Numa pergunta enviada ao Ministério das Finanças, a deputada bloquista Mariana Mortágua menciona a recente descida da taxa de juros da CGD nos depósitos e considera que a decisão de não pagar juros quando o valor ilíquido é inferior a um euro “não é mais do que uma comissão encapotada que penaliza as poupanças mais baixas” e que “contraria os desígnios de um banco público”.

Além disso, refere o Bloco de Esquerda, se esta decisão já “seria má se tomada em linha com a prática na banca nacional”, já enquanto “medida ‘pioneira’ é inclassificável e incompreensível a todos os níveis”, lê-se na pergunta a que a Lusa teve acesso.

“Com efeito, porque a Caixa Geral de Depósitos é um banco público e lhe deve ser exigido que não acompanhe práticas abusivas de mercado e mais ainda que não as incite, há questões que importa esclarecer nesta matéria”, refere o BE, que dirige cinco perguntas ao Ministério das Finanças.

O BE quer saber a leitura que o Governo faz desta decisão e se, “enquanto acionista, irá tomar alguma posição junto da CGD nesta matéria, considerando não só a divergência com objetivos do banco público mas também o sinal negativo que é dado à banca nacional”

Quer ainda saber se o Governo “pode garantir que está a ser assegurada a máxima transparência na comunicação dos efeitos desta alteração contratual aos clientes da CGD” e se não há nesta decisão uma estratégia do banco público para direcionar os clientes para ‘contas pacote’ que “no limite poderão ter custos superiores à rentabilidade perdida, ou até, para produtos para aplicação dessas poupanças com maiores riscos e dificuldades na mobilização”.

O BE quer, por fim, saber quantos são os clientes afetados por estas alterações.

Na semana passada foi conhecido que, a partir do dia 01 de agosto, Caixa Geral de Depósitos vai cortar em 70% a remuneração de alguns produtos poupança e depósitos a prazo, com redução dos juros de 0,05% para 0,015% (Caixapoupança Reformado, Caixapoupança Emigrante e Caixapoupança Superior e as contas Caixapoupança Mais Reformado).

Na informação enviada aos clientes, que podem cancelar os contratos caso não concordem com as novas condições, a CGD diz ainda que vai reter juros ilíquidos até um euro. Ou seja, se o valor resultante dos juros for de 70, 50 ou cinco cêntimos a CGD não o paga.

Isto significa, segundo o BE, que a CGD apenas vai pagar juros a poupanças superiores a 6.666 euros, pelo que qualquer poupança igual ou inferior a este valor não tem qualquer remuneração.

A Lusa questionou já a CGD e o Banco de Portugal para saber ao abrigo de que legislação pode o banco público não pagar juros aos seus clientes, quando esses resultam da taxa oferecida, mesmo de sejam de valor reduzido, mas até agora não obteve resposta.

Já o economista da Deco António Ribeiro disse que essa decisão assenta “no princípio da liberdade contratual em que assentam os depósitos bancários”, que tanto bancos como clientes têm de aceitar quando celebram um contrato, e que “nada na lei prevê a possibilidade de a instituição optar por não pagar juros abaixo de determinado valor, mas também não existem obstáculos legais claros a essa prática”.

A CGD teve lucros de 496 milhões de euros em 2018, o segundo ano consecutivo de resultados positivos, mas bem acima dos 51,9 milhões de euros registados em 2017, e seguindo-se aos prejuízos acumulados acima de 3.800 milhões de euros entre 2011 e 2016.

A CGD entregou 200 milhões de euros em dividendos ao Estado, referentes aos resultados de 2018, sendo a primeira vez que o banco pagou dividendos desde 2010.

Na semana passada, o Dinheiro Vivo noticiou que o Conselho de Administração da CGD vai receber 655.297 euros em prémios relativos a 2017.