De 1960 até agora, a procuradoria teve conhecimento de 266 vítimas - 178 das quais crianças e adolescentes - que sofreram abusos sexuais por parte de membros da Igreja católica chilena, instituição que vive uma das suas piores crises desde a visita ao país do papa Francisco, em janeiro passado.
Outras 31 vítimas são adultas e "58 sem especificação, relacionadas a casos notificados" antes da vigência da Reforma do Processo Penal (RPP), que começou a operar no Chile no ano 2000.
"Na sua maioria, os factos denunciados correspondem a crimes sexuais cometidos por sacerdotes, párocos ou pessoas vinculadas a estabelecimentos educacionais", aponta o cadastro entregue nesta segunda-feira.
O ministério público chileno explicou que foram incluídos no levantamento todos os que faziam parte do clero no momento da prática dos crimes - bispos, padres ou presbíteros e diáconos -, bem como "pessoas pertencentes à vida consagrada", ou seja, "freiras, monges, frades e religiosos".
O cadastro também inclui "laicos que exerciam alguma função na esfera eclesiástica", como os coordenadores das áreas pastorais das escolas.
Dos investigados, 74 não pertencem a nenhuma congregação religiosa, enquanto 65 são, na sua maioria, membros dos salesianos e maristas. A investigação também identifica 10 laicos e nove pessoas cuja função ou filiação é indeterminada.
Atualmente, existem 36 investigações em andamento com processos pendentes e 108 já foram concluídas. Em 23 dos casos houve condenações e um terminou em absolvição.
Apesar dos avanços na investigação, para as organizações trata-se, no entanto, da ponta do iceberg. "O trabalho feito pela procuradoria sem dúvida é muito positivo e está a começar a abrir as portas para situações que antes eram tratadas como segredo", comentou à AFP Juan Carlos Claret, de um grupo de laicos do município de Osorno, no sul do Chile, que se opôs à nomeação nesta cidade do bispo Juan Barros.
Segundo Claret, em 2007 a Conferência Episcopal Chilena já sabia de pelo menos 120 sacerdotes envolvidos em casos de abusos sexuais. Por isso, na sua opinião, o número informado pela procuradoria esta segunda-feira ainda é pequeno.
"Há informação que ainda está sob sigilo", acrescenta Claret, um dos líderes no movimento de denúncias de abuso sexual no país, que têm abalado a Igreja Católica e já provocaram uma total reestruturação do clero local por parte do papa Francisco.
Para a Igreja chilena todos os antecedentes estão já sobre a mesa. De acordo com seus próprios registos, desde o ano de 2002 até o final de junho, são 43 os clérigos condenados - tanto pela justiça civil como a canónica - por abuso sexual a menores de idade.
"Aqui não há apenas uma grave contradição, há também uma grave traição à fé depositada por gente que acredita na Igreja, em Deus e nos seus ministros", reconheceu o porta-voz da Conferência Episcopal, Jaime Coiro, em conferência de imprensa.
"Estamos diante da expressão em números de uma realidade que, assim como envergonha o papa, também envergonha a Conferência Episcopal", acrescentou Coiro, ratificando a disposição da Igreja chilena em colaborar com a Justiça.
Estes dados são revelados depois da convocatória que o papa Francisco fez aos 34 bispos do Chile em maio deste ano. A razão desta chamada foi para confrontá-los com os conteúdos de um relatório redigido pelo investigador de abusos sexuais da Santa Sé, que os acusou de "grave negligência" ao investigar alegações de crianças abusadas e sugeriu que algumas provas de crimes sexuais teriam sido destruídas.
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