O mural onde Vhils esculpiu o rosto de Marielle Franco, assassinada em março no Rio de Janeiro, insere-se no projeto “Brave Walls”, da organização de defesa dos Direitos Humanos Amnistia Internacional.
“Nesta altura [em] que se fala tanto de muros para separar as pessoas, estamos a utilizar os muros para expressar a arte e Direitos Humanos, união, e que seja um mundo onde os muros só sejam usados para a arte, mas nunca para separar pessoas”, disse o diretor-executivo da Amnistia Internacional Portugal, Pedro Neto, em declarações à Lusa.
O retrato foi esculpido numa parede do Panorâmico de Monsanto, em Lisboa, que entre hoje e domingo acolhe o festival Iminente, dedicado à música e a à arte urbana e que tem em Vhils um dos seus mentores. A ideia do artista, explicou o próprio à Lusa, “foi tentar fazer uma homenagem ao legado, à história e a toda a mensagem e ao trabalho incrível” que Marielle Franco fez.
Durante o festival, o mural – que poderá ser visitado depois, quando o Panorâmico de Monsanto voltar a estar aberto ao público como miradouro – “vai ser acompanhado de um trabalho de vídeo”, no qual se recupera “trabalho, entrevistas e material de arquivo” de Marielle Franco, para “com isto chamar a atenção e prolongar o seu trabalho, o seu legado”.
No Brasil de hoje, onde se vive “uma situação muito tensa” e se “levantam uma série de questões que são sensíveis e preocupantes”, Vhils destaca que “é importante haver estas pessoas que têm essa missão de chamar a atenção para muitos dos problemas que existem”.
Apesar de este não ser o primeiro mural do projeto “Brave Walls” em Portugal — há um outro em Leiria, dinamizado por artistas locais e pelo grupo local da Amnistia Internacional Portugal, “sendo o Vhils um artista renomado a nível internacional, este tem um alcance internacional mais sonoro, mais abrangente”, frisou Pedro Neto.
O mural é desvendado numa altura em que passam seis meses do assassinato de Marielle Franco e a Amnistia “não vai deixar que esta tragédia seja esquecida”. “Para que se faça justiça e que, com isso, possamos dar esperança, quer à família, que à Mônica [a companheira de Marielle], quer a todos os que defendem os Direitos Humanos no Brasil e que colocam a sua em vida risco por causa disso”, afirmou Pedro Neto.
Marielle Franco, negra, lésbica, nascida num complexo de favelas no Rio de Janeiro e militante de esquerda do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), destacou-se por denunciar abusos das forças policiais nas favelas e pela defesa dos direitos humanos. Aos 38 anos foi assassinada.
O diretor-executivo da Amnistia Internacional Portugal recorda-a como “uma voz com uma clareza muito grande”.
“Uma mulher que nasceu numa favela, fez um percurso notável. Era vereadora, foi a sexta mais votada de sempre no Rio de Janeiro e fazia o seu trabalho na defesa daqueles que não tinham voz e dos que perdiam a vida apenas por viverem no Rio”, recordou.
Em Marielle, “o que mais encanta” Pedro Neto é que “ela não tomava partidos”.
“Não tomava lados do campo, era a favor da conciliação e da paz. A sua tese de mestrado, dedicou-a a polícias que foram assassinados também eles por causa da violência no Rio”, contou.
O responsável chega mesmo a comparar Marielle com um outro defensor dos Direitos Humanos: “quase me faz lembrar Nelson Mandela, mas numa versão feminina e no Brasil”.
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