Ainda hoje há quem lembre aquele concerto na Aula Magna, o primeiro dos xx por cá: sala intimista, fãs desejosos de comprovar, ao vivo, a beleza terna e melancólica das canções do álbum de estreia do grupo, o grande “X” sobre pano preto que separava, em palco, os britânicos do seu público e a ideia de que tudo aquilo podia ser apenas uma moda passageira, um momento fugaz de erotismo negro e não raras vezes depressivo, que em breve se esfumaria, tombado pelo peso do hype. Mas isso não aconteceu. Os xx continuaram a sua demanda e firmaram-se, definitivamente, como uma das grandes bandas do século XXI, não só pela força das suas canções como por aquilo que representam para toda uma geração que cresceu a ouvir música (também) por sua causa.

Essa geração esteve bem presente numa noite atípica para um espaço como a Altice Arena. Longe de estar esgotada, a sala esteve bem composta para nova vinda dos xx a Portugal, país onde gozam de um certo estatuto de culto e onde sempre foram bem recebidos – correspondendo a esse amor com a escolha de Lisboa como uma das cidades por onde passou o “seu” festival, o Night + Day, em 2013. Uma relação que esteve bem patente também esta noite, com um vasto público a entoar 'I Dare You', tema presente em “I See You”, o seu último álbum (2017), e com a banda a agradecer o carinho e a tecer loas várias a Portugal.

Não havia muito a esperar, na verdade, de um novo concerto dos xx em Portugal; a banda já cá tinha estado em 2017, apresentando estas mesmas canções já-não-tão-novas no NOS Alive. Os alinhamentos recentes, consultados na Internet, também não deixavam antever espaço para quaisquer novidades. Mas, independentemente das vezes que se vejam os xx em palco, o chamariz da sua música continua o mesmo: uma sensualidade doce, emotiva, vestida de negro, onde o amor e a miséria coabitam a mesma casa e, o que é mais surpreendente, dão-se maravilhosamente bem.

Se bem que os xx já não se apresentem tão suaves como quando os conhecemos em 2009. Agora, o prato forte do seu espetáculo é a mestria de Jamie xx, que trouxe para a mesa de todo o grupo aquilo que alimenta muito do seu trabalho a solo: uma maior aposta numa sonoridade eletrónica, de dança, cada vez menos R&B minimal e cada vez mais house de estádio. Canções como 'Shelter' ganharam, por exemplo, toda uma nova roupagem, já não sendo tanto a preto-e-branco mas acreditando também em cores mais vivas, garridas. Já não servem apenas para chorar aninhado no quarto pelo fim de um romance; servem, também, para o dançar.

Ao longo de pouco mais de uma hora, os xx mostraram em palco o porquê de continuarmos a gostar deles, o porquê de ainda nos enternecermos com canções como 'Crystalised', 'Infinity' (esta com um final apoteótico, entre batida e ruído) ou 'Intro', uma não-canção que tem alimentado tantos e tantos rappers e mashups. Evoluíram, mas ainda nos pertencem; enxugaram as lágrimas, mas ainda se mostram empáticos perante a nossa dor. Não lhes poderíamos pedir muito mais. Nem é preciso: basta-nos a beleza daquelas melodias e ritmos minimais.

Algo que os Justice não conhecem, de todo. No seu magnífico álbum de estreia, cujo título é apenas o símbolo de uma cruz, a dupla francesa deu a conhecer ao mundo um house de sotaque maximal, que um pouco à semelhança dos Daft Punk procurou fazer com que a malta do rock também dançasse um bocadinho e passasse a apreciar esta coisa da música eletrónica de dança, sem ceder à tentação fácil de lhe chamar uma série de gajos com pens e computadores. Subindo ao palco com meia hora de atraso, algo incompreensível tendo em conta que os horários do palco principal já haviam sido alterados esta semana, os Justice vieram apresentar o espetáculo que dará novo disco ao vivo, “Woman Worldwide”, tendo dado um cheirinho de 'D.A.N.C.E.' logo ao início e passando depois por 'Genesis' e 'Stress', perante uma plateia de resistentes.

Horas antes, o Palco Super Bock, uma vez mais montado na Altice Arena, havia sido ponto de passagem obrigatória para todos quantos quisessem acenar (e cantar) um último adeus a Zé Pedro, alvo de nova homenagem por parte de amigos pessoais de Zé Pedro, como Tó Trips, Rui Reininho, Manuela Azevedo, Carlão, Manel Cruz ou Jorge Palma, e que contou com a presença dos restantes Xutos & Pontapés e respetivos filhos, para mais uma sucessão de êxitos maioritariamente escritos pelo falecido guitarrista – e um que era sua preferência pessoal, ‘London Calling’, dos Clash, logo a abrir. Da homenagem ficaram, sobretudo, as t-shirts irónicas (e icónicas, quiçá) onde se lia “who the fuck is Zé Pedro?” e a frase de Palma: “f***-se, o Zé Pedro está vivo, aqui!”. Um êxito, também, a atuação dos Parcels no Palco EDP; na sua estreia em Portugal, os australianos foram recebidos por uma quantidade surpreendente de fãs, brindando o pôr-do-sol com um indie pop veraneante que, não sendo mau, também não era tão diferente de milhentas outras coisas que se têm ouvido nos últimos tempos.

Entre estes últimos, destaque para a atuação dos Temples que, em nova incursão por terras lusas, apresentaram o que de mais próximo têm de “êxitos”: 'Sun Structures', 'Shelter Song', 'Colours to Life' e 'A Question Isn't Answered', todos eles retirados ao seu disco de estreia, editado em 2014. Perante um público fiel, infelizmente o que houve a reter foi o som péssimo que brotou das colunas – o que provocou alguma estranheza, já que nos restantes concertos este esteve bastante aceitável, e muita dor de ouvidos, tal era a estridência.

Quem veio fazer jus ao nome do festival foram os Parkinsons, que tiveram a honra de abrir o evento com um concerto baseado no seu novo álbum, “The Shape of Nothing to Come”, e no punk rock que encheu os corações de gente de Nova Iorque a Londres. Um endiabrado Afonso Pinto aproveitou as poucas pessoas presentes àquela hora para fazer do palco, e fora dele, o seu domínio, agradecendo a presença da banda “na cidade do Porto” e mandando cumprimentos a Sesimbra. Terminaram com cuspidelas do público para o palco, ao bom jeito punk, com cordas de guitarra partidas e sendo praticamente expulsos e impedidos de tocar mais um tema. Resumidamente: foi rock. Javardo, como se quer.