"Nós entendemos que este parecer relativo ao relatório que entregámos ao MAI [Ministério da Administração Interna], vincula o MAI e, de certo modo, restringe o MAI à publicação do relatório com aquele capítulo [o que não foi tornado público], com ou sem nomes [de mortos e outras pessoas envolvidas]. Mas, de modo algum, nos pode cercear na nossa liberdade de dar a conhecer os dados da nossa investigação, porque, como investigadores, temos a liberdade, não só de investigar, como a liberdade, e até obrigação, de dar a conhecer os dados da nossa investigação", disse hoje Xavier Viegas à agência Lusa.

O investigador e diretor do Centro de Estudos de Incêndios Florestais da Universidade de Coimbra lembrou o processo que levou à não publicação do sexto capítulo do referido relatório – do qual, numa primeira fase, foram retirados os nomes das pessoas envolvidas e que, depois, foi sujeito a um parecer da Comissão Nacional de Proteção de Dados [CNPD], segundo o investigador, após um pedido nesse sentido do atual ministro da Administração Interna.

Xavier Viegas alega não ter conhecimento de qualquer caso análogo em que tivesse estado envolvido e compara a restrição da publicação resultante do trabalho da equipa de 13 investigadores por si liderada à censura da informação do Estado Novo sobre as cheias na região de Lisboa em 1967.

"Faz-me lembrar as cheias de há 50 anos. Eu também vivi esse episódio, estava a viver em Lisboa e participei naquelas ações em que os estudantes tomaram a iniciativa de ir socorrer as populações. E o conhecimento que tive da história nessa altura era muito diferente da realidade (…) graças à censura que havia nessa altura", frisou.

O investigador universitário não adiantou em que moldes e quando será feita a divulgação de dados da investigação sobre o incêndio de Pedrógão Grande, mas frisou que essa divulgação incluirá "tudo aquilo que for relevante dar a conhecer às pessoas e que lhes interessar" sobre o trabalho dos investigadores.

Embora considere que "partes do parecer" da CNPD entram em terrenos que alega não compreender, nomeadamente "em que medida é que correspondem à proteção de dados pessoais", Xavier Viegas admite que a identidade de pessoas e "algum pormenor, algum detalhe, possa ferir alguma suscetibilidade" e, nesse aspeto, disse respeitar a posição da Comissão "e a cautela que faz".

"Mas, seguindo a recomendação implícita desse parecer e que também já nos tinha sido dada pela anterior ministra [da Administração Interna, Constança Urbano de Sousa], temos estado junto das famílias das vítimas e das pessoas envolvidas no nosso relatório a procurar obter autorização para publicar os dados do relatório, se possível mesmo com identificação de pessoas, se necessário sem essa identificação", alegou.

"Os contactos que temos tido são positivos, no sentido de que as pessoas nos dão toda a liberdade de divulgar esses casos", garantiu Xavier Viegas.

Já sobre a possibilidade de voltar a fazer um relatório a pedido do Governo, agora para os incêndios de 15 de outubro, Xavier Viegas não diz se aceitará ou não, alegando que não é a existência de um pedido nesse sentido que limita a "liberdade e o interesse de investigar", e revela que a equipa que lidera já avançou para um novo estudo.

"Sendo um evento de tal magnitude para o nosso país, nós como investigadores de incêndios florestais e da segurança das pessoas não podemos deixar de olhar para ele", afirmou.