Milhares de pessoas marcharam este domingo (27) até a sede do Congresso Nacional, em Valparaíso (a 120 km de Santiago), na maior manifestação em décadas naquela região, que se seguiu a um protesto que reuniu mais de 1 milhão de pessoas na capital chilena na última sexta-feira.

Colunas de manifestantes tomaram a avenida Espanha, que liga as cidades de Viña del Mar e Valparaíso, agitando bandeiras chilenas e exigindo mudanças profundas no modelo económico do país.

"A força do movimento social que tomou as ruas foi a sua transversalidade e o seu caráter pacífico e construtivo. O  nosso chamado é que, em Valparaíso, continue a ser assim. Hoje, mais do que nunca, face ao fracasso da estratégia de segurança do governo, que não evita saques e incêndios", disse o autarca da cidade, Jorge Sharp.

Participaram da manifestação cerca de 100.000 pessoas e aconteceram confrontos isolados entre manifestantes e a polícia, disse o autarca.

Aconteceram também protestos em Rancagua, Concepción e Talca, cidades do sul do país onde centenas de manifestantes enfrentaram a polícia no início da noite.

Em Santiago, em frente à sede do governo, mil ciclistas reuniram-se em protesto contra Piñera e foram dispersados pela polícia com água e gás lacrimogéneo.

Já no parque O'Higgins de Santiago, cerca de 15 mil pessoas se concentraram, segundo a polícia, num ato cultural chamado "O direito de viver em paz", em alusão à música de Víctor Jara, músico assassinado pela ditadura de Augusto Pinochet (1973-1990).

Nas redes sociais foram convocadas novas manifestações para esta segunda e terça-feira em frente à sede do governo.

A pressão mantém-se sobre o presidente. Espera-se que concretize a remodelação do governo que anunciou no sábado após pedir a renúncia de todos os seus ministros, juntamente com medidas que complementem o pacote que divulgou na semana passada e que inclui um aumento de 20% das pensões básicas, aumentos dos impostos para os mais ricos e a diminuição do número de deputados — medidas que muitos chilenos consideram insuficiente.

"Há mais de 30 anos que a classe política deste país, incluindo todos os políticos de todas as tendências, não é capaz de solucionar os problemas reais das pessoas, que são a educação, a saúde e a aposentadoria, porque os nossos aposentados recebem pensões miseráveis", disse em entrevista à AFP Carlos Vial, oficial do exército reformado, de 63 anos.

"São medidas insuficientes. São um passo importante no sentido do que as pessoas estão a exigir, mas continuam a ser insuficientes", disse Eduardo Pérez, engenheiro elétrico de 49 anos.

Os protestos já causaram 20 mortes, cinco das quais causadas por agentes do Estado, no momento em que crescem as denúncias de abusos contra os manifestantes e se esperam missões de verificação por parte do gabinete de Direitos Humanos das Nações Unidas e da Amnistia Internacional.

Enquanto o presidente tenta responder aos protestos em massa, a sua popularidade cai a 14%, face a 29% na semana anterior à explosão social, segundo um estudo da consultoria Cadem realizado entre quarta e quinta-feira e divulgado hoje pelo jornal "La Tercera".

Os 14% rompem a marca que a mesma consultora havia registado em março de 2016, quando a presidente socialista Michelle Bachelet alcançou um mínimo de 18% após a revelação de um caso de corrupção que envolveu o seu filho.

Neste domingo, centenas de voluntários voltaram às ruas para limpar a capital. Alguns pintavam muros, enquanto outros varriam o lixo e os pedaços de vidro espalhados por estações de metro e esquinas por causa das barricadas erguidas durante os protestos da última semana.

Por Leticia Pineda/AFP