O projeto OUPA, iniciativa do pelouro da Cultura da Câmara Municipal do Porto, foi criado em 2015 como uma residência artística de seis meses, no bairro do Cerco.

Como projeto de intervenção social, cultural e artística, o objetivo primordial do OUPA “é que se fale destes bairros por razões positivas, por causa da música e do talento daqueles que o habitam, e não apenas para reproduzir os estigmas habituais”, disse à Lusa a ‘rapper’ Capicua, envolvida no projeto desde o início.

A primeira edição tinha como propósito “fazer-se um espetáculo no Rivoli” e incluía “oficinas de escrita, de produção de instrumentais, masterização, mistura, vídeo, promoção de música na Internet, conceção de espetáculo”, recordou Capicua.

Quando começou, Capicua e os restantes envolvidos já esperavam encontrar talentos no Cerco, só não tinham “expectativa que o projeto ia ter continuidade mais três anos”.

“Quem acompanha, como é o meu caso, o rap que se faz no Porto sabe que há muito talento escondido. Sabíamos que íamos encontrar algumas pessoas com muito talento e com algum trabalho feito, até algumas edições informais na net, algumas músicas”, disse.

O que não esperavam era “que o processo corresse tão bem logo ao primeiro ano”. “Não só pelo talento que encontrámos, mas por todo o processo, que foi muito exigente, mas acabou por correr muito bem. O espetáculo no Rivoli foi um sucesso, a estreia do documentário que o Vasco Mendes e o André Tentúgal fizeram durante esse ano também foi um sucesso, as pessoas estavam emocionadas, as do bairro e do Porto em geral, que compareceram em peso no Rivoli e emocionaram-se juntas”, recordou.

A ‘rapper’ acredita que foi esse sucesso “que ditou a continuidade” do projeto, “e a continuidade foi reafirmando esse sucesso”.

Nesse ano, mais do que os seis meses de trabalho, os responsáveis pelo OUPA acabaram por “conseguir deixar um estúdio comunitário no bairro do Cerco, com o apoio da Domus Social e da Junta de Freguesia de Campanhã”, e, além disso, fizeram “um apelo aos músicos da cidade para doarem material de som” e “vários workshops de dinamização do estúdio”.

“E a verdade é que eles continuaram até hoje”, contou.

Entretanto, os jovens envolvidos no projeto “deram vários concertos na cidade, foram [atuar] ao festival Marés Vivas” e o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, “recém-eleito, quando foi visitar a cidade foi visitar o bairro do Cerco e ouvir o concerto do OUPA”.

A segunda edição, em 2016, abrangeu todos os bairros da freguesia de Ramalde. Como dessa vez “correu também muito bem”, a autarquia desafiou o grupo para uma terceira edição do projeto, que aconteceu no ano passado nos bairros da freguesia de Lordelo (Aleixo e Pasteleira).

Este ano, a proposta da Câmara do Porto, “para consolidar o trabalho feito”, foi “selecionar um grupo de participantes, que tivesse alguns membros de cada um dos anos anteriores, e fazer um disco de uma forma mais profissional, um disco a sério, gravado num estúdio profissional, visto que eles agora já não eram principiantes, já estavam numa fase de consolidação do trabalho feito”.

O resultado foi “Cidade Líquida”, disponível nas plataformas de ‘streaming’ desde 30 de novembro e cuja edição física estará à venda no concerto de terça-feira no Plano B, que tem entrada gratuita.

O álbum inclui 11 temas, compostos, escritos e interpretados por Mónica Sol, Bonaparte, Garcez, LS, Doc, Drunk Nigga, Joca e Ricardinho, que representam as três edições do projeto.

“[“Cidade Líquida”] musicalmente é muito interessante, muito versátil e mostra o talento deles e nesse sentido acho que também foi uma aposta ganha. Vamos agora ver a continuidade do trabalho”, referiu Capicua.

O facto de o grupo incluir apenas uma rapariga “é um reflexo do que se passa no rap em geral”. No primeiro ano do projeto participaram “duas raparigas, uma rapper e uma cantora, no segundo ano nenhuma”.

“Andámos a tentar angariar miúdas em todos os bairros de Ramalde, mas não conseguimos ninguém. No terceiro ano conseguimos a Mónica, que não é ‘rapper’, é cantora”, contou Capicua.

Em cada edição participaram sete/oito jovens e nesta fase do projeto “não era o objetivo excluir ninguém, mas não era possível, viável, fazer um disco com mais do que oito ou nove pessoas”.

Para selecionar um grupo “que representasse os três grupos anteriores, como é um projeto social, o critério não podia ser uma coisa quase só de preferência ou de talento”.

“Foram vários os critérios, fizemos um conjunto de questionários, distribuídos por todos os elementos que quiseram candidatar-se à edição deste ano, e os critérios foram desde a disponibilidade que eles tinham para o projeto deste ano até ao grau de entrega que tiveram na edição em que participaram, até ao que fizeram desde que a edição acabou, por conta própria, se continuaram a fazer música, se se mantiveram ativos, etc”, explicou.