço, para substituir o diretor do depósito de presos de Angra do Heroísmo e que depois fora solicitado para dirigir a colónia penal do Tarrafal11.

Na audiência do julgamento de 24 de março de 1953, foi ouvido o capitão António Neves Graça, diretor interino da PIDE, segundo o qual esta polícia tinha tomado conhecimento da «intentona» através de informadores. Afirmou que «havia pessoas que eram desse feitio (vício inveterado de só pensarem e desejarem fazer revoluções em Portugal), que davam origem, pelas suas conversas ou atuações», a que surgissem «comunicações à Polícia». Depois, a PIDE «verificara, através dos seus serviços reservados, que se pretendia aproveitar o período da propaganda eleitoral para estabelecer certos contactos», para levar a cabo um golpe militar, mascarando esse intuito com a criação da Organização Cívica Nacional (OCW).

Neves Graça contou que, no fim de 1951, chegaram à PIDE cartas e telefonemas de «colaboradores anónimos», reveladores de «grande patriotismo», cuja identidade a polícia não procurara conhecer. Posteriormente, haviam chegado à PIDE uma cópia do plano revolucionário elaborado por Galvão, fotografias e outros documentos, obtidos na casa da Rua da Assunção onde funcionava a OCN – diga-se que, na realidade, os documentos foram apreendidos em casa de Galvão –, e a polícia tomara as devidas providências. Respondendo, depois, a críticas feitas em tribunal, segundo as quais tinha havido «o propósito de maltratar» os presos, Neves Graça assegurou que tais sentimentos não se abrigavam na PIDE.

Acrescentou que, como as prisões privativas desta polícia tinham deficiências, ele próprio, aliás, um militar, tinha proposto alugar um edifício para alojar os presos da conjura, proporcionando-lhes maior comodidade, antes que fossem transferidos para a Trafaria. Na mesma audiência, o inspetor da PIDE, Raul Porto Duarte, que, numa sessão anterior, negara que Borges fosse informador dessa polícia, responsável pela detenção dos réus, afirmou que nada tinha sido encontrado de comprometedor, na Rua da Assunção. Por isso, agentes da PIDE haviam-se deslocado à residência de Galvão, onde, na ausência da mulher do capitão, os agentes haviam esperado até às 12 horas, para fazerem a busca. Esta fora demorada e o próprio Porto Duarte repetiu que ele próprio lá se tinha deslocado, pelas 17 horas, para recolher a documentação apreendida, com o plano da «intentona».

Diga-se que esse inspetor se deslocou a essa hora, a casa de Galvão, provavelmente porque já sabia então, através de Borges, onde se encontrava o tal documento com o plano da «intentona». Quanto aos interrogatórios, Porto Duarte afirmou que se tinham desde logo definido dois blocos, entre os arguidos: um que recusava estabelecer as suas responsabilidades e outro – mais diminuto – que as esclareceu. O tribunal militar leu a sentença, em S1 de março de 195312, condenando em particular o capitão Henrique Carlos da Mata Galvão a três anos de prisão maior celular. Em abril de 1975, o SCE da PIDE/DGS iniciou o estudo do processo-crime levado a cabo pela polícia política, a fim de instruir o processo de Júlio Feio Borges enquanto informador13.

Henrique Galvão e o caso «Moreanto»

O capitão Henrique Galvão encontrava-se a cumprir a sentença na Penitenciária de Lisboa, para cuja enfermaria tinha sido transferido, do forte de Peniche, quando o seu caminho se cruzou com o de Manuel Bruno dos Santos Cardoso. Este fora preso em 1940, no Porto, aos 23 anos, acusado de ter participado, em maio desse ano, no crime da Rua do Bonjardim14, e condenado a dez anos de prisão maior celular, seguida de vinte anos de degredo. Mais tarde, este relataria à PIDE que a pesada pena a que havia sido condenado se teria devido ao facto de ter arcado com todas as responsabilidades do crime da Rua do Bonjardim, para se limpar face aos seus camaradas desafetos ao regime, que o suspeitavam de colaborar com a polícia.

Não se sabe se Bruno dos Santos Cardoso já colaborava então com a PVDE, mas o certo é que, nos anos 50, passou de facto a ser informador da PIDE, à qual denunciou o capitão Henrique Galvão, preso como ele na Penitenciária de Lisboa. Através de Bruno dos Santos Cardoso, a PIDE apurou que o capitão tinha sido o autor «de um pasquim clandestino e anónimo intitulado “Moreanto”», pois aquele declarou que, em início de 1953, Henrique Galvão lhe pedira para datilografar a sua comédia A Farsa do Amore, mais tarde, o romance Vagô. Em troca, Cardoso pedira a Galvão para lhe arranjar clientes e interceder pela sua libertação condicional no Ministério da Justiça.

Galvão dissera-lhe que se estava a preparar um movimento de oficiais para derrubar a «situação», prometendo a Bruno Cardoso que seria solto. Este retorquira que, sendo tido como comunista, não seria libertado, mas Galvão prometera que, no máximo, apanharia dois anos de cadeia e que a sua libertação seria facilitada, se ele fizesse o panfleto «Moreanto, do Movimento de Resistência Anti-Totalitária»15. Segundo apurou a PIDE, cerca de 13 números do «pasquim Moreanto» tinham sido reproduzidos em quinhentos exemplares, cada um, na Penitenciária, e uma segunda edição dos três primeiros números havia sido feita fora dessa cadeia. Após impressos na Penitenciária, os exemplares de «Moreanto» eram enviados para locais indicados por Henrique Galvão, através de serventuários da própria cadeia.

No processo, instruído pela PIDE e remetido ao tribunal em março de 1955, foi também acusado o chefe dos guardas da Penitenciária de Lisboa, Carlos Alberto Lino, denunciado por guardas prisionais de ter aceitado dádivas de presos e permitido que Bruno dos Santos Cardoso recebesse clientes, no seu gabinete. Carlos Lino confirmou este facto, mas negou ter possibilitado conversas entre Bruno dos Santos Cardoso e Henrique Galvão, na enfermaria da penitenciária, alegando que tal não se podia evitar. Não resistindo à pressão, este chefe dos guardas acabaria por se suicidar, conforme contaria, mais tarde, Mário Soares, segundo o qual o assunto foi comentado, por todo o país, «à boca pequena». Soares descreveria «a “conspiração” – utilizando os serviços da cadeia», onde Henrique Galvão «teve a arte de descobrir cumplicidades, para fabricar manifestos de denúncia dos escândalos governamentais».16

Estes eram entregues, fora da Penitenciária, no escritório do advogado Filipe Mendes, na Praça da Alegria, enquanto o médico Abel Augusto das Neves e o empregado de escritório João Rafael de Almeida Lourenço se ocupavam da reimpressão e difusão do referido «pasquim», no exterior. Todos foram presos, em 13 de setembro de 1954, enquanto Henrique Galvão, que deveria terminar, em 7 de outubro, o cumprimento da sua pena anterior, foi novamente «detido» pela PIDE, ao ser denunciado por Bruno Cardoso. Transferido para o forte de Caxias, Galvão recusou prestar declarações, afirmando não ser «denunciante» e iniciou uma greve da fome.

Em 30 de setembro, o seu advogado, Vasco da Gama Fernandes, pediu o internamento hospitalar de Galvão, muito doente devido à sua detenção, mas a PIDE recusou e o capitão nem pôde ser ouvido pelo tribunal em 11 de outubro, acabando por ser internado, nove dias depois, no hospital de Miguel Bombarda. Henrique Galvão, que não assistiu à leitura da sentença, foi condenado a 16 anos de prisão. Apesar de atentamente vigiado, Henrique Galvão conseguiria, depois, evadir-se, na madrugada de 16 de janeiro de 1959, do hospital de Santa Maria, e abrigar-se numa embaixada, antes de partir para a Venezuela e o Brasil17 . Galvão continuaria a atuar contra o regime, comandando, nomeadamente, os assaltos ao paquete Santa Maria e ao avião da VAP, em 1961, mas viria depois a zangar-se com o seu antigo companheiro de luta, Humberto Delgado. Morreria em 26 de junho de 197018.

Informadores da PIDE — Uma Tragédia Portuguesa
créditos: Temas e Debates

Livro: Informadores da PIDE — Uma Tragédia Portuguesa

Autor: Irene Flunser Pimentel

Editora: Temas e Debates

Data de lançamento: 19 de maio

Preço: 18,81 €

Quanto a Bruno dos Santos Cardoso, que, através das suas denúncias, possibilitou à PIDE que desvendasse o caso «Moreanto», começou logo por tentar tocar a inexistente veia sensível dessa polícia, ao contar a sua história, desde jovem estudante, preso desde 194019. Queixou-se de ser considerado detido «comum» e por isso estar preso na Penitenciária de Lisboa, no meio de ladrões e assassinos, razão pela qual permanecia sempre na sua cela e havia tentado suicidar-se por três vezes. O certo é que, em 27 de maio de 1955, Bruno Cardoso dos Santos foi transferido para o hospital de Júlio de Matos, a fim de se proceder a um exame.

No regresso à cadeia de Caxias, desmaiou e foi conduzido ao Hospital de S. José e, após a sua recuperação, foi internado na enfermaria da cadeia do Aljube, onde se tentou de novo suicidar, com a ingestão de cabeças de fósforos dissolvidas em leite. Ao longo desse ano de 1955, Bruno Cardoso dos Santos assinou diversos recibos, respetivamente, no valor de 2500$00, S000$00, 1820$00 e 8200$60, remetidos pela Penitenciária de Lisboa para o forte de Caxias. Algumas quantias podiam estar relacionadas com o seu trabalho anterior de datilografia e tipografia, realizado na penitenciária. No entanto, outras quantias, que oscilaram entre 200$00 e 5000$00, foram-lhe entregues pelo diretor de Caxias e pelo diretor-adjunto dos Serviços de Investigação da PIDE, parecendo ter sido retribuições pelo seu trabalho de colaboração com a polícia. O facto de Bruno Cardoso dos Santos ter colaborado com a PIDE levou a que recebesse, pelo menos, uma carta anónima manuscrita, onde era acusado «de ter atirado para a miséria pessoas» e ter desgraçado diversos funcionários da penitenciária, através das suas denúncias. Depois, tanto em Caxias como no Aljube, ele continuou a colaborar com a PIDE, como relatou o preso político José Magro. Este contou ter sido colocado, no final de 1956, na enfermaria, ao lado de «um bufo conhecido, o Bruno, provindo da penitenciária», que fez «propostas insidiosas», alegando querer prestar «serviços ao Partido»20.

A Divisão de Investigação da PIDE ordenou, em 26 de fevereiro de 1957, que Santos Cardoso fosse internado no Dispensário de Higiene e Profilaxia Mental e, em 6 de março, este emitiu um parecer segundo o qual ele sofria de «uma reação psicótica, de tipo carcerário e etiologicamente relacionado com o largo período de clausura que tem suportado». Foi sugerido que ele fosse transferido para um hospital especializado, o que aconteceu em 23 de abril, ao ser internado no hospital de Miguel Bombarda. No dia seguinte, Manuel Bruno dos Santos Cardoso recebeu 2500$00, remetidos pela Penitenciária de Lisboa, e, em 13 de maio de 1957, evadiu-se do pavilhão de segurança deste hospital, juntamente com outro internado, o qual foi recapturado.

Em final de agosto de 1960, a PJ desconhecia o paradeiro de Manuel Bruno Cardoso, pois questionou a PIDE sobre ele, respondendo esta polícia que ele estava em parte incerta. Tal não correspondia à verdade, pois a polícia política sabia, pelo menos, desde julho de 1959, que ele se encontrava em França, se é que não tinha sido ela própria a enviá-lo para esse país. Além disso, esta polícia foi sempre informada acerca de Bruno Cardoso, pelo seu informador em Toulouse, «Bayonne», como se verá ao abordar-se o funcionamento dos informadores da polícia política na Europa.

Notas

  1. Arquivo da PIDE/DGS, pr. dir. 42/52 – S.-Inv.
  2. Foram ainda réus, nesse julgamento, além do capitão na reserva Henrique Galvão, o brigadeiro reformado António de Sousa Maia, o coronel reformado Luiz Gonzaga Tadeu, o tenente-coronel reformado Manuel Martins dos Reis, o chefe da PSP José António Fernandes e os civis José Tendeiro, Ilídio Fernandes Correia e João Soares de Sousa Machado.
  3. Arquivo da PIDE/DGS, pr. dir. 42/52 – S.-Inv.
  4. Idem, pr. 131/48 SR, Maria Emília Archer Eyroles Baltasar.
  5. Mário Soares, Portugal Amordaçado…, op. cit., 203.
  6. Arquivo da PIDE/DGS, NV 9123, maço 32, caixa 29; Idem, pr. dir. 42/52 – S.-Inv., fls. 103, 114 e 119.
  7. Idem, pr. dir. 42/52 – S.-Inv., fls. 103, 114 e 119.
  8. Idem, pr. 131/48 SR, Maria Emília Archer Eyroles Baltasar.
  9. Idem, pr. 131/48 SR, Maria Archer Baltazar, «Os últimos dias do fascismo português», fl. 197.
  10. Idem, pr. dir. 42/52, S. Inv.
  11. Idem, pr. 131/48 SR, Maria Archer Baltazar, «Os últimos dias do fascismo português», fl. 197; Idem, pr. dir. 42/52, S. Inv.
  12. O brigadeiro António de Sousa Maia foi condenado a quatro meses de prisão correcional e, em virtude da detenção sofrida, foi libertado, enquanto o coronel Luiz de Gonzaga Tadeu e o tenente-coronel Manuel Martins dos Reis, sentenciados, respetivamente, em dois anos e 18 meses de prisão correcional, continuaram presos. Por ter confessado «espontaneamente o crime», descoberto outros agentes do mesmo e sido profícua a revelação feita à Justiça, o chefe da PSP, José António Fernandes, foi condenado a oito meses de prisão correcional, indo em liberdade devido à prisão sofrida. Quanto aos civis, José da Silva Vendeiro foi sentenciado em 16 meses de prisão correcional, indo preso; João Soares de Sousa Machado, por ter confessado ter agido por inconsciência e medo, foi condenado a sete meses de prisão correcional, saindo em liberdade; e Ilídio Correia foi absolvido.
  13. Arquivo do SCE da PIDE/DGS e LP, 4684/SJ Vários, Arquivamento de processos, proc. 190, António Júlio Feio Borges, Para: CEW/Quartel-General, Região Militar de Lisboa, Lisboa, 9 de abril de 1975, «[…] 192, Informação, V/ofício n.º 128 de 24/3/975, Para: José Joaquim Veríssimo, Comissão de Recenseamento Eleitoral, Junta de Freguesia de Santos-o-Velho, R. da Esperança, 49, Lisboa, 11 de abril de 1975».
  14. Largamente noticiado pela imprensa, tratou-se do assassinato do «capitalista» septuagenário António de Silva Freitas, por elementos do PCP e alguns comunistas espanhóis, que tinham assaltado a sua casa para o roubar. Os autores foram quase todos condenados a pesadíssimas penas de prisão e degredo, só saindo alguns deles da cadeia em 1960.
  15. Arquivo da PIDE/DGS, pr. dir. 42/52 – Serviço de Investigação.
  16. Wário Soares, Portugal Amordaçado…, op. cit., 20S.
  17. Arquivo da PIDE/DGS, Pr. 16950 CI (2), volume 1, fls. 12, 75, 79, 93, 99, 113, 120, 125, 130, 140 e 147.
  18. «Major Sarsfield recorda intentona de 1952», A Capital, 6/1/75, 11.
  19. Havia pedido, em 1954, a liberdade condicional ao Ministério da Justiça, que não a concedera porque teria confundido o crime da Rua do Bonjardim com o assassinato de um legionário e de um guarda fiscal, na ponte D. Luís, do Porto, bem como com o caso de Cambedo da Raia, em 1946.
  20. António Ventura, Memórias da Resistência. Literatura autobiográfica da resistência ao Estado Novo, Lisboa, Câmara Municipal de Lisboa, 2001, testemunho de José Magro, 202-204